A M. quer voltar a Portugal. Deixamos, ou já não precisamos de jovens talentos?

A M. “ousou” (palavra dela) contactar-me via Linkedin para uma conversa em jeito de mentoria.

Por Joana Russinho, People Enthusiast, head of Human Resources

E ousou muito bem. Gostei de a conhecer. Tem 28 anos, é do Norte de Portugal e reside há 4 anos noutro país vizinho.

A empresa de cá fechou aquando do COVID e viu-se obrigada a aventurar-se a conhecer outros mundos, deixando os pais desmaiados com o medo da decisão.

A M. é corajosa e destemida. Foi. Não arranjou logo um trabalho na sua área, mas não foi isso que a desmotivou.

Começou a trabalhar numa grande superfície de serviços e surpreendeu-se com a rapidez com que dominou o inglês, além de outras competências inter-relacionais que desenvolveu.

Entretanto, aproveitou para tirar um mestrado e completou-o com sucesso, até chegar à oportunidade desejada: uma função de recursos humanos, na área de Office Administration, onde está há 2 anos.

Agora, a M. quer regressar a casa, quer estar mais perto da família e no seu país. A decisão está tomada. E de ânimo leve. A M. sabe o que quer e não tem ilusões sobre o que a sua escolha implica.

Na sequência desta decisão, tem feito alguns contactos com empresas de cá enviando CVs, mas as respostas não foram as esperadas. Nem tão pouco compreendidas. Parece que não há espaço para ela. É aconselhada a não regressar. Falam-lhe da discrepância de salários, do custo de vida e duvidam da sua motivação para esta mudança, uma vez que “lá está bem melhor”.

Fiquei incrédula, confesso.

A meio da nossa conversa senti um calafrio de desencanto: Estaria M. a pensar que havia cometido um erro ao decidir regressar? Havia motivos para isso. Afinal, tinha-se adaptado bem ao ambiente internacional, construído uma rede sólida de contatos e conquistado um trabalho que gosta, e as empresas portuguesas contactadas pareciam ignorar completamente estas conquistas.

Percebi que não, que deu a volta à situação, e transformou a deceção em força e resiliência.

“Ah e tal, a fuga de talento”, o desafio de os encontrar e o pesadelo de os reter! Estamos doidos? Lamentamo-nos por não ter pessoas, enquanto desincentivamos quem quer regressar a fazê-lo?

Que falta de coerência é esta? Certamente uma frustração para quem quer voltar ao seu país de origem, e talvez uma demonstração nossa de uma certa necessidade de nos afirmarmos como desgraçados sem recursos, será?

E que auto boicote é este? Trata-se de falta de visão de longo prazo, ou de relutância em investir na integração de pessoas com experiências internacionais? Isto limita a nossa capacidade de inovar e competir globalmente.

A M. ganhou ainda mais vontade de regressar quando recebeu o 5º “não”. A M. é exigente, percebeu que não será fácil, mas vai continuar a tentar. A decisão não foi impulsiva; foi o resultado de uma reflexão séria sobre o que realmente importa para si: estar mais perto de sua família e contribuir para o desenvolvimento de seu país.

Delineou próximos passos e não vai desistir, ciente de que a reintegração vai exigir paciência, resiliência e uma abordagem estratégica para estabelecer pontes entre o que aprendeu lá fora e as necessidades do mercado de trabalho local.

Estou a torcer por ela!

Querem ver que agora passamos, também, a ter de nos preocupar com a evangelização para a aceitação dos que foram, experimentaram e vingaram?

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