Great Resignation, Great Regret e agora Great Betrayal. Que nova tendência é esta (que se está a fazer notar sobretudo no sector tech) que põe em causa o emprego full time?

No meio de 120 mil despedimentos no sector da tecnologia, 62% dos colaboradores dizem que já não se sentem seguros a comprometerem-se com um empregador, avança a Fast Company.

 

No dia 20 de Janeiro, Justin Moore, engenheiro de software da Google, acordou e descobriu que a sua conta estava desactivada. Depois de mais de 16 anos na empresa, esta foi a única informação que recebeu para dizer que era um dos 12 mil colaboradores demitidos. Tal como os seus ex-colegas, Justin partilhou a notícia no LinkedIn, já que não tinham outra maneira de dizer adeus, e desabafaram sobre a traição e a falta de lealdade.

«Neste momento não consigo sentir gratidão por uma empresa à qual dei tanto de mim, mas que achou apropriado afastar-me, bloqueando o meu acesso (e de 12 mil colegas) à minha conta corporativa às 4 da manhã», escreveu Blair Bolick, um recrutador da Google. «Estou devastado. Estou triste, com raiva.»

«Isso só vem mostrar que a vida não é só o trabalho, e os empregadores – especialmente os grandes e sem rosto, como a Google – nos vêem como 100% descartáveis», escreveu Moore. «Vivam a vida, não o trabalho.»

Depois da Google já se seguiram outras, como a Microsoft que dispensou 10 mil funcionários, de uma série de “Loud Layoffs” – como descreveu a CNBC – que começou em Novembro, quando 60 mil despedimentos atingiram o sector, incluindo a Amazon, Meta e Twitter.

Em Novembro passado, a A.Team, start-up dedicada ao talento tecnológico, fez uma parceria com a consultora Pollfish e levaram a cabo um survey junto de 500 trabalhadores do sector – incluindo 109 que haviam sido despedidos recentemente – nos EUA para entender melhor como a recente onda de demissões afectou o sentimento de segurança e estabilidade no emprego full-time.

E os resultados indicam que 89% gostariam de ter mais controlo e flexibilidade no seu horário de trabalho do que o tradicional emprego full-time pode oferecer. Para 74% a recente onda de demissões tornou o trabalho freelance mais apelativo do que antes, 66% revelaram que os fez perder a confiança na estabilidade e segurança do emprego full-time, e para 62% tornou-os menos seguros para assumirem um compromisso com um empregador.

Estes dados revelam que podemos estar perante uma mudança radical na forma como os colaboradores altamente qualificados se sentem em relação ao emprego full-time. Assistimos à “Great Resignation”, “Great Regret” e “Quiet Quitting”. Agora, estamos a ver sinais de uma “Great Betrayal” que está a fazer os colaboradores porem em causa o emprego a tempo inteiro e a considerarem a liberdade e a flexibilidade do trabalho freelancer.

Por sua vez, o trabalho independente está a surgir como uma alternativa e explica por que mais de um terço do crescimento da força de trabalho nos EUA desde 2020 veio do trabalho independente, e prevê-se que mais de 50% dos trabalhadores seja independente até o final da década.

Os colaboradores despedidos estão particularmente desiludidos com o emprego full-time

Entre os 109 profissionais tech demitidos nos últimos 12 meses, esses sentimentos eram ainda mais claros. 93% revelaram que gostariam de ter mais controlo e flexibilidade sobre o seu horário de trabalho e 88% consideram o trabalho freelancer mais atraente do que antes. 83% manifestaram uma perda de confiança na estabilidade e segurança do emprego full-time e 83% sentem-se menos seguros a assumir um compromisso com um empregador.

Embora estes resultados possam não ser totalmente surpreendentes, não deixam de ser impressionantes. Os colaboradores demitidos estão particularmente desiludidos com o emprego full-time e podem não voltar atrás.

Esta tendência é exclusiva dos gigantes da tecnologia? A pesquisa descobriu que não.  A maioria dos colaboradores no geral está desiludida com o emprego a tempo inteiro – quer trabalhem numa empresa grande, média ou pequena.

 

As gerações estão prontas para avançar

O “Quiet Quitting” foi um fenómeno associado à Geração Z, mas a “Grande Traição” não parece seguir o mesmo caminho, já que 78% da Geração Z dizem sentir-se menos seguros em comprometer-se com um empregador, a maioria dos Millennials e da Geração X também, assim como quase metade dos Baby Boomers. Parece que a noção de que os empregadores não estão a conquistar a “lealdade” dos trabalhadores é transversal: independentemente da geração, a maioria dos profissionais tech diz que perdeu a confiança na estabilidade e na segurança do emprego full-time.

Os Millennials (78%) e a Geração Z (76%) sentem-se mais inclinados para o trabalho freelancer – o que não surpreende, visto que mais de um terço são actualmente freelancers – mas a maioria da Geração X (69%) e Boomers (51% ) também manifestam maior inclinação para o trabalho independente.

Apesar de todos os colaboradores de todas as idades desejarem mais flexibilidade, as gerações mais velhas lideram o movimento, com 92% das pessoas com mais de 45 anos a desejarem ter mais controlo sobre o seu horário de trabalho.

 

O que está a levar os colaboradores a abandonar o full-time? 

As demissões estão a acelerar uma mudança que tem vindo a ocorrer silenciosamente nos últimos anos. A percentagem de profissionais tech altamente qualificados que trabalham como freelancer tem aumentado nos últimos anos, e um terço dos trabalhadores que ganham mais de 150 mil dólares por ano são independentes. E como a Harvard Business Review relatou, 68% dos trabalhadores independentes sentem-se mais seguros a trabalhar de forma independente do que para um empregador.

A A.Team conduziu uma pesquisa interna com os seus colaboradores que haviam tido a experiência de trabalho independente e os principais factores que levam as pessoas ao trabalho independente podem dividir-se em três grupos principais:

Flexibilidade: 78% identificaram o local de trabalho flexível como o principal motivo que os levou a trabalhar de forma independente e 73% identificaram um horário de trabalho flexível.

Trabalho com significado: para 69% o trabalho independente permitiu-lhes ter um trabalho alinhado com os seus interesses pessoais e profissionais.

Ganho financeiro: 59% revelaram que transitaram para o trabalho independente porque conseguiam ganhar mais do que trabalhar full-time.

Adicionalmente, mais de dois terços dos entrevistados disseram que, enquanto trabalhavam como independentes, tinham maior satisfação no trabalho, oportunidades financeiras e equilíbrio entre vida pessoal e profissional – um triunvirato de factores que quase todos os profissionais procuram nas suas carreiras.

 

O futuro é “misto”?

Embora estas descobertas indiquem que os profissionais tech estão prontos para romper com o emprego full-time, há sinais de que o sentimento pode ser mútuo – com os empregadores também à procura de mudar para uma força de trabalho mais diversa e flexível.

Quando a A.Team inquiriu 581 fundadores e executivos de tecnologia no Verão passado, estes revelaram que o talento independente é uma ferramenta fundamental num cenário de incerteza económica e de trabalho remoto. 71% concordaram que contratar freelancers ou trabalhadores independentes dá maior agilidade aos negócios em tempos incertos e para 70% o trabalho remoto tornou-os mais propensos a contratar freelancers.

E não estavam apenas a contratar trabalhadores independentes para lidar com projectos ou tarefas isoladas, 73% dos entrevistados afirmaram que estavam a integrá-los estrategicamente em “equipas mistas” com colaboradores a tempo inteiro.

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