Formação ao longo da vida exigirá mudanças no ensino e nas empresas

Mudar o paradigma é urgente. Tanto por parte das competências ensinadas nas escolas e universidades, como do investimento das empresas na capacitação das suas pessoas. Só assim teremos organizações mais produtivas e colaboradores mais motivados. Foi o que defenderam diferentes especialistas, no painel “O impacto transformador: Educação, Capacitação, Talento e Diversidade na competitividade global”, da Transatlantic Business Summit.

Por Tânia Reis

 

A Câmara do Comércio Americana – AmCham Portugal promoveu o terceiro Transatlantic Business Summit, que teve lugar na Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, no passado mês de Outubro, e contou com a Human Resources Portugal como media partner. A edição deste ano focou a competitividade, numa abordagem macro e micro, da economia, do País e das empresas, com debates sobre temas como talento, inovação, tecnologia e sustentabilidade.

Ana Leonor Martins, directora de redacção da Human Resources Portugal, moderou o painel “O impacto transformador: Educação, Capacitação, Talento e Diversidade na competitividade global”, que contou com a participação de Carlos Oliveira, co-fundador e presidente executivo da Fundação José Neves (FJN); Inês Lima, directora-geral da McDondald’s Portugal; e Pedro Amorim, managing director da Experis Portugal e Sales & Corporate Clients director do Manpower- Group Portugal.

A Fundação José Neves Fundação publica anualmente um relatório sobre o “Estado da Nação”, analisando números de Educação, Emprego e Competências em Portugal, e a sua relação com salários, produtividade e competitividade, e Carlos Oliveira começou por salientar que «o País fez um caminho extraordinário na preparação do talento, sobretudo desde a entrada na democracia, após o 25 de Abril, em que tivemos um nível de alfabetização e um crescimento muito relevante a diversos níveis».

Aliás, foi esse trajecto que originou, especialmente nas duas últimas décadas, «um investimento estrangeiro muito significativo, que essencialmente procurava talento qualificado, com competências em áreas tecnológicas e industriais». O facto de Portugal ser «um dos últimos redutos de talento qualificado ainda sem capacidade de uma empregabilidade compatível com um nível de educação que já existia na altura», permitiu essa atracção de investimento relevante e que o País chegasse a cerca de 44% dos jovens com o ensino superior, em 2022. Contudo, o responsável faz notar a dualidade de ainda termos «40% dos portugueses adultos que não têm o ensino secundário no mercado de trabalho», valor que diminuiu de 47,5% no ano anterior. E esta diminuição aconteceu «não porque haja política pública ou uma aposta das empresas no aumento de competências», mas sim porque «estas pessoas, infelizmente, estão a sair pela idade».

Para Carlos Oliveira, existem duas necessidades prioritárias: «qualificar os jovens para o que o mercado de trabalho procura no presente e no futuro, e, com o advento da inteligência artificial (IA), perceber que aquilo que as universidades e sistemas de ensino estão a oferecer aos nossos jovens já não está actualizado ao que vai acontecer nos próximos anos». No fundo, «temos um sistema de ensino baseado em modelos do séc. XVIII, com professores do séc. XX, para pessoas do séc. XXI», salienta, referindo que também os adultos precisam de upskilling, reskilling e de formação mais orientada às competências para a vida laboral.

Considerando um estudo da OCDE, no qual «Portugal é o que está mais mal posicionado do ponto de vista das qualificações de adultos», o presidente executivo da Fundação José Neves defende «uma mudança mais substancial na educação, que não se fique no curto prazo, mas que traga novas metodologias», que deixe de se basear num «modelo em que os alunos estão numa sala a aprender todos ao mesmo ritmo, e que já se provou que não funciona».

Ao reflectir sobre a «correlação entre o aumento do grau de escolaridade e competências dos portugueses e a produtividade do País», Carlos Oliveira partilha que «as empresas em Portugal mais competitivas são as que têm pelo menos 40% de jovens na sua força de trabalho», onde é possível concluir que «as empresas onde há mais jovens são mais competitivas».

 

A capacitação como peça-chave na competitividade
Tendo-se focado na questão do talento nos últimos 15 anos e no que designam por Era Humana, a “human age”, a Experis Portugal conduziu este ano um estudo de projecção das macrotendências, nomeadamente escassez e aceleradores de competências, competitividade e alterações demográficas. Pedro Amorim realça que, actualmente, dois grandes factores têm «trazido enormes dificuldades e limitações; por um lado, a questão do ensino, da não adequação do ensino que temos hoje às necessidades das empresas», e, por outro lado, as alterações demográficas e a necessidade de «repensar o tema das reformas e do envelhecimento». Considera que, «muitas vezes, dizer que há escassez de talento parte de uma análise redutora, que não inclui todas as pessoas», e garante que, hoje, «o talento é o mais importante de uma organização e de um país para se tornar competitivo».

E é precisamente a formação que permite à McDonald’s servir milhões de portugueses há 32 anos, realça Inês Lima, CEO da cadeia de fast food, «um negócio de pessoas para pessoas». Com 46 franquiados no País, em que cada restaurante é uma estrutura independente, a formação desempenha um papel crítico. «No total, temos 10 mil pessoas a trabalhar connosco, mais de metade com menos de 25 anos. A formação é o alicerce de tudo o que fazemos diariamente», partilha.

Conscientes de que a McDonald’s é o primeiro emprego para a maioria dos jovens que os procura, seja pela flexibilidade horária, pela conciliação com os estudos, ou por necessidade, trata-se de «começar do zero. Temos de fazer toda a formação técnica, em hard skills, mas também soft skills, porque estar num restaurante é trabalhar em equipa, é importante a pontualidade, rigor e exigência.»

Por isso, formam os jovens «para o brio e as exigências profissionais, temas importantes para as suas carreiras futuras », defende Inês Lima. Na McDonald’s, «ninguém começa a trabalhar sem ter formação específica», que nos primeiros dias conta com «apoio individual de um coach, que acompanha um colaborador e está com ele em cada um dos postos até ficar confortável nessa posição». A formação on the job é complementada com «formação de e-learning, com jogos, formação mais teórica em sala no centro de formação, onde, por ano, são dadas 200 mil horas certificadas». E se, no passado, a formação era «mais de manipulação de alimentos e sobre a qualidade e forma de servir, hoje é mais no âmbito do trabalho em equipa, capacitação digital, análise de informação e tomada de decisão, muito mais útil para qualquer que seja o emprego pós-McDonald’s», salienta a responsável.

 

Leia o artigo na íntegra na edição de Novembro (nº.155) da Human Resources, nas bancas. 

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