A linguagem nos anúncios de emprego está a afastar as mulheres de algumas funções, revela estudo alemão
De acordo com um estudo recente do Instituto de Investigação do Emprego (IAB), certas palavras nos anúncios de emprego podem estar a contribuir para a sub-representação das mulheres em algumas profissões e cargos, avança o Euronews.
Numa análise a anúncios de 710 profissões publicados num dos maiores portais de emprego online da Alemanha, o BA Jobbörse, os investigadores do IAB descobriram que há mais empregos orientados para o género feminino.
Mesmo assim, em certos domínios, como o STEM [ciência, tecnologia, engenharia e matemática], a maioria das descrições de emprego utiliza termos “masculinos”.
«Os estereótipos de género nos anúncios de emprego podem levar a um enviesamento de auto-selecção, em que as mulheres optam por não se candidatar a esses empregos, mesmo que reúnam as qualificações necessárias, devido à percepção de que não se adequam», conclui o estudo.
O estudo refere que aqueles anúncios “tradicionalmente” considerados masculinos também podem «levar a um preconceito no processo de contratação, em que as mulheres são injustamente avaliadas como sendo menos competentes ou menos adequadas para o trabalho».
E prova que os cargos na área da saúde e dos serviços sociais são linguisticamente “femininos”, enquanto os cargos de chefia em todas as profissões são mais susceptíveis de utilizar uma linguagem “masculina”.
O que torna uma linguagem mais feminina ou masculina?
Para verificar a quem se dirigiam os anúncios, os investigadores agruparam as palavras em categorias “de agente” e “de comunidade”, realçando estas o lado humano, e as outras dando prioridade à determinação e ao crescimento pessoal.
«Especificamente, a investigação sociopsicológica demonstrou que os homens são mais frequentemente associados a características de agente, enquanto as mulheres são frequentemente associadas a características de comunidade», concluem.
Antes de analisarem a sua presença nos anúncios de emprego, e recorrendo a estudos existentes sobre género, elaboraram então uma lista de palavras que se enquadram nestas duas categorias.
Acontece que a associação das palavras ao género é mais problemática do que a presença desses termos nos anúncios de emprego, garantem. Por exemplo, alguns empregos pedem candidatos “assertivos, só que esta qualidade é considerada “masculina”.
«Para muitos empregos, são necessárias competências classificadas como de comunidade ou de agente, pelo que essas competências devem ser mencionadas no texto do emprego», explica Michael Stops, investigador do IAB.
No entanto, nos casos em que certas formulações «não são necessárias para descrever o emprego», acrescenta que os empregadores devem considerar a sua exclusão dos anúncios, para não desencorajar os candidatos com base no género.
Incentivar as pessoas a candidatarem-se a empregos em que os estereótipos de género possam constituir um obstáculo é um dos apelos de Stops, explicando que, de acordo com outros estudos, ao contrário das mulheres, os homens não são afectados pela redacção dos anúncios de emprego com base no género.
Linguagem neutra em termos de género
Tal como em Portugal e noutros Estados-membros da UE, na Alemanha os empregadores não podem especificar uma preferência de género nos anúncios de emprego. A redacção deve ser neutra, o que levou à utilização da “estrela de género”.
Como acontece no português em muitos casos, o alemão modifica os substantivos em função do género. Por exemplo, um professor é designado por “Lehrer”, ao passo que uma professora seria designada por “Lehrerin”. Quando se utiliza a forma plural, tanto no português como no alemão, a construção masculina tem preferência, mesmo quando um grupo é constituído por homens e mulheres.
Para ser mais inclusivo, uma solução é acrescentar um asterisco aos substantivos, ou seja, em vez de absorver a forma feminina na masculina, escrevem-se ambas – Lehrer*in. Acontece que esta solução causou polémica na Alemanha, tendo algumas pessoas afirmado que a linguagem sensível ao género está a prejudicar a precisão linguística.
Para Alexandra Scheele, professora da Faculdade de Sociologia da Universidade de Bielefeld, a linguagem nos anúncios de emprego pode alimentar as divisões profissionais de género, mas sublinha o papel primordial da educação. «Quando escolhem as oportunidades de formação profissional depois da escola, as mulheres já estão a escolher entre um leque mais reduzido de empregos», disse à Euronews.
«Os rapazes e as raparigas continuam a ser tratados de forma diferente na escola. E novos estudos mostram que mesmo que uma rapariga tenha as mesmas notas a matemática que um rapaz, tende a considerar-se menos boa nessa disciplina. Portanto, este estereótipo já existe na educação», acrescentou.
«As mulheres tendem a escolher profissões nos anúncios de emprego que já correspondem às suas qualificações actuais» e refere que, no que diz respeito à contratação, a abordagem do «semelhante a mim» ainda prevalece. «Quem procura um sucessor profissional, muitas vezes já tem em mente alguém parecido com ele. E se a função foi anteriormente desempenhada por um homem, é provável que voltem a procurar um homem.»
Tornar a linguagem mais inclusiva é apenas um aspecto da luta contra os estereótipos de género que alimentam os desequilíbrios profissionais, sublinha Scheele.