Invocando Sun Tzu – estratégias de atracção e captação

Muitos do mundo da gestão conhecerão Sun Tzu, o general chinês do século V a.c. que nos deixou a imortal obra “A Arte da Guerra”.

Por Isabel Moço, coordenadora e professora da Universidade Europeia

Ainda que seja um tratado militar, os seus 13 capítulos oferecem uma transversalidade de lições sobre estratégia e táctica, que chegam ao século XXI como poderosas lições. Retomamo-lo com uma interpretação sobre algumas aplicações ao campo da Gestão de Pessoas, em particular aqui aplicadas às estratégias de captação de recursos. Desta feita, recuperamos algumas das indicações fundamentais de SunTzu, e interpretamo-las na sua aplicação à estratégia de atracção e captação de colaboradores.

Conhecer-se a si mesmo e ao “inimigo”

Para Sun Tzu, o conhecimento profundo de si próprio e do inimigo é crucial. Em gestão de pessoas, isto implica um conhecimento muito detalhado e aprofundado da própria organização, da sua cultura e orientações. Importará também conhecer muito bem as pessoas que estão “lá dentro” e uma análise abrangente do mercado de trabalho e da “geografia(s)” onde actuamos. De acordo com estas orientações, internamente, o gestor de pessoas que  pense em atracção e captação, deve ter muito presente resultados de avaliações de clima organizacional, de satisfação, de performance, de oportunidades de evolução e desenvolvimento, e de todas as formas de medir como é contribuir e viver na organização – só desta forma conseguirá comunicar efectivamente valores e objectivos, e compreender se os candidatos disponíveis no mercado estão interessados em oportunidades nessa organização. Por outro lado, esta “grande consciência interna” ajudará a melhor captar os recursos de que necessita, entendendo melhor se o fit pode acontecer. Conhecer o que se passa no mercado de trabalho, é também fundamental, nomeadamente o que a concorrência pelos recursos de que necessitamos, faz – o tal do “inimigo”. Deverá então perceber o mercado de trabalho, as tendências no emprego, as expectativas dos candidatos e procurar benchmarking com concorrentes. De igual forma, estar atento a plataformas de recrutamento, relatórios de mercado e estudos de remuneração, mesmo que não se esteja em campanha de captação, pois são dados essenciais e de foco. 

Conhecer e entender pontos fortes e debilidades

Sun Tzu destaca a importância de conhecer os pontos fortes e fracos, tanto próprios quanto do inimigo. De facto, embora já abordado, tudo assenta no conhecimento que temos, de nós mesmos (aqui, da organização e dos nossos perfis profissionais) e dos que competem pelas mesmas competências no mercado de trabalho e de emprego. Tudo se despoleta com um conhecimento muito detalhado das competências nucleares de que necessitamos e que podem diferenciar-nos no mercado – a lógica é que se procurarmos o mesmo que os outros, teremos menos possibilidades do que se procurarmos “exactamente aqueles”. Associado a isso, os recursos que temos, pois se o inimigo “combater com mais e melhores armas”, a luta pode ser bem desigual – flexibilidade nas recompensas, no tempo de trabalho e no local de prestação do trabalho, podem ser algumas das “armas” com que vamos a esta guerra. Mas se não o tivermos, temos de avaliar dois cenários: como muitos o fazem, anunciar que temos e depois isso não existe – garantir fiabilidade, dar o que se promete, é muito importante, quer no presente, quer no futuro; “baixar os critérios”, o que a prazo também traz desvantagens. Sugere-se então que se construa uma marca de empregador fiável, segura e duradoura, e não apenas se recorra a “técnicas esporádicas de guerrilha” que, a prazo, trarão pouco à organização. Ah, verdade: não esquecer de manter os que já cá estão, por exemplo, com robustos programas de desenvolvimento.

Ter uma estratégia clara

Sun Tzu defende a necessidade de uma estratégia bem definida, clara e partilhada eficazmente. Na gestão de pessoas de muitas organizações, a atracção e captação de recursos acontece “on demand” – não é errado, mas a forma como acontece pode ser enganosa – significa, por exemplo, que as áreas de negócio “pedem” recursos a RH, que depois (ou em contínuo) desencadeiam e gerem os processos de recrutamento e selecção. Será crucial e bastante mais focado se conhecerem, se souberem, porque é que aquele(s) recurso(s) faz(em) falta à organização e quando – ou seja, que entenda, do ponto de vista estratégico, a necessidade do recurso. Neste campo, planeamento e análise provisional serão importantes, e o acompanhamento dos dados (analytics) fundamental, bem como procurar os melhores “terrenos” para encontrar os recursos, seleccionar os canais de recrutamento mais eficazes, como plataformas online, redes sociais profissionais e parcerias com universidades – inovação e criatividade nos processos é a diferença. Voltando ao Analytics, a análise dos resultados de cada canal, campanha, processo,… pode ajudar.

Adaptar-se às circunstâncias

A adaptabilidade é um princípio fundamental de Sun Tzu. As organizações devem ter flexibilidade nas suas abordagens de atracção e captação. Segundo o general, e ajustando a RH e às estratégias de atracção e captação, devemos equacionar algumas possibilidades:

– “ajustes táticos”, ou seja modificar as estratégias de recrutamento conforme necessário, conforme os perfis, os recursos disponíveis, a criticidade da posição,… tendo sempre em conta as mudanças no mercado e o feedback dos candidatos. Metodologias ágeis podem contribuir para ajustar rapidamente as tácticas de recrutamento;

– tecnologia e Inovação, o que pode passar por adoptar novas tecnologias, como inteligência artificial e big data, para optimizar o processo de selecção e melhorar a experiência do candidato.

Antecipar e preparar-se para o imprevisível

Sun Tzu enfatiza muito a importância de estar preparado para o inesperado, o que nunca como agora tem todo o sentido. Para a gestão de pessoas tal significará, por exemplo, ter planos de contingência para enfrentar obstáculos imprevistos, como mudanças na legislação ou crises económicas, ou mais simples com o surgimento de um novo player que vai concorrer pelos mesmos recursos, e pode fazê-lo com base em cenários (scenario planning). Para isso será fundamental ter e manter uma força de trabalho flexível que possa ser ajustada conforme as necessidades organizacionais – são muitos os casos de indústrias e organizações que numa época do ano estão a contratar desenfreadamente e na seguinte, a dispensar.

Construir alianças e redes de apoio

A construção de alianças é um dos pontos que Sun Tzu destaca, e actualmente é ainda mais vital. Estabelecer parcerias com a academia, as escolas profissionais, associações profissionais e outras organizações que ampliem a rede e as possibilidades de encontrar os recursos de que necessitamos. Programas de estágios são excelentes oportunidades para criar estas conexões, a academia deseja-as e os todas as partes podem beneficiar. Não se esqueça também do poder das redes de networking, e, por exemplo, o papel de RH ao incentivar os colaboradores a estar e participar em conferências, workshops e eventos da indústria, sendo embaixadores da marca e tornando-se polo de atracção para apoio à empresa – mas os profissionais de gestão de pessoas que não se esqueçam que eles próprios devem ser o exemplo.

Destacámos aqui alguns dos princípios da “Arte da Guerra”, procurando a sua aplicação à captação de talentos, num enquadramento mais estratégico e menos operacional, embora se deixassem alguns tópicos para a acção. Conhecer a organização e o mercado, identificar pontos fortes e fracos, definir estratégias claras, adaptar-se às mudanças, estar preparado para o imprevisível e construir alianças são passos essenciais para vencer na “guerra da captação e atracção”, e os que mais estrategicamente se orientem, serão aqueles que melhor conseguirão os resultados desejados.

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