Burnout e saúde mental no local de trabalho
Por Sara L. Lopes, Docente do Mestrado de Psicologia Social e das Organizações. Investigadora APPsyCI – Applied Psychology Research Center Capabilities & Inclusion. Ispa – Instituto Universitário.
Por Ana Cristina Martins, Docente do Mestrado de Psicologia Social e das Organizações. Investigadora APPsyCI – Applied Psychology Research Center Capabilities & Inclusion. Ispa – Instituto Universitário.
Parece inquestionável que, para a grande maioria dos indivíduos, o trabalho ocupa um lugar central nas suas vidas. Efetivamente, enquanto pessoas profissionalmente ativas, passamos grande parte do nosso dia a trabalhar e/ou nos nossos locais de trabalho. E, mesmo fora desse contexto, temos, muitas vezes, dificuldade em desligarmo-nos das preocupações profissionais. É, portanto, expectável que sintamos algum cansaço associado à nossa experiência laboral.
Porém, se essa experiência começar a tornar-se insuportável e a consumir-nos, podemos estar a lidar com sintomas de burnout. O burnout pode ser definido como o esgotamento físico e emocional causado pelo trabalho e, qualquer que seja a sua causa, afeta, potencialmente, a nossa saúde física e mental. Alguns sinais de que pode estar a lidar com sintomas de burnout são os seguintes: ter uma menor satisfação profissional ou perder o sentido de realização profissional; sentir-se isolado ou desinteressado no trabalho; ficar aborrecido ou choroso no trabalho; sentir fadiga, falta de energia, exaustão ou sensação de esgotamento; cometer pequenos erros ou lapsos de julgamento; não ter um desempenho ao nível habitual ou, então, chegar atrasado ao trabalho, fazer pausas mais longas ou, mesmo, evitá-lo.
Enquanto processo psíquico-existencial, o burnout pode ser analisado tendo em conta três momentos distintos. Num primeiro momento, o sujeito vai definindo e desenvolvendo o seu projeto de ser desde a infância, sendo que as experiências que passa ao longo do seu crescimento vão contribuir para a criação de um sentido existencial e social do trabalho. Num segundo momento, já enquanto trabalhador, o sujeito passa a viver situações de tensão entre o seu projeto de ser e as exigências organizacionais. Por fim, ocorre um momento de corte do projeto existencial, causado pelas situações vividas no trabalho. Isto origina a perda do sentindo existencial e social do trabalho, instaurando-se um impasse psicológico. Esse impasse psicológico dará, então, origem ao burnout.
Deste ponto de vista mais existencial, o burnout é considerado como decorrente dos desvios ou fracassos do projeto de ser de um indivíduo. O projeto de ser do indivíduo é composto por diversas componentes relevantes para o mesmo, podendo, o projeto profissional, ser uma delas. Ao passar por experiências de fracasso a nível do projeto profissional, o indivíduo pode assumir que este fracasso não se limita apenas à vertente profissional, mas, antes, abrange-o na totalidade, sendo que o mesmo considera, portanto, que fracassou na sua totalidade.
Assim, este fenómeno tem de ser compreendido no contexto da relação indivíduo-organização, pois decorre da contradição entre os objetivos pretendidos (estes estando coerentes com o projeto de ser da pessoa) e aquilo que são os resultados por si alcançados. Como tal, a sua devida análise não pode ser feita de uma forma transversal. A compreensão do burnout requer, portanto, uma abordagem longitudinal que abarque a complexidade das relações entre os processos psicológicos da pessoa, as suas condições de vida e as condições de trabalho.
Concluindo, a perspetiva psíquico-existencial do burnout compreende este fenómeno a partir da experiência vivida do indivíduo, tendo em consideração certos aspetos como a responsabilidade do mesmo em relação ao seu trabalho e a sua liberdade e autenticidade individual. Trata-se, portanto, de uma abordagem do burnout que, sendo utilizada numa organização, contribuirá para uma compreensão mais humana e profunda deste fenómeno, à qual não pode escapar a própria responsabilidade das organizações naquela que é gestão das solicitações endereçadas aos colaboradores versus dos diversos recursos disponibilizados.