Cultura de igualdade quintuplica inovação nas empresas
Pela 13.ª vez, a Accenture Portugal promoveu um executive breakfast para assinalar o Dia Internacional da Mulher. Reuniu ontem, no Epic Sana, em Lisboa, mais de 100 profissionais, tendo apresentado, em primeira mão, as conclusões do seu mais recente estudo “Getting to Equal 2019”.
Fernanda Barata de Carvalho, Accenture Inclusion & Diversity lead, que fez de salientar que o evento não é para mulheres, mas para todos, foi quem apresentou os resultados do estudo, que teve por base um questionário a mais de 18 mil profissionais, em 27 países. Em destaque, a evidência de que uma cultura organizativa de igualdade é um factor decisivo para impulsionar a inovação e o crescimento nas empresas. E existe também menor medi de falhar. Os números não deixam dúvidas: a predisposição e a capacidade de inovar dos colaboradores é cinco vezes maior nas empresas com uma forte cultura de igualdade, onde todos podem evoluir e prosperar, do que em empresas menos igualitárias.
E, de acordo com o estudo, a grande maioria dos executivos (95%) em todo o mundo concorda que é essencial que a inovação seja uma aposta contínua das empresas, para assegurar a competitividade e a viabilidade do negócio. A cultura de igualdade é um factor muito mais impactante para a promoção da inovação do que factores como a indústria, o país ou o contexto demográfico das oaganizações.
A pesquisa da Accenture identificou os 40 factores que contribuem para uma cultura de igualdade no ambiente de trabalho, agrupando-os em três impulsionadores-chave: uma forte liderança (Bold Leadership), uma abordagem compreensiva (Comprehensive Action) e um ambiente de trabalho capacitador (Empowering Environment).
Destes, destacou-se o ambiente de trabalho capacitador como o mais importante para impulsionar a inovação – o estudo conclui que mais de 70% do crescimento da inovação é potenciado por factores de empowerment. Assenta em seis princípios-base: propósito, autonomia, recursos, inspiração, colaboração e experimentação.
Outro resultado a salientar é que, pese embora 76% dos executivos a nível global afirmar capacitar os colaboradores para inovarem, apenas 42% dos colaboradores concorda com esta afirmação. Por outro lado, os executivos sobrestimam as recompensas financeiras e subestimam o propósito, como motivações para os colaboradores serem mais inovadores. O estudo indica ainda que numa cultura mais igualitária, os factores mais capacitantes para os colaboradores serem mais inovadores passam pela formação em competências relevantes para a função, acordos de trabalho flexíveis e respeito pelo equilíbrio entre a vida pessoal e profissional.
De referir ainda que, se as condições estiverem garantidas, o mindset de inovação é similar entre homens e mulheres, verificando o mesmo em relação à inovadora dos colaboradores jovens e dos colegas mais seniores.
Em jeito de conclusão, a Accenture calcula que o Produto Interno Bruto mundial possa aumentar até 8 biliões de dólares em dez anos se a inovação aumentar em todos os países em 10%.
Elevada taxa de emprego, mas de fraca qualidade
Após a apresentação das principais conclusões do estudo “Getting to Equal 2019”, a keynote speaker Sara Falcão Casaca, senior associate professor do ISEG – Instituto Superior de Economia e Gestão, fez notar que não há estratégia para a igualdade sem metas quantificadas. E partilhou alguns números da União Europeia (UE), que demonstram que a taxa de emprego das mulheres em Portugal é relativamente elevada em Portugal: em 2000 era já de 60%, sendo a dos homens 76%, mas 10 anos depois a taxa de emprego das mulheres cresceu apenas 1% – para 61% – e, ainda que o gap para os homens tenha diminuído de 15,7% para 8,8%, foi apenas um reflexo da degradação das condições laborais para os homens e não uma maior igualdade.
De destacar também que o trabalho a tempo parcial tem aumentado na EU, sendo que em Portugal, em 2017, representava 11,7% nas mulheres e 6,1% nos homens. Mas Sara Falcão Casaca alerta que «fomentar o tempo parcial quando não há uma cultura de igualdade é reforçar a segregação de papéis, nomeadamente da mulher enquanto cuidadora». Por outro lado, Portugal é o segundo país onde a taxa de emprego aumenta com a maternidade (é de 78% sem filhos e de 81% com filhos até 6 anos).
«O problema – alertou a responsável – é que a qualidade do emprego é fraca.» E isso traduz-se na precariedade laboral; na segregação sexual horizontal, havendo concentração de mulheres nas áreas de actividade menos valorizadas, sendo que é o principal factor que explica a diferença salarial; e segregação sexual vertical, som sub-representação de mulheres em lugares estratégicos e de decisão.
A este propósito, Sara Falcão Casaca que as mulheres têm investido muito na escolaridade (dados de 2016/2017 revelam que 57,3% das licenciaturas são tiradas por mulheres, dos mestrados 58,6% e nos doutoramentos representam 50,5%), mas que a assimetria de género da liderança continua a fazer-se sentir, ainda que tenha evoluído de forma positiva nos últimos anos, graças à legislação. «A pressão reguladora mudou os números», sublinha a responsável. Ainda assim, Portugal está muito abaixo da média europeia. Em 2017, no sector estatal, havia 31% mulheres em posição de liderança, na administração central, e 28% na administração local. Nas 500 maiores empresas a percentagem desce para 8/9% e nas empresas cotadas em bolsa (42), para 13%.
Sara Falcão Casaca lembrou ainda que, ao contrário das teorias tradicionais, que atribuíam este desequilíbrio a falta de ambição ou de qualificação das mulheres, «a principal causa da sub-representação das mulheres são causas invisíveis (tectos de vidro), que têm a ver com normas e valores tradicionais, e representações estereotipadas». Estudos contemporâneos falam de “gendering organizations”, expondo e desconstruindo a aparente neutralidade das políticas de gestão e práticas organizações que, tal como nós, são “gendered”. «Os estereótipos de género estão impregnados no nosso subsconsciente», constactou, concluindo que «a igualdade não é uma guerra de sexos, tem que ser uma luta feita em aliança, porque os homens também perdem com a desigualdade».
A mudança em cada um de nós
Segui-se um painel de discussão, composto por Elisabete Jacinto, piloto de todo-o-terreno; Isabel Stilwell, jornalista e escritora; Nadim Habbib, professor na Nova SBE; Ana Rita Pereira, executive director na Microsoft; e Carla Baltazar, managing director da Accenture & Gender Initiative lead.
Foi destacado o papel da liderança, da experimentação e da cultura de erro; a existência de um bias inconsciente que persistente; o facto de a maioria das empresas ter noção do problema mas fazer pouco para alterar a realidade; a má gestão que persiste e que se traduz em salários baixos e, logo, falta de autonomia financeira; a necessidade das mulheres se imporem pela qualidade e pelo saber estar na liderança; o papel de mãe e de cuidadora; a necessidade de começar logo na primária a desfazer estereótipos que afastam as mulheres das áreas das STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemética); de as mulheres perderem o medo de arriscar; da educação que persiste, de geração para geração para geração, e que faz com que no dia-a-dia se vão cimentando comportamentos discriminatórios. De forma resumida, defendeu-se que «a mudança está, antes de mais, em cada um de nós». A moderação do debate ficou a cargo de Isabel Canha, fundadores e directora da Executiva.
As honras de abertura do evento couberam a José Gonçalves, presidente da Accenture Portugal, que destacou que promover a diversidade é não só fazer jus aos valores da empresa mas também um imperativo de negócio. Reconhecendo que há ainda «muito trabalho a fazer, encontros como estes são uma forma para saber onde estamos e para onde queremos ir». Carla Baltazar assegurou o encerramento, reiterando o compromisso da Accenture em assegurar e Igualdade e a Diversidade, e a importância de todos contribuirmos para essa realidade através de pequenas acções do dia-a-dia.
Por Ana Leonor Martins