Criança hoje, profissional amanhã: Como o Escutismo pode ser fonte de desenvolvimento de competências transversais

Nos dias que correm, as competências assumem-se cada vez mais como um factor distintivo entre os diversos jovens que procuram ingressar no mercado de trabalho. As competências, principalmente as transversais, podem ser desenvolvidas em qualquer momento ou lugar, seja através da educação formal, não formal ou informal. Neste sentido, gostaria de falar-vos sobre o Escutismo, enquanto fonte de desenvolvimento de competências.

Por Carolina Figueiredo, licenciada em Recursos Humanos pelo ISCAP

 

Mas afinal, o Escutismo não é apenas uma atividade extracurricular?

O Escutismo é um movimento global de juventude de educação não formal (Scout, 2022). Sendo que, em Portugal está representado por duas associações: a Associação dos Escoteiros de Portugal (AEP) e o Corpo Nacional de Escutas (CNE). Como movimento de educação não formal, tem um método constituído por oito componentes, através dos quais transmite os seus valores e ensinamentos, nomeadamente: lei e promessa; vida na natureza; aprender fazendo; sistema de patrulhas; sistema de progresso; relação educativa; mística e simbologia e envolvimento na comunidade.

Em Portugal, o Escutismo é o maior movimento de juventude, sendo que, o CNE contou em 2022 com um total de 64 7076 associados (CNE, 2022), 50 465 dos quais eram crianças e jovens entre os 6 e os 22 anos.

Que competências transversais poderemos identificar nos escuteiros?

Antes de mais, importa referir que não podemos afirmar que apenas os jovens que fizeram um percurso escutista detêm as competências que referirei em seguida, podemos, no entanto, “afirmar que a experiência escutista pode ser diferenciadora no contexto profissional” (Barrosa, 2020, p.42). Neste sentido, convém ainda destacar que, embora o método e valores escutistas sejam universais, cada escuteiro é um jovem diferente, pelo que, os contextos em que se insere serão também diferentes e, consequentemente, terá acesso a oportunidades diferentes. “A forma como o jovem vive o seu percurso escutista varia também consoante a sua predisposição, envolvimento e integração no seu grupo” (Pereira, 2021, p.116).

Assim, consideramos que, durante o seu percurso escutista, o jovem tem a oportunidade de desenvolver algumas das competências transversais identificadas em seguida, entre outras:

 

Competências transversais: Acção/situação em que pode ter sido desenvolvida:
Adaptação/Adaptabilidade

Improviso/lidar com imprevistos

Os escuteiros realizam actividades na natureza, contactam com indivíduos nas paróquias, cidadãos da sociedade continuamente e estão constantemente a adaptar-se a novos contextos e situações imprevistas.
Criatividade Nas suas actividades são chamados a desenvolver um “imaginário”, isto é, criar ou adaptar histórias já existentes às actividades a desenvolver com o intuito de passar uma mensagem/moral da história que possa ser uma aprendizagem transposta para a vida de cada jovem.
Empatia Os escuteiros para além de conviverem com o seu grupo local, contactam também com outros escuteiros da sua diocese, de todo o país e de todo o mundo. Muitas vezes passam semanas inteiras com outros escuteiros que eram desconhecidos até ao momento e com os quais têm de realizar as tarefas que lhe são propostas. Esta interacção permite-lhes estabelecer uma conexão com os demais, colocando-se na pele deles e procurando compreender o que eles sentem.
Gestão de conflitos

Trabalho em equipa Liderança

As crianças e jovens organizam-se em equipas de 4 a 8 elementos. Cada equipa elege um líder e o líder em concordância com os demais elementos atribui a cada um deles um cargo que deverão desempenhar como por exemplo secretário; tesoureiro; guarda-material ou relações-públicas. Como em qualquer equipa, muitas vezes surgem conflitos. O líder é o responsável pela manutenção da harmonia no grupo e procurar resolver os potenciais conflitos evitando o envolvimento dos adultos.
Gestão de tempo

Flexibilidade

Todos os grupos de escuteiros têm um plano de actividades anual que habitualmente é bastante preenchido com actividades ao nível da paróquia, diocesano, nacional e, por vezes internacional. As crianças e jovens são desafiadas a organizar a sua vida pessoal, escolar e escutista por forma a terem uma vida equilibrada.
Organização de eventos

Planeamento e organização

Proatividade

Resiliência

Para a organização de actividades, o Escutismo privilegia a utilização do método de projecto. Este método é constituído por 4 fases principais: escolha; preparação; realização e avaliação.  À medida que a idade do escuteiro aumenta vai aumentando o seu envolvimento na organização de cada actividade sendo que, entre os 18 e os 22 anos tem um nível de autonomia quase total na organização de eventos sendo apenas supervisionados por um ou dois dirigentes (monitores adultos). Os jovens desta faixa etária têm vários projectos que consistem em eventos dos quais se destaca o projecto Cenáculo. Durante as suas actividades os jovens são encorajados a avaliar o que correu mal e a melhorá-lo da próxima vez.
Tomada de decisão

Espírito crítico

Uma das componentes do método escutista é o “aprender fazendo” isto significa que vão aprender e crescer através das experiências que têm, com os erros que realizam. Desde os 6 anos que os escuteiros têm uma responsabilidade seja de liderar, de fazer actas das reuniões, de organizar angariações de fundos, de guardar o material da equipa ou outra. Esta responsabilização permite-lhes compreender que todas as decisões que tomam têm consequências para eles e para os outros jovens da sua equipa e que é necessário pesar os prós e os contras antes de agir. Para além disto, o jovem é ensinado a questionar o que os outros lhe sugerem e a decidir com base nos seus conhecimentos e no que acredita estar correcto, não se deixando levar pelas opiniões dos outros, em suma, é desafiado a “impelir a sua própria canoa”.

 

Importa ainda referir que, será possível encontrar num jovem escuteiro valores como: “compreensão e respeito pelo outro; compromisso; lealdade/confiança e fraternidade/amizade” (Pereira, 2021).

Em suma, o escuteiro é acima de tudo, um jovem com uma empatia, espírito de serviço e cooperação apurados que está aberto a novas oportunidades e busca constantemente novas aprendizagens e experiências.

 

Bibliografia:

Barrosa (2020). O impacto do Escutismo no desenvolvimento de competências profissionais. https://www.iscte-iul.pt/tese/10884

CNE (2022). Atos oficiais: Censos 2022. http://www.escutismo.pt/dirigentes/recursos/oficiais/pag:recursos_oficiais/37bd987f-edc4-4b5d-b4d2-9208b2a2ee51

Pereira, M. (2021). Identidade Profissional e impacto na Gestão de Recursos Humanos – caso do Escutismo. https://repositorium.sdum.uminho.pt/handle/1822/74915

Scout (2022). Scout Movement. https://www.scout.org/scout-movement

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