Como tornar a gestão do talento mais proactiva: da fidelização ao reconhecimento

Como líderes, aprendemos desde cedo nas nossas carreiras a avaliar as características mais desejadas para as nossas equipas. Ágeis, flexíveis, criativas, eficientes, proactivas. Quem nunca sentiu ter a sorte grande quando encontrou um profissional “completo”? 

Por Juliana Mercês, Career associate da Mercer Portugal

 

Vamos usar a proactividade como exemplo. Uma definição muito comum para o profissional proactivo é o de uma pessoa capaz de antecipar situações e estar preparada para lidar com elas mesmo antes de acontecerem. O que é algo extremamente positivo tendo em conta os tempos incertos em que vivemos, certo?

De facto, é. Um colaborador que antecipa problemas ajuda uma empresa a estar sempre munida com soluções ou planos de contingência. Um profissional proactivo é – e não poderia ser diferente – um desejo de qualquer líder, de qualquer organização que queira inovar e manter-se competitiva e relevante. Mas, e a sua organização? Está preparada e disposta a ser proactiva com este colaborador?

A partir do momento em que os RH começam a trabalhar, tendo por base a abordagem da experiência do colaborador, a preocupação com a retenção de talento pode parecer um tanto contraditório e eu vou mostrar porquê.

 

Do processo para a jornada.

Actuar tendo por base a abordagem da Employee Experience implica uma mudança de paradigma relativamente a como devemos liderar as organizações. Na Mercer, chamamos a este novo momento da relação organização-colaborador de The Lifestyle Contract, onde se coloca as necessidades dos colaboradores no centro da estratégia da organização, com foco nas necessidades de bem-estar, pois o colaborador torna-se o protagonista da sua própria experiência. Assim, as empresas devem cada vez mais focar os seus esforços em políticas e iniciativas que promovam experiências de trabalho mais saudáveis.

E como é que conseguimos construir experiências de trabalho mais saudáveis? Trabalhar com jornadas e experiência do colaborador significa pensar em todos os momentos e pontos de contacto que o colaborador tem com a organização, que experiências vive e que emoções regista ao longo da sua relação com a empresa. Se o colaborador registar emoções maioritariamente positivas, isto significa que a sua experiência de trabalho ao longo da sua jornada e a relação que constrói com a organização é uma relação mais saudável e positiva. Isto acontece, porque boas experiências reforçam os laços de uma relação, sendo indicadoras de que existem mais memórias positivas do que negativas.

O problema é que muitas empresas ainda trabalham em silos e concentram-se apenas nos processos, actividades e tarefas que têm controlo, o que dificulta o foco no cuidado e num olhar mais sistémico sobre a jornada, ambos necessários para gerar e manter a conexão com o colaborador e construir boas relações de trabalho.

 

Da fidelização ao reconhecimento.

Ora, se o foco está na relação que queremos construir, os RH, alinhados com a liderança da organização, passam a ter uma postura muito mais proactiva e intencional com o colaborador. Falar em retenção de talento neste contexto deixa de fazer sentido, uma vez que esta é uma estratégia normalmente reactiva, na qual se criam planos de acção para melhorar o clima organizacional, a proposta salarial e a oferta de benefícios de modo que os melhores talentos permaneçam na organização.

Mas porque é que as propostas de retenção tendem a ser recusadas já que trazem verdadeiras melhorias para o colaborador? Porque são muitas vezes realizadas, depois do talento ter retomado o mercado de trabalho. Ou seja, depois da relação e conexão emocional com a organização terem sido quebradas. Por mais interessante que possa ser a proposta, a mensagem que fica para o talento é: «Porquê só agora, que quero ir embora é que sou reconhecido e valorizado?»

 

De uma gestão reactiva para uma gestão proactiva.

Quando a gestão de talento trabalha de forma preventiva e preditiva, concentra-se em criar e promover condições e ambientes de trabalho que os colaboradores não pensam em deixar. Infelizmente, tal não impede por completo a saída de talentos, mas contribui significativamente para a diminuição da taxa de turnover. Investir com maior proactividade em iniciativas de reconhecimento e valorização dos colaboradores previne a desconexão emocional dos mesmos com a organização. Os RH e as organizações que adoptam esta estratégia têm clara a importância e o impacto que relações e experiências positivas têm no engagement e na produtividade.

Está mais do que provado que os colaboradores deixam as empresas porque não se sentem reconhecidos ou valorizados. Iniciativas de reconhecimento bem trabalhadas, levam a uma maior satisfação com o trabalho. E o reconhecimento pode vir nas mais diversas formas – desde um simples e-mail de agradecimento até um prémio no final do ano.

No entanto, o reconhecimento e a valorização do talento não se devem reduzir a incentivos financeiros, políticas de aumento salarial e promoções. Claro que são muito importantes, sobretudo, tendo em consideração o contexto actual e as crescentes preocupações com a inflação e o cenário económico, mas há mais alternativas. É verdade que, a busca por melhores salários continua a ser uma das maiores razões para os colaboradores deixarem uma empresa, mas caminhamos cada vez mais para um mercado de trabalho extremamente competitivo e centrado nas necessidades do colaborador, o que aumenta o poder de negociação do talento na hora de escolher o seu next best place to work.

A realidade pós pandemia inclui escolher empresas que: pagam mais e melhor, que oferecem melhores benefícios não só para si, mas também para sua família, que se preocupam com a saúde mental e o bem-estar, que entendem que a flexibilidade não se trata apenas de onde e quando, que trabalho é uma parte integrante da vida e que a vida deve ser mais do que um percurso trânsito-casa-trabalho-casa ou um episódio sofrido e nada prazeroso de Survivor.

Uma gestão proactiva do talento exige mudanças ao nível do comportamento, da mentalidade e também da estrutura por parte das lideranças e organizações. Neste sentido, as empresas que estão a inovar, procurando respostas mais customizadas à comunidade de talento que querem atrair, reconhecer e valorizar ocupam os lugares da frente no que diz respeito à guerra por talento.

Mas, para mim, a pièce de résistance de uma abordagem mais proactiva, de verdadeiramente evoluir da retenção ao reconhecimento, é compreender que, mesmo que o talento deixe a organização, isso não significa necessariamente que já não esteja emocionalmente conectado com ela. Significa apenas que a relação mudou, que o momento de vida do colaborador é outro e deixou de ser compatível com o momento de vida da empresa, mas a nova relação não precisa de ser negativa. Programas de Alumni, ou eventos de confraternização e networking de formers employees são excelentes exemplos de como manter uma relação “activa” com antigos colaboradores. Contudo, tal só é possível de construir com uma cultura de transparência, feedback e relações genuínas.

Seja claro quanto ao tipo de relação que pretende estabelecer com o seu talento desde o início do “namoro” (recrutamento) e compreenda que a forma como escolhe relacionar-se tem impacto – que pode ser positivo ou negativo. A escolha de criar relações, ambientes e experiências positivas é intencional.

Assim, líderes de uma geração cada vez mais crítica e instruída deparam-se com uma decisão importante, num futuro cada vez mais presente: continuar apenas a reagir aos movimentos do mercado e da comunidade do talento ou, começar a agir da mesma forma que esperam que os seus colaboradores ajam: sendo proactivos, antecipando o próximo movimento. E a sua empresa, como tem trabalhado este tema?

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