Do cinema para a Gestão de Pessoas. O rei perdido, resgatado pela verdade e perseverança

“O Rei Perdido”, filme de Stephen Frears, com Sally Hawkins e Steve Coogan nos principais papéis, baseia-se em factos reais e aborda precisamente uma “real personagem”, tanto do passado, como do presente.

 

Por Paulo Miguel Martins, professor da AESE Business School e investigador nas áreas de Cinema, História, Comunicação e Mass Media

 

O rei Ricardo III de Inglaterra é a figura principal de uma das peças teatrais mais conhecidas de Shakespeare. Aí, aparece como um déspota sem escrúpulos, deformado por uma corcunda e assassino do jovem herdeiro do trono inglês, para conseguir ascender a monarca. Num breve e tumultuoso reinado, acabou por morrer numa batalha, exclamando a célebre frase «o meu reino por um cavalo», ao ver-se abandonado por todos. O seu corpo foi atirado ao rio e assim desaparece, castigado. Durante séculos, foi esta a narrativa que imperou e se propagou.

Já em pleno século XXI, uma senhora de nome Philippa Langley, mãe de dois rapazes e separada do marido, com um trabalho rotineiro, vive descontente com o rumo da sua vida. Tem uma doença rara que a torna incompreendida por familiares, colegas e amigos. A sua auto-estima é baixa. Um dia, vai com os filhos assistir à peça Ricardo III, fica fascinada pela representação do actor, mas mais ainda com a personalidade do rei. Seria mesmo assim “tão mau”? Ou teria sido incompreendido, alguém que viu a sua história ser escrita pelo adversário, o rei Henrique VII, que lhe sucedeu no trono, dando início a uma nova dinastia? No fundo, esse novo monarca tinha todo o interesse em denegrir o antecessor para legitimar o seu poder.

Philippa sente-se motivada em investigar o caso. Há algo que a liga a Ricardo III, um rei visto como disforme e, tal como ela, rejeitado pela sociedade. Pensa e reflecte no que fazer, procura informações e inicia uma breve pesquisa. Constata que não é a única que se interessa por essa personagem e decide marcar conversas ao vivo com os outros também fascinados pelo tema. No fundo, vai formando uma pequena equipa.

Fala com uns e outros, juntando dados soltos, que vai interligando. Descobre que a “narrativa oficial” tinha várias contradições. Uma das pessoas envolvidas refere-lhe a certa altura que o rei até poderia estar enterrado num local determinado. É apenas um feeling, uma sugestão, mas ela conclui que fazia sentido. Vai ao local, apesar de ter de se deslocar até Leicester, que não ficava perto. Resolve então recorrer às autoridades locais, tanto da universidade como da câmara municipal. Consegue uma reunião e, apesar do aparente “pouco jeito ao expor”, com a sua motivação, consegue atrair o apoio deles para o projecto da procura do túmulo de Ricardo III. Quando tudo está bem encaminhado, os fundos monetários são cortados. Ela não desiste e, com amigos, lança uma campanha de crowdfunding que se torna um sucesso.

As escavações começam e as ossadas do rei são encontradas. As autoridades locais e universitárias ficam com os louros. Philippa é ignorada, mas em vez de desanimar, insiste em continuar a luta pela restauração da boa reputação de Ricardo III. Ela não quer fama, quer apenas restabelecer a verdade e, juntando várias peças, consegue-o. A narrativa oficial sobre esse monarca é reescrita, e Isabel II reabilita-o como rei.

O êxito de Philippa também é pessoal. Com o seu empenho e motivação, torna a unir a família, reconciliando-se com o marido e contando com o apoio de inúmeros novos amigos. As aparências enganam e lutar pela verdade vale mesmo a pena!

 

Este artigo foi publicado na edição de Maio (nº. 161) da Human Resources, nas bancas.

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