Está na hora de requalificar

Ninguém sabe como será o nosso futuro tecnológico. Nos últimos meses, soube-se que a Amazon Go irá abrir mais lojas com menos empregados de caixa e sem assistentes e que uma cadeia de hambúrgueres “empregou” um robô para virar hambúrgueres. Ao mesmo tempo, a Uber suspendeu o uso de veículos autónomos após um acidente fatal no Arizona. Os tempos estão a mudar e os robôs chegaram.

 

Por R. Edward Freeman e James R. Freeland, na MIT Sloan Management Review

 

À medida que desenvolvemos abordagens de resolução de problemas mais sofisticados recorrendo à inteligência artificial (IA), sabemos que o panorama do emprego está a mudar rapidamente.

Não sabemos se os profetas da desgraça têm razão ou não. A Bain revelou num estudo de Fevereiro de 2018 que a automatização poderá eliminar 20 a 25% dos empregos nos EUA até 2030. Um estudo do Reino Unido coloca essa estimativa muito mais alta – prevê-se que até 47% dos empregos actuais nos EUA se tornem redundantes ou irrelevantes a curto prazo.

E um relatório do McKinsey Global Institute de Novembro de 2017 sugere que, em 2030, até 375 milhões de colaboradores em todo o mundo poderão ter de mudar de categoria profissional – o equivalente a 14% da força de trabalho global.

Outros dizem-nos que a situação não é tão sombria. As novas tecnologias, indicam, sempre acabaram por criar mais emprego ao longo do tempo, apesar das previsões de eliminação de empregos.

Mas mesmo que as previsões mais optimistas sejam verdadeiras, será que a prosperidade criada por estes novos empregos irá ser partilhada de forma geral? E o que precisamos de fazer para estarmos preparados?

Precisamos de nos preparar para conjuntos de competências diferentes

Quer os empregos diminuam ou aumentem, o que não está em causa é que serão empregos diferentes, exigindo conjuntos de competências diferentes.

Em vez de esperarmos para ver se haverá mais empregos criados ou perdidos, precisamos de agir já para que empregadores e colaboradores obtenham as competências de que vão precisar no admirável mundo novo da tecnologia da IA. Vejamos alguns exemplos do que está actualmente a ser feito.

Formar jovens.

A IBM criou escolas Pathways in Technology (P-TECH), fazendo parceria com quase 100 secundárias públicas e faculdades comunitárias para criar um programa de seis anos que serve um grande número de alunos com rendimentos baixos. As competências adquiridas são reforçadas através de estágios e programas de mentoring na IBM e em muitas outras empresas. A taxa de alunos formados está quatro vezes acima da média, e os que encontram salário recebem o dobro da média salarial.

Requalificar os colaboradores existentes

A Bit Source LLC, uma empresa de desenvolvimento de software com sede em Pikeville, Kentucky, está a formar mineiros das minas de carvão para se tornarem programadores de software. O objectivo da empresa é fazer com que os colaboradores passem de “exportar carvão para exportar código”. A empresa de tecnologia eólica Goldwing Americas, subsidiária da Xinjiang Goldwing Science & Technology Co. Ltd., de Pequim, na China, lançou o Goldwing Works para requalificar colaboradores do sector do carvão, petróleo e gás natural no Wyoming e transformá-los em técnicos de turbinas eólicas, uma categoria que deve crescer mais de 100% nos próximos anos. E a Flexport Inc., uma empresa de transportes de São Francisco, desenvolveu uma iniciativa para formar colaboradores novos para que possam trabalhar na era digital da logística do transporte marítimo, onde conseguiu competir com empresas muito maiores. Actualmente estes programas são pequenos, mas indicam o que pode ser feito.

Proporcionar instrução digital nova e mais abrangente aos seus próprios colaboradores

A Cognizant Technology Solutions Corp., uma empresa de TI com sede em Teaneck, Nova Jérsia, e mais de 250 colaboradores, requalificou recentemente mais de 100 mil em novas competências digitais. Tendo em conta a variedade de conjuntos de competências digitais, a formação contínua é vista como pré-requisito para o sucesso da empresa, e esta mostra que vê a requalificação como uma questão de gerir atritos e automatizar processos fundamentais. Similarmente, quando a gigante de comunicações AT&T descobriu que mais de 100 mil dos seus colaboradores tinham cargos que desaparecerão nos próximos 10 anos ou menos, comprometeu-se a levar a cabo um enorme esforço de requalificação. O Worforce 2020 da AT&T usa parcerias com universidades tradicionais como a Georgia Tech e conjuntos de vários cursos online abertos para oferecer “Nanodiplomas” a cursos, maioritariamente online, que podem ser individualizados com competências certificáveis. Segundo um executivo, «a AT&T está a trabalhar para incutir uma mentalidade na qual todos os indivíduos se tornam CEO da sua própria carreira, responsáveis por procurarem novas competências, cargos e experiências».

Os governos estão também a começar a agir. O estado do Tennessee tornou as faculdades comunitárias gratuitas para os adultos que não têm diploma, a começar no Outono de 2018. O Oregon tem faculdades comunitárias gratuitas para todos os que saem do secundário. São Francisco tornou as suas faculdades comunitárias gratuitas para todos os seus residentes. O estado de Nova Iorque tornou as suas faculdades públicas de dois e quatro anos gratuitas para alunos com famílias que ganham menos de 107 mil euros por ano. Outros países estão a seguir a mesma direcção. Um relatório do Fórum Económico Mundial apresenta exemplos de Singapura, Dinamarca, Reino Unido e Brasil para mostrar como os governos de outros países se estão a envolver na oferta de recursos para requalificação e aprendizagem contínua. Quatro sugestões para a instrução num futuro estimulado pela IA Existem muitos mais exemplos de como empresas e governos estão a lidar com este problema. Mas precisamos de mais. Queremos fazer quatro sugestões para a requalificação e aprendizagem contínua à medida que nos movemos para uma nova era digital e estimulada pela Inteligência Artificial.

Temos de ver o papel do estado, pelo menos parcialmente, como facilitador da criação de valor

Normalmente, o estado é visto como árbitro, regulador e redistribuidor. São papéis importantes. Contudo, ajudar os negócios, quer lucrativos quer não lucrativos, a facilitarem a criação de valor é um papel legítimo. Os exemplos que demos em cima envolvendo o governo exemplificam bem este ponto. Facilitar uma aprendizagem contínua ajuda as empresas a encontrarem colaboradores que podem criar valor para os seus stakeholders e melhorar a economia e a sociedade.

Precisamos de nos tornar uma nação, e um mundo, de empreendedores

A tendência de termos menos startups e menos colaboradores nas startups deve ser invertida. Precisamos de um empreendedorismo que crie mais oportunidades para novos negócios. Precisamos de perguntar o que pode o estado fazer para facilitar o espírito empresarial. Precisamos de um enorme esforço para ajudar as pessoas que ficaram fora do sistema de criação de valor a obterem as competências e o capital de que precisam para criarem e desenvolverem negócios. Acreditamos que este esforço deve ser concentrado localmente e iniciado nas escolas primárias onde podemos ensinar às crianças que criar valor para os outros é a base dos negócios. E precisamos de encorajar as suas ideias sobre a melhor forma de o fazer, mesmo em tão tenra idade.

Precisamos de nos tornar uma nação de experimentadores

Os programas generalizados não funcionam para muitas pessoas. Precisamos primeiro de tentar muitas coisas que oferecerão novas competências com lugar no mercado e a mentalidade de aprender, descobrir como manter o que funciona, espalhar a boa nova e parar de fazer o que não funciona. Precisamos de experiências que utilizam resultados baseados em provas para compreender onde podemos aumentar a escala. O Equality of Opportunity Project de académicos da Universidade de Stanford, Universidade Brown e Universidade de Harvard é um excelente exemplo do tipo de pesquisa que pode fazer a diferença. A abordagem da AT&T não irá funcionar em todos os negócios, e o sistema da Dinamarca não irá funcionar em todos os países. A acção deve ser local, embora precisemos de organizações com um enfoque mais nacional e global para propagar as boas ideias.

Precisamos de encorajar a aprendizagem contínua, principalmente para os que estão nos últimos degraus da cadeia económica

Muitas pessoas estão longe de usar os recursos dos cursos online, da web e de outras tecnologias disponíveis. Porque não abrir as escolas públicas a uma aprendizagem contínua, onde os cursos podem ser ensinados ao final do dia e todos podem obter competências certificáveis? As empresas locais podem contribuir como parte da sua missão de serem amigos das comunidades. Os governos e empresas locais podem ajudar com fundos necessários. Muitos cidadãos tornar-se-iam professores e mentores.

Falámos apenas por alto do que precisa de ser feito. Devemos começar já e desenvolver o conjunto de experiências que estão neste momento a ocorrer. Precisamos de nos envolver neste esforço.

Queremos ser nós os responsáveis pelo nosso próprio futuro – é melhor não o deixarmos para os robôs e a IA.

 

Este artigo foi publicado na edição 95 da Human Resources. 

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