COVID-19. Saiba se o seu emprego está seguro
A COVID-19 tem tido um forte impacto na vida profissional de muitos portugueses, com o fecho de empresas, despedimentos colectivos ou recurso ao lay-off simplificado. A Deco – Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor esclarece quais os requisitos para que as empresas possam recorrer a estes mecanismos e quais os direitos dos trabalhadores.
A Deco sublinha que que não foram alteradas as regras relativas à cessação do contrato de trabalho e, mais especificamente, aos casos em que o empregador pode despedir um trabalhador. As circunstâncias continuam a ser as mesmas. Pode haver despedimento com justa causa quando há razões que o justificam, devendo ser instaurado um processo disciplinar ao trabalhador.
Neste momento, porém, há trabalhadores que continuam receosos quanto ao futuro, com a perspectiva de despedimento colectivo ou a extinção do posto de trabalho. Há empresas que não são capazes de suportar os efeitos desta pandemia e podem fechar portas ou reduzir consideravelmente a quantidade de profissionais ao seu serviço. No entanto, as regras para a cessação dos contratos de trabalho não estão suspensas enquanto se mantêm em vigor todas as restrições e condicionalismos impostos pelas autoridades de saúde, governativas ou administrativas.
Se as empresas, ao dispensarem os trabalhadores, desrespeitarem essas regras, o despedimento será considerado ilícito. Se for pressionado pela entidade patronal a assinar um acordo de rescisão, o trabalhador dispõe de sete dias para mudar de ideias e voltar atrás. Contudo, se já tiver sido paga alguma compensação pela cessação do contrato, terá de devolver o que tiver recebido. A Deco aconselha a não mexer nesse dinheiro enquanto não tiver a certeza de que aceita a rescisão.
A empresa pode recorrer ao despedimento colectivo?
Para o fazer, a empresa tem de invocar uma das circunstâncias indicadas na lista em baixo. E deve abranger, pelo menos, dois ou cinco trabalhadores, num período máximo de três meses, conforme se trate, respectivamente, de empresas com dois a 49 trabalhadores (micro ou pequena empresa) ou, no mínimo, com 50 (média ou grande empresa).
As situações em que a empresa pode recorrer a esta figura legal são:
- Razões estruturais – desequilíbrio económico-financeiro, mudança de actividade, reestruturação da organização produtiva ou substituição de produtos que constituam parte substancial do negócio da empresa;
- Razões tecnológicas – por exemplo, alterações nas técnicas ou processos de fabrico, automatização dos instrumentos de produção, informatização de serviços ou automatização de meios de comunicação;
- Razões de mercado – redução da actividade da empresa originada por uma diminuição previsível da procura de bens ou serviços ou pela impossibilidade de colocá-los no mercado, ou em caso de encerramento total ou parcial da empresa.
Formalidades que o empregador tem de cumprir
Comunicar, por escrito, aos trabalhadores, que poderão ser alvo de um despedimento colectivo.
Informar a comissão de trabalhadores ou as organizações sindicais que representem os trabalhadores a despedir. Não havendo, estes podem escolher uma comissão representativa com o máximo de três ou cinco membros, conforme o despedimento abranja até cinco ou mais de cinco trabalhadores. Esta comissão recebe uma cópia da comunicação. Esta deve indicar, entre outros aspectos, os fundamentos da decisão, o número de trabalhadores a despedir, as respectivas categorias profissionais e critérios para os seleccionar.
Enviar outra cópia, acompanhada de toda a informação relevante, ao Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.
Informar e negociar com os representantes dos trabalhadores, para se chegar a um acordo quanto às medidas a tomar e reduzir ao mínimo o número de despedimentos. Destas reuniões é elaborada uma ata, que será enviada ao Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.
Celebrar acordo ou, se falhar, 15 dias depois da comunicação inicial, comunicar a decisão de despedimento, por escrito, a cada trabalhador abrangido, referindo expressamente o motivo e a data de cessação do contrato, bem como o montante da compensação que lhe será paga, a forma e local de pagamento. Esta comunicação deve respeitar a seguinte antecedência mínima:
- 15 dias, para trabalhadores com antiguidade inferior a um ano;
- 30 dias, para quem tenha entre um ano e quatro anos e 11 meses;
- 60 dias, para uma antiguidade entre cinco anos e nove anos e 11 meses;
- 75 dias, para trabalhadores com, pelo menos, mais de 10 anos de empresa.
Quanto recebe o trabalhador quando o contrato cessa
Em primeiro lugar, tem de receber tudo o que respeita a férias e subsídios, quer de férias, quer de Natal.
Se ainda não gozou férias, terá direito a receber um mês de férias vencidas no início do ano. Acresce ainda os proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal referentes ao trabalho prestado em 2020.
Exemplo: um trabalhador que ganhe 1000 euros e veja o seu contrato terminar no final do mês de Junho tem direito a:
- 1000 euros das férias não gozadas
- 1000 euros do subsídio de férias
- 500 euros de férias 2020
- 500 euros de subsídio de férias
- 500 euros de subsídio de Natal (6/12 x 1000) referente ao trabalho de 2020
No total, tem a receber 3500 euros (1000 + 1000 +500 + 500 +500).
A estes valores podem acrescer eventuais compensações ou indemnizações a que tenha direito, caso o contrato termine contra a sua vontade. Em regra, a compensação a receber corresponde a 12 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de trabalho. Porém, para contratos celebrados antes de 1 de Outubro de 2013, o cálculo das compensações por fim do contrato é diferente.
Falência da entidade patronal
Ainda que o tribunal declare a insolvência da entidade patronal, não determina a extinção dos contratos de trabalho. O administrador da insolvência, que está encarregado da gestão do que resta da empresa, continua a ter de fazer cumprir as obrigações próprias de uma entidade patronal. No entanto, pode fazer cessar os contratos dos trabalhadores que não sejam indispensáveis, para manter a empresa em funcionamento. Estes serão indemnizados de acordo com o regime do despedimento colectivo.
O maior problema é se o património da empresa não é suficiente para pagar essas indemnizações. Quando isso acontece, os trabalhadores podem recorrer ao Fundo de Garantia Salarial, através da entrega de um requerimento na Segurança Social, no prazo máximo de um ano a contar da data em que o contrato cessou. Só tem de provar o que têm direito a receber. Tanto pode tratar-se de salários como de indemnizações. A Segurança Social pagará, no máximo, o equivalente a seis meses de retribuição, com um limite mensal que corresponde ao triplo do salário mínimo nacional. Ou seja, 1905 euros (3 x 635).
O que é o lay-off?
Face à situação delicada por que passam muitas empresas, o Governo criou um lay-off simplificado, com o objectivo de evitar eventuais despedimentos.
O lay-off permite ao empregador suspender o contrato ou reduzir o período de trabalho, por razões conjunturais de mercado, motivos económicos ou tecnológicos e catástrofes ou outras ocorrências que afectem gravemente a sua actividade normal. Geralmente, são situações de crise, sendo o lay-off indispensável para assegurar a viabilidade da empresa e manter os postos de trabalho.
Tendo em conta que estamos perante uma situação anómala, foi publicada legislação com novas regras para facilitar o recurso a esta figura jurídica e ultrapassar as formalidades que tornam, normalmente, o processo moroso.
A empresa pode optar pela redução do horário de trabalho de alguns ou de todos os funcionários ou pela suspensão dos seus contratos. Enquanto estiver nesta situação, o trabalhador pode exercer outra actividade remunerada, fora da empresa. Se isso acontecer, deve comunicá-lo ao empregador, no prazo de cinco dias a contar do início da nova actividade, sendo reduzida a compensação referida abaixo, em “Apoio no pagamento aos trabalhadores”. Se não comunicar, perde a totalidade da compensação e terá de devolver os montantes recebidos. Pode ainda ser alvo de uma medida disciplinar do empregador. Só não há lugar à redução da compensação quando se trata de uma actividade exercida nas áreas do apoio social, saúde, produção alimentar, logística e distribuição.
O empregador deve comunicar ao Instituto da Segurança Social o início da nova actividade do seu trabalhador no prazo de dois dias a contar da data em que dela teve conhecimento.
Que empresas podem recorrer ao lay-off?
- As que encerraram total ou parcialmente a sua actividade ou o estabelecimento, devido às medidas que decorrem da declaração do estado de emergência ou a isso foram obrigadas pela legislação entretanto publicada ou por uma entidade administrativa.
- As que sofreram uma paragem total da actividade devido à interrupção das cadeias de abastecimento globais, bem como aquelas que viram as encomendas serem suspensas ou canceladas.
- As que registaram uma quebra abrupta e acentuada de, pelo menos, 40% da facturação, nos 30 dias anteriores à apresentação do pedido na Segurança Social, comparado com a média mensal dos dois meses anteriores ou com o período homólogo de 2019. Para as que tenham iniciado a actividade há menos de 12 meses, é a média desse período que serve de referência.
Para comprovar estas circunstâncias, a entidade patronal tem de elaborar uma declaração e juntar uma certidão do contabilista certificado da empresa. Tem ainda de ter a sua situação fiscal regularizada, bem como junto da Segurança Social. A qualquer momento, as entidades oficiais podem fiscalizar, para confirmar se a situação corresponde ao que foi descrito pela empresa.
Apoio no pagamento aos trabalhadores
Confirmada a situação de crise empresarial, a empresa pode solicitar à Segurança Social o apoio extraordinário à manutenção dos contratos de trabalho. Para tal, deve comunicar o facto previamente aos trabalhadores, por escrito, com indicação da duração previsível da situação. Se existirem delegados sindicais e comissão de trabalhadores, devem ser ouvidos.
O apoio consiste no pagamento de uma compensação que garanta ao trabalhador, em conjunto com o salário que a empresa continua a pagar-lhe (no caso de redução do horário, em que recebe o proporcional à sua retribuição mensal) e com o que receba numa eventual nova actividade, o correspondente a dois terços da sua retribuição bruta. O valor mínimo é igual ao salário mínimo nacional (635 euros) e o máximo corresponde ao triplo desse valor (1905 euros). O empregador é responsável pelo pagamento de 30% da compensação e a segurança social por 70 por cento. Para apurar o montante do apoio, é considerada a remuneração base, os prémios mensais e os subsídios regulares mensais. A Segurança Social disponibilizou uma calculadora para o cálculo do valor da retribuição em caso de redução. E uma outra calculadora para saber quando recebe se a empresa suspender totalmente a actividade.
Este apoio pode ser acumulado com um plano de formação aprovado pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), que permite receber uma bolsa correspondente a 30% do Indexante dos Apoios Sociais (IAS), ou seja, 131,64 euros (438,81 euros x 30%). Metade dessa verba (65,82 euros) é para o trabalhador e a outra metade para o empregador.
Apoio à formação
As empresas que estejam numa situação de crise empresarial provocada pela Covid-19, mas não recorram aos apoios mencionados em cima, podem aceder a um apoio extraordinário para formação profissional a tempo parcial. O objectivo é manter os respectivos postos de trabalho e reforçar as competências dos seus trabalhadores. Tem a duração de um mês e destina-se à implementação de um plano de formação organizado pelo IEFP, em articulação com a entidade patronal.
O apoio a atribuir a cada trabalhador abrangido é suportado pelo IEFP, em função das horas de formação frequentadas, até ao limite de 50% da retribuição bruta do trabalhador. O limite máximo corresponde ao salário mínimo nacional (635 euros).
Isenção do pagamento de contribuições
Outro auxílio às empresas que beneficiem destas medidas é a isenção total, durante o período em que as medidas são aplicadas, do pagamento das contribuições à Segurança Social da parte que está a seu cargo, relativamente aos trabalhadores abrangidos. Ou seja, só pagam a parte referente aos trabalhadores. Em princípio, não é necessário requerer a isenção, pois será concedida pela Segurança Social de acordo com a informação fornecida pelo IEFP.
Incentivo financeiro extraordinário
Para as empresas que beneficiem de alguma das medidas acima apresentadas, existe ainda a possibilidade de obterem um incentivo financeiro extraordinário, que servirá para estimular o regresso à actividade. Será pago de uma só vez pelo IEFP e terá o valor de um salário mínimo por cada trabalhador (635 euros). Para tal, é necessário apresentar um requerimento ao IEFP, acompanhado de uma declaração da empresa, em conjunto com uma certidão do seu contabilista certificado, que comprove a situação de crise.
Também é possível optar por receber o dobro dessa quantia (1270 euros) por trabalhador, pago de forma faseada ao longo de seis meses. Optando por esta modalidade, a empresa pode ainda beneficiar da dispensa de 50% do pagamento de contribuições para a segurança social a seu cargo, durante um determinado período:
- Um mês se o lay-off tiver durado um mês ou menos;
- Dois meses se tiver durado mais de um mês, mas menos de três;
- Três meses caso tenha durado três meses ou mais.
As empresas que beneficiem deste incentivo extraordinário não podem fazer cessar contratos de trabalho através de despedimento colectivo, por extinção do posto de trabalho ou por inadaptação, nem iniciar os respectivos procedimentos, não só enquanto estiverem a receber o incentivo, mas também nos 60 dias seguintes.
Retirada dos apoios
Se os apoios foram concedidos com base em declarações falsas da empresa, serão retirados. O mesmo acontecerá caso se verifique alguma das seguintes circunstâncias:
- Despedimento de trabalhadores, a menos que exista justa causa;
- Falta de pagamento aos trabalhadores da retribuição;
- Incumprimento pelo empregador das suas obrigações legais, fiscais ou contributivas;
- Distribuição de lucros durante o período em que as medidas estão em vigor;
- Desrespeito pelas obrigações assumidas ao abrigo da concessão dos apoios;
- Ter a trabalhar um funcionário que esteja com o contrato suspenso ou para lá do horário estabelecido no regime de redução do período normal de trabalho.
Medidas prolongadas até Setembro
Inicialmente criadas até ao fim de Junho, estas medidas foram prorrogadas até final de Setembro. No entanto, manteve-se a duração máxima de três meses para cada empresa. Aquelas que ainda não recorreram ao apoio extraordinário à manutenção de contrato de trabalho podem apresentar o requerimento inicial até 30 de Junho, podendo prorrogar mensalmente a aplicação da medida até ao máximo de três meses. Ou seja, as situações de lay-off iniciadas depois de 30 de Junho não dão acesso a este apoio.
O limite de três meses não se aplica, porém, às empresas e estabelecimentos que tenham de continuar encerrados por determinação legislativa ou administrativa, no âmbito da pandemia. O direito ao apoio extraordinário à manutenção de contrato de trabalho mantém-se enquanto permanecerem nessa situação. Quanto às restantes, caso atinjam o limite de renovações até 30 de Junho, podem prorrogá-lo até ao final de Julho.
Enquanto estiver a beneficiar destas medidas de apoio e nos 60 dias seguintes, o empregador não pode cessar o contrato de qualquer dos seus trabalhadores, através de despedimento colectivo ou por extinção do posto de trabalho.
Complemento para trabalhadores com salários mais baixos
Para auxiliar os trabalhadores que sofreram reduções salariais devido ao lay-off e têm retribuições mais baixas, foi criado um complemento de estabilização. Destina-se a quem tinha, em Fevereiro, uma remuneração base bruta até 1270 euros (o dobro do salário mínimo nacional) e beneficiou, entre Abril e Junho, do apoio durante, pelo menos, um mês completo. Este complemento corresponde à diferença entre a remuneração base de Fevereiro e a mais baixa dos meses em que esteve em lay-off. O montante pode variar entre 100 e 351 euros. Tem em conta apenas os valores das declarações de remunerações entregues até 15 de Julho, sendo pago durante o mês de Julho.