Costuma faltar-lhe a paciência? Leia este artigo

Sempre quis escrever sobre paciência, mas esta sempre me faltou. Hoje foi o dia. Escolhi propositadamente desacelerar, faço-o sem sensação de urgência e com a convicção de que todas as coisas levam o seu tempo. E, para serem feitas como deve ser, demoram o tempo que demorar.

 

Por Rita Oliveira Pelica, Chief Energy Officer ONYOU & Portugal Catalyst – The League of Intrapreneurs

 

Hoje, já com a experiência de algumas décadas de vida, entendo que a paciência pode realmente ser um poder (há quem lhe chame virtude!), para quem trabalha em organizações e, especialmente, para quem se diz ser intraempreendedor. E a paciência não é uma palavra tão “desgastada” como a resiliência, convenhamos. Paciência é a capacidade de esperar calmamente por um resultado ou de tolerar dificuldades e contratempos, sem ficar frustrado. Resiliência, por outro lado, é a habilidade de se recuperar rapidamente perante dificuldades. Ambas são qualidades valiosas, não passivas, mas servem propósitos ligeiramente diferentes.

Mas como resistir à imposição de acelerar, a que estamos constantemente sujeitos num mundo assente na pressa? Permitirmo-nos a que as coisas demorem o seu tempo? Vai doer. Desacelerar dói, mas se tornarmos esta prática num exercício diário, o desconforto deixa de ser incómodo. Confesso que tenho praticado, já quase não sinto dores. Já experimentaram? Sem ficarem ansiosos? Sim, abrandar pode ser uma fonte de stress para algumas pessoas, daí que estas se automediquem e corram ainda mais depressa. Se não pararem, não vai doer. Simples.

Foi num destes tranquilos momentos de pesquisa mais profunda sobre o tema que encontrei o conceito de paciência cognitiva: a habilidade de processar o mundo sem pressa, mas mantendo o nível de exigência. Não fazendo “as coisas pela rama” ou lendo apenas “as gordas”. Em inglês, chama-se skimming: a estratégia baseada em leituras rápidas, nas quais paramos apenas no início e no final de um texto ou informação, retendo as partes mais superficiais do que está diante de nós, seja um livro ou um artigo. O oposto do skimming é o scanning, isto é, a análise meticulosa de cada parte de uma informação. Se devorarmos constantemente informação como quem come fast food, sem capacidade analítica, crítica e reflexiva, certamente o nosso sistema de processamento e de tomada de decisão não vai digeri-la da melhor forma. E notem como esta capacidade de análise pode ser diferenciadora na exploração e na avaliação de oportunidades de negócio.

Trabalhar a paciência cognitiva é uma atitude para se conseguir lidar melhor com os desafios da vida e do trabalho, é treinar a atenção e o prazer da calma. Se vivemos numa sociedade que não valoriza a paciência, paciência! Podemos sempre pensar pela nossa cabeça e usar o cérebro, para não cairmos em contos demagógicos e em fake news. Recordo- -me sempre daqueles clientes/chefes que têm muita pressa em receber as nossas propostas/relatórios, mas que meses depois ainda não deram qualquer feedback. Sim, é preciso ter muita “paciência organizacional” (outro novo conceito?) e não me refiro apenas às burocracias…

Oliver Burkeman, no livro “4000 Semanas – Gestão do Tempo para Mortais”, apresenta-nos três princípios úteis para “dominarmos” o poder da paciência enquanto força criativa na vida quotidiana: 1) aprender a gostar de problemas: estes são desafios aos quais somos diariamente submetidos; temos de ter a capacidade de os resolver e não de os alimentar; 2) adoptar o incrementalismo radical, reconhecendo que é preciso cultivar a paciência e a noção de progresso ao fazer-se algo, aceitando que a própria criatividade leva o seu tempo e parece ter isenção de horário de trabalho; 3) a originalidade encontra- se na extremidade oposta da banalidade; dá trabalho, exige concentração para se ir além do óbvio e do caminho que todos os outros fazem.

Vamos treinar a nossa paciência? Deixo aos leitores o desafio que assumi comigo mesma, inspirada pela professora Jennifer Roberts, da Universidade de Harvard. Escolham um quadro ou uma escultura num museu e fiquem a contemplá- lo durante três horas, sem interrupções. Parece que só custam os primeiros 80 minutos…

E contem-me como foi a experiência!

 

Este artigo foi publicado na edição de Abril (nº. 160) da Human Resources.

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