Consulting House: Os paradoxos da inclusão autêntica

Quando pensamos em liderança inclusiva, relacionamo-la geralmente com diversidade, equidade e inclusão. É do “I” de inclusão que estamos a falar através da lente da liderança.

O pacote DEI tende a focar-se na diversidade demográfica, que diz respeito a coisas como género, etnia, idade, etc. A diversidade demográfica é a casca exterior que nos diferencia, porque é a mais visível. Basta olhar para alguém e vê-se. Mas há outros tipos de diversidade.

As pessoas têm diferentes preferências de aprendizagem, apetência pela mudança e processos de pensamento. Chamamos a isso diversidade cognitiva. As pessoas têm também diferentes tipos de cérebros. Podemos falar de cérebros com Asperger, altamente sensíveis, ou psicopáticos. Todos estes tipos de cérebros (e outros) têm razões evolucionárias para existir. Chamamos a isto neurodiversidade. Também há diversidade social, que está ligada aos grupos sociais que representamos: a nossa cultura, religião, língua, etc. Tudo isto é construído sobre a nossa diversidade biológica, a constituição genética que determina a nossa singularidade. A diversidade é diversa.

 

A liderança requer inclusão
A variável mais importante para explicar o desempenho futuro de uma empresa é o engagement das suas pessoas. O nível de energia discricionária que elas decidem colocar no trabalho. Mas as pessoas só se comprometem e são leais à empresa se se sentirem incluídas. Se nos sentirmos excluídos, se não for seguro sermos nós próprios, não daremos o nosso melhor no trabalho.

A liderança requer ajudar os nossos colaboradores a trazerem o seu “melhor eu” para o trabalho, serem os melhores profissionais que podem ser. E isso só acontece através da inclusão.

Quando lidamos com outros como uma representação de género, idade, etnia, religião, não somos inclusivos. «Não acho que esta pessoa seja adequada para a promoção porque é demasiado velha», por exemplo, é um julgamento baseado na idade que não considera factores individuais que qualifiquem a pessoa para a promoção. Aplico a esta pessoa o estereótipo relativo à idade. Trato-a como um representante do grupo demográfico a que pertence.

 

O paradoxo do preconceito inverso 
Queremos que os outros se relacionem connosco como indivíduos, incluindo a nossa diversidade. Mas, se a relação for determinada pelas nossas dimensões da diversidade, então o que sou como pessoa torna-se uma caricatura de um grupo. Não quero que alguém pense: «Esta pessoa deve preencher a vaga porque é realmente velha.» Isto não é inclusão, isto continua a ser lidar com alguém como uma representação de um grupo social.

O primeiro paradoxo é que, em sistemas humanos, não é possível criar critérios de gestão baseados na diversidade que não tenham resultados negativos. Não podemos dizer: vamos focar-nos em contratar pessoas mais velhas sem que isso seja negativo para as pessoas mais jovens. Embora acredite que a maioria dos gestores queira incluir, às vezes vêem a inclusão como um jogo de soma zero: para alguém ganhar alguém tem de perder. Para incluir os anteriormente excluídos, devo excluir os anteriormente incluídos.

Este é o paradoxo da inclusão como uma manobra de marketing: foca-se nas dimensões visíveis em vez de na essência humana. A inclusão deve provir de relações autênticas entre líder e equipa. Eu, como líder, devo ser autêntico e relacionar-me com cada uma das minhas pessoas como ser único que é.

A inclusão autêntica ajuda líderes a relacionarem-se de com os seus colaboradores levando em consideração e aceitando a diversidade, mas não fazendo dela o fator determinante do seu comportamento para com a pessoa.

Devemos ser inclusivos para que as pessoas se sintam bem-vindas e aceites para darem o seu melhor no trabalho, não porque as suas características são as “certas da moda”, mas porque todo o talento merece ser incluído, independentemente das suas características. A maioria das pessoas concordaria com a frase anterior. Mas teria alguma dificuldade em torná-la real por causa dos seus preconceitos.

 

O paradoxo da espontaneidade
Todos temos preconceitos que nos forçam a tomar decisões rápidas, automáticas e inconscientes sobre os outros. Julgamo-los com base em indicadores externos ou até comportamentos genéricos e tiramos conclusões gerais sobre quem eles são. Uma das conclusões mais típicas é: «É um(a) das(os) nossas (os) ou não?»

Tendemos a sentir-nos mais confortáveis com pessoas que se parecem connosco, falam como nós, pensam como nós e agem como nós. E este conforto emocional de estar rodeado de pessoas semelhantes é negativo para as empresas.

 

O paradoxo da autenticidade
Se alguém recruta pessoas semelhantes a si, não terá diversidade na equipa. Todos terão o mesmo tipo de mentalidade, linguagem e regras tácitas. Se alguém ligeiramente diferente em qualquer característica entrar na empresa, essa pessoa sentirá um ambiente pouco acolhedor. E o líder terá mais dificuldade em geri-la do que aos outros. «Agora tenho de me ajustar apenas a uma pessoa. Não posso agir automaticamente como de costume. Preciso de parar e pensar. Isto é ineficiente, um desperdício de esforço e energia. Não posso ser autêntico.» Isto, por sua vez, reforça o sentimento: «Preferia ter alguém na minha equipa que se parecesse, agisse, falasse e pensasse como eu.»

Se permitirmos que os nossos enviesamentos cognitivos e preconceitos controlem as nossas decisões como líderes, acabaremos com equipas muito uniformes, não inovadoras e com “pensamento de rebanho”. Isto é perigoso porque reduz a diversidade cognitiva da equipa.

A autenticidade baseada na espontaneidade é não-inclusiva por natureza. Os nossos preconceitos e enviesamentos de preferência são espontâneos. Para sermos inclusivos devemos compensar ou neutralizar o seu efeito. Mas isto representa um esforço que é sentido como o oposto da autenticidade. Ser espontâneo é não inclusivo, mas ser inclusivo é não espontâneo, logo inautêntico. Como resolver estes paradoxos?

 

A consciencialização nunca é suficiente
Ensinar as pessoas sobre os seus próprios preconceitos e vieses ajuda, mas a conscientização não é suficiente. A inclusão é uma acção. Não é uma reflexão. Não me torno inclusivo apenas a pensar. Preciso de agir inclusivamente.

A conscientização dos preconceitos é o primeiro passo. Mas precisamos de neutralizar e compensar os preconceitos com processos de gestão deliberados. O recrutamento e a promoção são os mais óbvios. Todos temos preconceitos, mas nem todos temos os mesmos preconceitos sobre o mesmo tipo de pessoas. Podemos ter um preconceito de idade, mas não um preconceito de peso corporal, por exemplo.

Quando estamos cientes dos nossos próprios preconceitos, podemos criar equipas que não compartilham dos mesmos enviesamentos ao fazer recrutamento, selecção e promoção.

Partilhar e compreender critérios objectivos para a observação e análise de comportamento, ajuda-nos a ter avaliações mais objectivas e a fazer melhor uso dos sistemas e ferramentas de gestão da nossa empresa. Isto é importante porque quando as pessoas não entendem os critérios pelos quais a empresa escolhe os vencedores, se não vencerem atribuirão a escolha a qualquer característica minoritária.

Tudo o que está em jogo nestes momentos de selecção e promoção também está em jogo nas operações diárias de gestão de pessoas. Com uma diferença: os gestores estão menos cientes dos seus processos mentais. É uma coisa quando és levado a estar consciente dos teus preconceitos em situações excepcionais, e outra quando estás tão focado em objectivos e problemas quotidianos que os teus automatismos (leia-se preconceitos) têm permissão para comandar o navio.

Na minha experiência com desenvolvimento de liderança, frequentemente vejo que falhas genéricas em competências de liderança – como observação de comportamento, feedback, gestão de desempenho, comunicação – são interpretadas como discriminação. A razão original não era discriminar alguém, mas devido a um processo de liderança mal conduzido, o resultado é percebido como discriminatório pela pessoa “vítima do processo”.

 

A inclusão é uma qualidade autêntica
A inclusão é a acção pela qual o líder abraça a singularidade, celebrando o valor que as pessoas trazem, independentemente das diversidades que representam. Fazer com que os nossos líderes sejam inclusivos significa educá-los sobre o porquê, o quê e o como da liderança.

Melhorar a forma como gerimos pessoas e as integramos na equipa exige sair do automático do que já fazemos inconscientemente para aprender novos processos, competências e métodos de gestão de pessoas. Aceitar que nos vamos sentir menos “autênticos” com o nosso ego não-inclusivo, para nos familiarizarmos gradualmente com uma forma de ser mais inclusiva é parte do processo de desenvolvimento pessoal.

Todo o desenvolvimento é sentido como inautêntico até estar consolidado em novos automatismos. Progressivamente, as novas práticas tornar-se-ão mais “confortáveis”. Mas a autenticidade não tem que ver com conforto. Tem que ver com valores. Ou acreditamos que temos os mesmos direitos independentemente da nossa diversidade, ou não. E essa é outra história.

 

Este artigo faz parte do Caderno Especial “Igualdade, Diversidade e Inclusão” publicado na edição de Julho (n.º 163) da Human Resources.

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