Gravidez e profissão: A arte de equilibrar dois mundos

Por Rita Fraga Mimoso, People Management, CodeWin

 

Esta é uma história baseada em trabalhadoras que não eram mães, mães que voltaram a ser trabalhadoras e tudo o que nos envolve. É uma realidade pessoal e laboral (como tantas outras…).

Chegou o dia, o dia em que descobrimos que estamos grávidas. Felizes ou não, este dia marcar-nos-á para sempre. É neste dia que a nossa cabeça começa a “disparar” para todo o lado com pensamentos dispersos vindos de paraquedas, perguntas às quais nunca nos tínhamos feito, emoções que nos baralham e tomadas de decisão para uma vida.

“E agora?”

Pois bem, o “agora” vem com muitos e infinitos “agoras”. E comecemos pelo mítico “Só podemos contar que estamos grávidas a partir dos três meses”. E até aí o que é suposto acontecer? Fingir que nada se passa? Ao que parece, sim. E tomamos isso como uma verdade absoluta. E se por um lado pode ser reconfortante, por outro parece que estamos em sobressalto a toda a hora. São os enjoos que não conseguimos disfarçar, são as cervejas ao final do dia que deixaram de acontecer e são aqueles ataques súbitos de sono que não conseguimos controlar! “Ah, mas sem problema! Eu estando em teletrabalho consigo disfarçar!”, e logo de seguida a ansiedade fala connosco: “Ok, certo. Mas e o Teams que ficou ausente, aquela bolinha amarela tão linda a denunciar que não estás online, enquanto esse pequenino ser te fez fazer uma sesta à qual te foi humanamente impossível contrariar?”.

O tempo passa e começamos a imaginar 200 formas de melhor comunicar à empresa o veredicto. Os três meses já passaram, a barriga começa a notar-se e começa a ser a altura. “Que alivio que vai ser quando perceberem o porquê de eu ter andado tão estranha!”, e logo de seguida salta mais um pensamento de paraquedas: “Socorro, vão odiar saber (e ainda mais se houver outras grávidas na empresa)”. O nosso corpo acompanha a nossa cabeça, e os batimentos cardíacos tornam-se mais fortes e a ansiedade acelera. Mas conseguimos e ultrapassamos a “dura” tarefa de informar, muitas de nós quase sentindo culpa. E aqui, poderemos afirmar que é o momento-chave, o momento em que vai moldar os meses seguintes da percepção que temos do mundo laboral. Apoiaram-me? Foram genuinamente entusiastas? Se sim, estou no bom caminho. É para aqui que vou querer voltar.

Mas chega o momento de irmos de baixa de gravidez. E os nossos pensamentos que nos adoram tanto, ao ponto de não nos largarem por um segundo, dizem: “Já?! Vais já de baixa?”. Pior, ouvimo-los diversas vezes, mas pela boca de inúmeras pessoas: “A empresa vai deixar? Não vão ficar chateados? Não vão precisar de ti?” E toda a leveza aparente com que estavas volta a esmorecer. E chega o segundo momento chave: o de comunicar à empresa que vais de baixa. De novo, com 300 formas pensadas de comunicar e outras 500 de te “defenderes” caso seja necessário. E mais uma vez, apoiaram? Estavam genuinamente preocupados com o teu bem-estar? Se sim, estás no bom caminho. Quererás voltar.

E começa a baixa, aquelas largas semanas em que imaginas que o tempo é infinito e que tudo será possível de concretizar. Inclusive, pensas que poderás frequentar uns cursos online que já andavas há tanto tempo para fazer para ainda seres melhor a nível profissional: “O tempo é infinito! Vou regressar ainda com mais sabedoria! Vai ser maravilhoso!” dizes para ti mesma com uma sensação de alívio! E o que acontece? O tempo voou. E dás por ti a pensar “parece que foi ontem que entrei de baixa e não fiz nada”. Mas como seria possível fazermos tanto? Não seria. A gravidez nem sempre é um estado de graça. Temos dores, insónias, estamos mais sensíveis, maturamos assuntos difíceis do passado, parecemos uns pinguins a caminhar e precisamos de ajuda para nos calçar! Somos umas guerreiras!

Chega o dia mais aguardado, aquele amor incondicional chegou até nós! Mas será que sim? E se não chegou este sentimento? Ora bolas, mais um assunto para eu lidar, remoer e sentir que ainda agora acabei de ser mãe e já não o sei ser!

Mas agora é tempo para muitas outras coisas, nomeadamente comunicar à empresa e à Segurança Social o nosso tempo de licença de maternidade. “Agora sim, já sou mãe (logo, mais adulta)! Já não há que ter medo ou vergonha de informar que vou estar 1780 meses ausente! Upssss….. “Tantos meses ausente? Ainda te vais lembrar de como se trabalha? Já não te vão querer de volta!” dizes tu para ti mesma e mais umas quantas pessoas que, embora preocupadas, não sabem como empatizar com a tua vontade enquanto mãe, mulher, e pessoa adulta com decisões acertadas para ti e para a tua família.

A empresa como reagiu? Faz toda a diferença, não faz?

E os meses vão passando e dás por ti num cansaço extremo (especialmente, para quem não tem rede de apoio), privação de sono, com a memória mais pequena do que uma ervilha, a aprender a ser mãe, a tentar não perder a identidade de outrora e a mentalizares-te que serás a profissional que sempre foste. Os teus dias de 24h mais parecem que têm 1h, não conseguiste fazer nada a não ser tentar sobreviver para que o teu filhote sobreviva também.

Chega a vir à tua cabeça uma voz “Não gosto de ser mãe!” mas também “Amo tanto o meu filho!”.

E nestes reboliços e contradições como conseguirás regressar?

E chega o dia do regresso ao trabalho, depois dos 1780 meses ausente. O teu coração acelera, parece que é o primeiro dia de trabalho de sempre. Tanta coisa que mudou certamente. Tu própria.

Não consegues gerir o teu dia-a-dia pessoal, não consegues encontrar e reconheceres-te na tua nova identidade, como conseguirás dar conta do recado a nível profissional?

Pois bem, de alguma forma conseguirás. A terapia será uma excelente opção. Sermos flexíveis connosco próprias também. Ajustar as nossas expectativas e acreditarmos que o que estamos a fazer e como nos sentimos é o possível nesse momento. É o melhor que conseguimos e é tanto, mas tanto.

Mas sabes o que poderá também ser uma excelente ajuda? Sermos incrivelmente bem acolhidas no nosso regresso.

Recebermos um abraço, acompanhado de um sorriso, e entusiastas palavras: “Bem-vinda de volta!!!!”.

Falarem-nos e abraçarem-nos com palavras quando nos dizem “Tens o tempo que precisares para te adaptares. Sem pressas, ao teu ritmo. Estamos cá para te ajudar”. Os primeiros dias serem incrivelmente calmos, respeitando as palavras que te foram proferidas. E assim, aquele nervosismo inicial vai sendo direccionado para alegria, leveza, descontração e um eterno agradecimento.

E o primeiro turno (horário laboral) termina e começa o segundo turno, o da parentalidade! Mas aqui já estás mais leve, e no dia a seguir estarás igualmente mais leve e motivada para o teu primeiro turno, o profissional!

E a vida é isto. Os vários aspectos da mesma entrelaçam-se, não dá como separar águas. E saber fazê-lo em harmonia e empaticamente é de mestre.

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