Assédio no trabalho: A luta por um ambiente de trabalho saudável

Pode suscitar-se a questão se devemos continuar a discutir o assédio no trabalho, um tema que já foi amplamente debatido. A resposta é sim. A persistência deste problema e os dados sobre a sua prevalência, demonstram que o assédio no local de trabalho ainda é uma realidade que precisa de atenção contínua e acções efectivas.

Por Félix Bernardo, sócia, responsável Área Laboral da Caldeira Pires

 

Em Portugal, apesar da legislação em vigor, como o Código do Trabalho que prevê medidas contra o assédio, a prática ainda é recorrente e muitas vezes silenciada. As vítimas, com medo de represálias ou descrédito, raramente denunciam os abusos. Este silêncio é frequentemente perpetuado por uma cultura empresarial que minimiza as queixas e, em alguns casos, protege os agressores. Consequentemente, um ambiente de trabalho tóxico pode levar a altos índices de rotatividade, aumentando os custos de recrutamento e formação de novos trabalhadores.

Ora, empresas com altos índices de assédio têm menor produtividade e eficiência. Segundo um estudo realizado pela Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), 16,7% dos trabalhadores portugueses afirmam ter sido vítimas de assédio moral no local de trabalho, enquanto 12,6% relataram ter sido alvo de assédio sexual. Estes números não só revelam uma realidade que merece a nossa atenção, mas também sublinham a necessidade de intervenção para garantir o bem-estar no local de trabalho.

 

Benefícios na luta contra o assédio

Empresas que adoptam políticas rigorosas contra o assédio e promovem um ambiente de trabalho inclusivo e respeitador conseguem encontrar muitos mais benefícios. Primeiro, a produtividade aumenta consideravelmente. Trabalhadores que se sentem bem e valorizados são mais produtivos, contribuindo deforma mais eficaz para os objectivos da empresa.

Além disso, a redução do absentismo e da rotatividade economiza custos significativos relacionados com o recrutamento e a formação de novos colaboradores, permitindo uma utilização mais eficiente dos recursos humanos e financeiros.

A melhoria da reputação empresarial é outro benefício importante. Empresas com uma cultura de trabalho positiva são mais atractivas para novos talentos e podem beneficiar de uma melhor reputação no mercado, tanto entre clientes e parceiros, quanto entre potenciais colaboradores.

 

Falhas na aplicação da lei

Recentemente, uma notícia publicada no Expresso revelou que um em cada cinco profissionais em Portugal é alvo de assédio no trabalho. Este dado sublinha a persistência e a gravidade deste problema, evidenciando a necessidade de acções mais contundentes para proteger os trabalhadores e assegurar um ambiente laboral seguro e saudável.

Apesar das protecções legais, a aplicação efectiva destas leis é muitas vezes insuficiente. Muitos empregadores ainda não implementam políticas claras contra o assédio, nem fornecem formação adequada aos seus funcionários.

As queixas de assédio são, por vezes, tratadas de forma negligente, sem a devida investigação ou consequências para os perpetradores.

Ora, esta falha pode perpetuar o problema e dar a impressão de que tais comportamentos são tolerados.

 

Passos positivos

No entanto, nem tudo são más notícias. Portugal ratificou a Convenção n.º 190 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre a eliminação da violência e do assédio no mundo do trabalho. Adoptada em 2019, esta convenção é o primeiro tratado internacional que aborda especificamente a violência e o assédio no trabalho. A ratificação por Portugal, que ocorreu recentemente, representa um compromisso sério em combater este problema de forma sistemática.

A ratificação desta convenção por Portugal reforça o compromisso do nosso país em garantir um ambiente de trabalho seguro e digno para todos.

Este é um passo significativo que deve ser acompanhado por esforços concretos para assegurar a sua implementação efectiva.

 

A necessidade de uma mudança cultural

Para combater eficazmente o assédio no trabalho, é necessária uma mudança cultural. As empresas devem adoptar uma postura de tolerância zero, implementando políticas rigorosas e procedimentos claros para a denúncia e investigação de casos de assédio.

Além disso, é essencial promover um ambiente de trabalho inclusivo e respeitador, onde todos os funcionários se sintam seguros e valorizados.

 

Meios de reacção

Se uma pessoa for vítima de assédio no trabalho, deve tomar as seguintes medidas:

Denúncia interna

Pode reportar o incidente à pessoa ou ao departamento responsável, geralmente os Recursos Humanos, que devem investigar e tratar a situação com confidencialidade. A empresa é obrigada a instaurar os respectivos procedimentos disciplinares ao tomar conhecimento da situação.

Denúncia externa

Se preferir ou se a empresa não tiver um responsável adequado, pode denunciar a entidades externas, como:

  • Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE)

800 204 684

geral@cite.pt

https://assedio.cite.gov.pt/queixa-por-assedio/

  • Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) – para o sector privado

707 228 448

https://portal.act.gov.pt/Pages/queixa-denuncia.aspx

  • IGF – Autoridade de Auditoria – para o sector público

LTFP.art4@igf.gov.pt

https://igf.gov.pt/informacao-assedio-em-contexto-laboral-no-setor-publico

  • Tribunais

  

O assédio no trabalho é um tema que requer a nossa atenção e que precisa de ser abordado com o devido cuidado.

Só através de uma mudança cultural e de uma aplicação rigorosa da lei podemos garantir que todos os trabalhadores desempenham as suas funções, com dignidade e num ambiente de trabalho seguro.

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