Liderança: Heurísticas que devemos evitar
As heurísticas são falhas no raciocínio lógico humano. Há imensas e são aplicáveis à liderança. Identificamos aqui algumas.
Por Ricardo Caldeira, autor dos livros “Liderança Emocional” e “Cisnes Negros da Liderança
Vivemos num mundo cada vez mais globalizado e vertiginoso, numa época de constante mutação e evolução, em que quase não há tempo para pensar, quanto mais para ponderar ou para reflectir.
Para além disso, dizem-nos os ensinamentos com que as neurociências nos têm brindado nos últimos anos, as emoções dominam o processo de tomada de decisão, que na grande maioria das vezes é inconsciente e irracional – são as emoções que determinam grande parte dos nossos pensamentos e, por consequência, das nossas decisões. As emoções têm um papel muito importante e decisivo, mas nem sempre perceptível.
A este propósito, creio ser oportuno falarmos sobre as heurísticas, um grupo de falhas no raciocínio lógico humano, que se manifestam quando utilizamos aquilo a que se convencionou chamar “atalhos mentais” com o intuito de facilitar a tomada de decisões, ou seja, dito de outra forma, são procedimentos simplificados que utilizamos, muitas vezes inconsciente e irracionalmente, para nos ajudar a encontrar respostas fáceis, rápidas e sem esforço, para problemas difíceis, que envolvam incerteza ou risco – mesmo que essas respostas se revelem manifestamente imperfeitas.
As suas origens remontarão aos tempos primitivos e estarão ligadas a questões/instintos de sobrevivência e segurança – o sistema um do cérebro, o instintivo, “prevalecia” sobre o sistema dois, o racional. Não é por acaso, igualmente à luz dos contributos das neurociências, que se diz que o ser humano é, acima de tudo, uma criatura emocional que, algures no tempo, começou a aprender a pensar.
E fala-se em grupo porque a lista é realmente grande e diversa: da heurística da disponibilidade à do afecto, passando pela da representatividade, ou pela da ancoragem, há de facto imensas.
Socorro-me de quatro das principais, que elejo como das mais pertinentes pela ligação que farei de seguida, para suportar o que me traz a este tema:
Heurística da Representatividade.
Envolve tomar uma decisão comparando a situação presente com o padrão mental mais representativo. Quando temos informações limitadas sobre alguma questão, sobretudo aquelas que envolvem maior incerteza ou complexidade, tendemos a basear o nosso julgamento e decisão presente em situações e experiências passadas.
Desta forma, e em simultâneo, como alguém já definiu, “evitamos quer o cansaço da reflexão, quer a angústia da ignorância”. O grande problema é que este é um processo com tendência para uma certa automatização, levando-nos a construir a convicção de que certas situações podem ter maiores probabilidades de ocorrer pelas suas semelhanças com os tais momentos passados (por exemplo, pensar “sempre circulámos a mais de 120 km/hora na auto-estrada e nunca fomos multados nem tivemos acidentes, por isso podemos continuar a exceder esse limite…”).
Heurística da Disponibilidade. Tendência para utilizar e valorizar informações que nos vêm à mente de forma imediata, que são mais recentes, ou ainda que apresentam maior probabilidade, facilitando dessa forma a tomada de decisão. O meu exemplo preferido desta heurística é o da decisão entre uma viagem de avião ou uma viagem de automóvel. À boleia dos ensinamentos do professor António Damásio: «A maior parte das pessoas receia muito mais andar de avião do que de automóvel, não obstante o facto de um cálculo racional de risco demonstrar de forma inequívoca que somos muito mais capazes de sobreviver a um voo entre duas cidades do que a uma viagem de automóvel entre essas mesmas duas cidades. A diferença é de diversas ordens de grandeza a favor de se apanhar o avião em vez de se ir de carro.»
A questão é que, tal como o professor concluiu, a imagem de um acidente de avião, com todo o drama emocional que desencadeia, domina o panorama do nosso raciocínio e cria uma influência negativa em relação à escolha correcta. Acrescenta que «conhecer a relevância dos sentimentos nos processos da razão não quer dizer que a razão é menos importante do que os sentimentos, pelo contrário, ter em conta o papel impregnador dos sentimentos poderá dar-nos a oportunidade de realçarmos os seus efeitos positivos e reduzirmos os seus potenciais efeitos prejudiciais».
Heurística do Afecto. Grande parte das decisões que tomamos são norteadas pelo nosso estado de espírito. A base desta heurística é um sentimento (consciente ou inconsciente) que resulta da classificação de um estímulo (positiva ou negativa) consoante a apreciação que façamos desse estímulo (bom ou mau). As pessoas deixam que as suas simpatias, antipatias e afinidades pessoais determinem as suas crenças e acções. Conforme escrevi no início, e não esqueçamos, a maioria dos nossos pensamentos e decisões têm a sua origem e raiz nas emoções.
Os catálogos de moda, por exemplo, para melhor “entrarem” no público-alvo são construídos com modelos que estão sempre a sorrir, uma vez que os sorrisos estão associados a afectos positivos – associação que é “transferida” para as roupas.
Ainda neste domínio, quando acreditamos que ficamos mais bonitos ao vestir uma determinada cor, ou com um determinado estilo, essa crença “convence-nos” a comprar apenas, ou maioritariamente, essa cor ou esse estilo. Outro exemplo: se estivermos empenhados em seguir uma alimentação saudável, provavelmente os produtos que apresentem na sua embalagem palavras como “natural” ou “biológico” são mais facilmente escolhidos do que os restantes.
Leia o artigo na íntegra na edição de Maio (nº. 149) da Human Resources, nas bancas.
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