Entrevista a Maria Manuel Mota, Gulbenkian Institute for Molecular Medicine: Criar uma visão que inspire (e salve) vidas

A recém-criada Fundação GIMM – Gulbenkian Institute for Molecular Medicine propõe-se enfrentar os maiores desafios globais de saúde. Maria Manuel Mota não se coíbe em afirmá-lo e tem claro o “plano” para o alcançar: investir continuamente em formar e atrair talento de excelência e na criação de infra-estruturas científicas avançadas.

 

Por Ana Leonor Martins | Fotos Fundação GIMM

 

O Instituto Gulbenkian de Ciência e o Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes fundiram-se para dar lugar à Fundação Gulbenkian Institute for Molecular Medicine. A liderá-la está Maria Manuel Mota, que destaca as vantagens, como a «maior capacidade de atrair talento global e de investir em infra-estruturas científicas de ponta», mas também não esconde os desafios, identificando o principal: a «integração de culturas organizacionais distintas», consciente de que será necessário «deixar para trás algumas tradições para dar a oportunidade a que novas cresçam».

Fazendo notar que a diversidade «não é apenas uma questão ética, mas também uma estratégia científica, pois promove diferentes abordagens e soluções criativas para os problemas complexos» que enfrentam na investigação, Maria Manuel Mota partilha que um quarto dos seus 500 cientistas não são portugueses. Do mesmo modo, não acredita que seja preciso impedir que os portugueses saiam do País. Até porque a própria o fez. Mas acredita que Portugal tem muitos argumentos para atrair e reter as “mentes brilhantes” de que necessitam para alcançar os seus objectivos.

Hoje com o dia-a-dia mais consumido pela gestão, a cientista faz questão de reservar tempo da sua agenda, todas as semanas, para estar no laboratório. É fascinada pela biologia desde que viu uma película de cebola no microscópio da escola, e acredita numa sociedade baseada no conhecimento. Desistir não faz parte do seu dicionário, até porque, até agora, é a fazer ciência que se sente mais feliz.

 

Lidera a recém-criada Fundação GIMM, que resulta da fusão entre dois institutos. O que motivou esta aposta?
A fusão entre o IGC [Instituto Gulbenkian de Ciência] e o iMM [Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes] pretende explorar a complementaridade destas duas instituições de excelência. O IGC apresenta uma longa trajectória, com mais de 60 anos em ciência, particularmente nas ciências da vida, enquanto o iMM se especializou ao longo dos últimos 20 anos em investigação biomédica. A fusão e combinação dos diferentes elementos criará uma simbiose entre as descobertas mais fundamentais sobre como a biologia e o nosso corpo funcionam e a sua aplicação prática na saúde humana.

A diversidade é uma enorme mais-valia em qualquer área, mas na ciência é particularmente relevante. A colaboração entre diferentes disciplinas é chave para acelerar os resultados e responder aos desafios globais de saúde, como o envelhecimento, o cancro e as doenças neurodegenerativas.

Na prática, esta fusão traduz-se numa maior capacidade de atrair talento global, numa maior capacidade de investir em infra-estruturas científicas de ponta, numa gestão mais eficiente dos custos administrativos e no aprofundamento de parcerias estratégicas, tanto a nível nacional como internacional, algo que era difícil de alcançar isoladamente.

 

O que faz a Fundação GIMM e quais os objectivos que pretendem alcançar?
O GIMM é uma fundação de investigação científica que se dedica a explorar os mistérios da vida. Este é o nosso principal foco e a base do programa GIMM Discovery, onde os nossos cientistas seguem as suas linhas de investigação nas mais variadas áreas com toda a liberdade e paixão. Queremos perceber como o mundo funciona e responder às perguntas mais desafiantes que a nossa curiosidade desperta.

Por outro lado, no programa GIMM Care, complementar, trabalhamos por missões e estamos dedicados a enfrentar os maiores desafios globais de saúde, como, por exemplo, o cancro metastático da mama, o cancro colorrectal ou tumores cerebrais pediátricos, entre outras áreas ainda a definir. Trabalhamos com uma abordagem transdisciplinar, que cruza várias áreas da ciência, para fornecer soluções inovadoras com um impacto directo na sociedade.

No imediato, o nosso foco está em reforçar a integração das equipas e atrair talento, nacional e internacional, para continuar a desenvolver projectos inovadores. A longo prazo, ambicionamos consolidar o GIMM como um líder global em ciência transdisciplinar, gerando conhecimento transformador e produzindo descobertas científicas verdadeiramente impactantes.

 

O que é fundamental para que esses objectivos consigam ser atingidos?
Para atingirmos esses objectivos, é essencial investir continuamente em formar e atrair talento de excelência. As nossas pessoas e a comunidade com quem estabelecemos ligações e parcerias estratégicas noutras instituições e organizações de referência, nacionais e internacionais, vão ser a chave do nosso sucesso. O seu entusiasmo, a sua criatividade e a sua paixão vão ser factores determinantes para cumprirmos os nossos objectivos.

Outra vertente fundamental para atingirmos os nossos objectivos é a criação de infra-estruturas científicas avançadas. Com uma aposta forte em novas áreas como a geómica, a proteómica e a metabolómica; estamos a investir em equipamento e recursos técnicos que nos permitirão grandes avanços científicos.

 

As vantagens são evidentes, mas uma fusão traz sempre desafios, nomeadamente ao nível das pessoas. Quais os principais?
A maior dificuldade em qualquer fusão é a integração de culturas organizacionais distintas. O nosso objectivo é criar uma visão comum que seja capaz de inspirar todos os nossos colaboradores: uma missão com que se identifiquem e que seja, simultaneamente, um factor agregador e uma fonte de motivação.

É natural que haja resistência à mudança, e é de facto um grande desafio honrar os legados de duas grandes instituições, sem que isso comprometa o caminho que agora queremos percorrer.

Queremos ser mais do que a soma de ambas as partes, e isso implica deixar para trás algumas tradições para dar a oportunidade a que novas cresçam. A nível técnico, claro, tivemos também o desafio de alinhar sistemas, processos e infra-estruturas, definir lideranças e de integrar diferentes formas de trabalho, mas estamos focados na transparência, no diálogo e no envolvimento activo de todas as equipas. A chave para superar as resistências está na comunicação aberta e no compromisso de todos com um objectivo comum.

 

O que querem que distinga a cultura GIMM?
Vamos herdar legados culturais muito valiosos de cada uma das instituições que agora se fundem. A cultura do GIMM será marcada pela particularidade daquilo que trazemos de trás, mas pela absoluta convicção de que vamos criar algo novo, fantástico e transformador.

 

Um tema que destacam na vossa missão, e do qual falou logo no início, é o da diversidade, associada à equidade e inclusão. É outra condição fundamental ao sucesso?
A diversidade é essencial para promover a inovação e enriquecer a nossa investigação. No GIMM, garantimos políticas de recrutamento inclusivas, com base em mérito e em igualdade de oportunidades para todos, independentemente de género, etnia ou qualquer outro factor de discriminação que não a competência.

A diversidade não é apenas uma questão ética, é também uma estratégia científica, pois promove diferentes abordagens e soluções criativas para os problemas complexos que enfrentamos na investigação. Não podemos pensar todos da mesma forma, precisamos de ângulos diferentes e contribuições originais para conseguirmos atingir resultados extraordinários. Cada ponto de vista traz consigo mais uma peça do puzzle.

 

Com quantas pessoas contam actualmente? E quantos desses são cientistas?
Actualmente, o GIMM conta com cerca de 700 colaboradores, dos quais mais de 500 são cientistas. Estes colaboradores estão distribuídos por grupos de investigação, abrangendo diversas áreas da biologia, biomedicina, neurociências e outras, e serviços operacionais e estratégicos de apoio à investigação.

 

Leia o artigo na íntegra na edição de Dezembro (nº. 168) da Human Resources.

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