Repensar a abordagem intergeracional, o exemplo da “geração sobrevivente”

Por António Saraiva, Business Development manager_ISQ Academy

Enaltecer-se uma determinada geração é um exercício que agrega contornos fortes de injustiça. Até porque a fita de tempo da História prova-nos que qualquer uma das gerações foi sempre interferida por acontecimentos históricos relevantes, fosse marcada pelo fim da II Guerra Mundial, por fenómenos associados à reconstrução da Europa e de movimentos sociais relevantes, até chegarmos a uma pandemia com impactos brutais, e a toda uma (r)evolução digital, em que a Inteligência Artificial está no centro de toda e qualquer reflexão e… acção. Já para não falarmos no experienciarem-se autênticas catástrofes naturais, apesar de as preocupações pelo meio ambiente fazerem parte da agenda mediática actual.

Na verdade, e sem o tal juízo de valor sobre cada uma das gerações, somos capazes de dar alguma saliência a todos aqueles que nasceram à volta da década de 1960. Se pensarmos, nomeadamente em termos europeus, que a II Guerra Mundial tinha terminado há escassos 15 anos e que, hoje, já perto da idade legal da reforma, ainda são uma população activa importante nas diversas sociedades e que se estão a confrontar com os diversos desafios impostos pela Inteligência Artificial, poderemos dizer que, no mínimo, é uma geração vencedora.

Ao percorrermos a literatura, mesmo sem fundamentos de grande rigor científico, há algumas características que aparecem como comuns: uma designada ética de trabalho, independência e capacidade de adaptação às mudanças tecnológicas. Há, certamente, quem possa apelidar ao longo deste percurso de mais de sessenta anos, não as designações habituais, de Baby Boomers, Geração X, o que seja, mas, essencialmente uma geração sobrevivente. Curiosamente, segundo diversos estudos, não é esta a geração mais afectada por problemas de saúde mental. Evidente que estes estudos, e outros similares, apontam, contudo, para uma maior propensão para certo tipo de consumos excessivos, os muitas vezes designados como “vícios”: álcool, tabaco e cafeína, os quais trouxeram, e ainda têm, impacto na saúde física e mental das pessoas.

O confronto que adveio do ainda período do pós-guerra, instabilidade económica, mudanças sociais e reestruturações sucessivas do próprio mercado, consolidou uma geração marcada pela necessidade de trabalhar, preferencialmente, de forma estável e segura, de forma a obter estabilidade financeira e demonstrar produtividade, sendo sucessivamente exposta aos avanços tecnológicos. Óbvio, como diz o ditado, “não mata mas mói” e, daí, a sujeição ao stress, ansiedade e sobrecarga efectiva do sentido de responsabilidade. Daí a justificação, segundo diversos estudos, de se refugiarem nos referidos “vícios”, a que podemos acrescer substâncias químicas.

Contudo, o ser humano evolui e, com grande frequência, toma a dita consciência do perigo. E como “geração sobrevivente” tem vindo a perceber que a moderação é a decisão inteligente. Por outro lado, a informação é muito mais disseminada em resultado do próprio desenvolvimento tecnológico. E, durante este percurso, as próprias organizações perceberam que era importante gerirem-se riscos de performance e de obtenção de resultados. Como? Através uma objectiva Gestão de Pessoas, em que a saúde e o bem-estar são fundamentais – quer pelo impacto na produtividade, quer, muito, também, nas vantagens de uma humanização organizacional. É esta “geração sobrevivente” que está a fazer reflectir as organizações sobre a respectiva abordagem intergeracional, não só pela propalada escassez de talento, mas porque baseia a sua acção nos três pilares essenciais: ética, independência e adaptação.

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