Entrevista a Nuno Troni, Gi Group Holding Portugal: «A força laboral do futuro terá muito menor dimensão.»

No futuro, «não vamos precisar de tanta gente para pôr uma empresa a funcionar, iremos necessitar de outro tipo de competências e muita gente vai ficar para trás». Quem o afirma, sem rodeios, é Nuno Troni, Business director de Search & Selection da Gi Group Holding Portugal. Sobre o presente, constata que recrutar continua a ser difícil, «com tendência a piorar», e que as empresas continuam a ter dificuldade em encontrar as competências de que precisam.

 

Por Ana Leonor Martins | Fotos Nuno Carrancho

 

Com quase duas décadas no sector de Recursos Humanos, Nuno Troni assumiu em Setembro funções de Business director de Search & Selection da Gi Group Holding Portugal. Empresa «muitíssimo bem posicionada na área de Trabalho Temporário» e também com «uma já muito boa presença nas soluções de Outsourcing», ainda tem grande margem de progressão nas áreas que está a liderar. Assim, em conversa com a Human Resources, falou não só do mercado de recrutamento e selecção, mas também do futuro do trabalho e do inevitável impacto da tecnologia. E não traça um cenário cor-de-rosa.

 

O que lhe foi pedido enquanto líder da área de Search & Selection de uma empresa que, sendo grande, se calhar ainda não tem a notoriedade de mercado desejada?
A compra da Kelly, a maior aquisição de sempre que fizemos, tornou-nos a quinta maior empresa de Recursos Humanos a nível europeu. Em Portugal, por via dessa aquisição, é hoje a maior empresa de Recursos Humanos, em todas as matérias relacionadas com gestão de talento, mobilidade e desenvolvimento; somos a empresa com maior dimensão, tanto do ponto de vista do número de colaboradores colocados em cliente, como do ponto de vista de volume de facturação.

Assim, a empresa está muitíssimo bem posicionada na área de Trabalho Temporário, tem também uma já muito boa presença nas soluções de Outsourcing, sendo que nas áreas de Search and Selection ainda temos alguns passos a dar.

Não somos, ainda, uma marca top of mind, ou seja, não somos primeira escolha das empresas para recrutar, e o que me pediram foi isso, desenvolver estas áreas e torná-las, a par da área de Trabalho Temporário, uma referência no mercado português. Ser top of mind para quem quer mudar de trabalho, recrutar ou formar, ser uma das primeiras marcas das quais os diferentes stakeholders se lembram, nestes âmbitos.

 

Que prioridades definiu para atingir esse objectivo?
Começámos por redefinir alguns processos internos, apostámos muito também no desenvolvimento da equipa, que já tinha talento de muito bom nível, mas que enriquecemos, este ano, com pessoas com bastante experiência e de referência no sector. Temos agora um conjunto de pessoas com muita ética profissional e muita ambição, com muita vontade de fazer acontecer.

 

Ao adquirirem a Kelly, tornaram-se, como referiu, a maior empresa de Trabalho Temporário. É uma área que no ano passado registou uma diminuição na sua utilização… Que evolução perspectiva?
Depende dos sectores, ou seja, os números do trabalho temporário, tendencialmente, caíram, não só no mercado nacional, mas também no europeu, muito por culpa do sector automóvel que é, por norma, um muito bom cliente de trabalho temporário.

Mas se olharmos, por exemplo, para os países nórdicos, percebemos que a utilização do trabalho temporário não é só cedência pontual de mão-de-obra, nem só para funções indiferenciadas ou operacionais. Muito do trabalho qualificado também é feito através do trabalho temporário. Há muitos part-time, muitos primeiros empregos e muitos a seguirem a lógica de trabalhar por projecto, e recorrem a esta figura.

Portanto, acho que o trabalho temporário vai continuar a ser relevante, continua a ser crítico nas nossas economias, tendo obviamente picos ligados a determinados sectores. Apesar das eventuais quebras, a sua longevidade e relevância não estão postas em causa. É uma ferramenta de gestão muito utilizada, e útil, em Portugal e em todo o mundo.

 

E estamos, cada vez mais, num contexto com novos tipos de vínculos contratuais, que não o trabalho a tempo inteiro, sem termo, para uma única empresa…
Há números interessantes a esse respeito… Se olharmos para o emprego jovem, para a faixa etária abaixo dos 30, com contratos de trabalho sem termo, efectivos, verificamos que ficam menos tempo nas empresas do que muitos trabalhadores temporários. Ou seja, nem os contratos efectivos são uma garantia para as empresas, nem trabalhar muito tempo na mesma empresa é o que os jovens procuram.

Há cada vez mais interesse em trabalhar numa lógica de projecto do que propriamente ter um vínculo de muito longo prazo com uma só empresa. O trabalho temporário pode até ser importante para regulamentar esse tipo de relação com as empresas e garantir que o trabalhador tem toda a parte processual e jurídica perfeitamente assegurada.

 

A concorrência na vossa área de actuação é forte. Como pretendem diferenciar-se?
Pode ser um bocadinho polémico o que vou dizer, mas não há nenhuma empresa de Recursos Humanos que tenha uma clara vantagem competitiva face à outra. Por vantagem competitiva entenda-se algo que não posso replicar. Do ponto de vista tecnológico, qualquer empresa pode ter acesso às mesmas ferramentas e as pessoas podem fazer a diferença, mas são móveis…

Assim, pode parecer cliché, mas a razão para escolher trabalhar com uma empresa em detrimento de outra é, efectivamente, a relação de confiança. A consistência daquilo que é entregue, a ética de trabalho, garantir que os tempos são cumpridos… É isto que faz a diferença. Por isso, é preciso ter uma equipa consistente, que ganhe credibilidade, e que o faça não um mês ou seis meses, mas sempre. Manter sempre a mesma fasquia de qualidade, que gera confiança.

 

A área de Search and Selection tem cinco marcas, com focos distintos – três em recrutamento; uma em formação e outra em transição de carreira. Quais percepciona como os principais desafios nestes diferentes âmbitos?
O mercado teve alguma desaceleração no segundo semestre do ano passado, mas os desafios do ponto de vista de recrutamento continuam, ou seja, a escassez de talento continua, a dificuldade das empresas em encontrar determinadas competências é cada vez maior, por isso continua a ser tão difícil como sempre foi recrutar, com tendência a piorar.

Do ponto de vista de formação, estamos sempre a falar da necessidade de upskilling e reskilling, de qualificar lideranças, e são temáticas que continuam em cima da mesa. Relativamente ao outplacement, já é hoje muito mais do que apenas assessorar quem sai de uma empresa, quando esta diminui a sua força de trabalho. Já trabalhamos dentro das empresas, com mobilidades internas. É uma área que tem vindo a crescer muito ao longo dos últimos anos, começando a aproximar-se mais da realidade europeia, onde, muitas vezes, já é praticamente uma commodity. Em Portugal, é utilizado, sim, numa lógica de responsabilidade social, mas também porque diminui o custo do despedimento e facilita o processo e a manutenção de paz social.

 

Como disse, a atracção e retenção de talento continua a ser um grande desafio. A que é que isto se deve? Há de facto falta de pessoas, ou faltam pessoas com as competências que as empresas procuram?
Faltam as competências que as empresas procuram. Se olhamos para os números do desemprego, é verdade que continuamos a ter um conjunto muito significativo de pessoas desempregadas, e um conjunto ainda mais significativo de pessoas que já desistiram de ingressar no mercado de trabalho. Portanto, diria que se tivéssemos a capacidade de formar essas pessoas, não teríamos um problema de escassez de talento.

 

Leia o artigo na íntegra na edição de Janeiro (nº. 169) da Human Resources.

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