Melhorar a empregabilidade de pessoas com deficiência, com foco nas capacidades e não na incapacidade

Apoiar as pessoas com deficiência na procura e concretização do seu potencial profissional, tornando o mercado de trabalho mais inclusivo e equitativo. É este o objectivo da Valor T. Em dois anos de existência, os candidatos são mais de 1500, e as entidades empregadoras registadas superam as 150. O balanço é positivo, mas ainda há muito a fazer, em várias vertentes.

 

Por Tânia Reis

 

Em 2021, pela mão da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML), em colaboração com o Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) e com o Alto Patrocínio da Presidência da República, nascia a Valor T, uma agência de empregabilidade com um objectivo claro: tornar o mercado de trabalho mais inclusivo e equitativo.

Numa «resposta integrada e eficaz de proximidade junto das pessoas e das entidades empregadoras, em todo o território nacional, a Valor T apoia as pessoas com deficiência na procura e concretização das suas competências, do seu potencial profissional, através de um processo de promoção de empregabilidade centrado na valorização do talento e mérito dos candidatos e no acompanhamento e partilha de oportunidades pelas entidades empregadoras», explica Vanda Nunes, directora da organização. «A nossa missão faz-se num caminho de valorização das capacidades e não na incapacidade», um compromisso assumido institucionalmente, enquanto membro da European Lotteries e no âmbito do acordo estabelecido com o European Disability Forum, com o apoio da tutela, num protocolo assinado com o IEFP e o Instituto Nacional para a Reabilitação (INR).

Aquando da apresentação pública da Valor T, a campanha de divulgação foi «dimensionada a todo o País para gerar impacto junto das entidades empregadoras, com uma mensagem muito clara, transmitida pelas próprias pessoas com deficiência: “Queremos ter a oportunidade de vos apresentar quem somos, o nosso currículo, as nossas competências, como propomos contribuir para valorizar os recursos da vossa empresa!”». A meta inicial era «quebrar medos e paradigmas», gerar pensamento e acção individual em cada empregador, preparando o que se propunham fazer a seguir: contactar as empresas, motivar, e disponibilizar apoio e acompanhamento em todo o processo de recrutamento.

 

Acompanhamento desde o primeiro momento
Proximidade é o pilar no qual assenta toda a actuação da Valor T, quer com os candidatos, quer com as empresas. A metodologia criada, «num processo partilhado e muito participado, envolveu vários contributos especializados na área da deficiência da Santa Casa, destacando o Centro de Reabilitação de Alcoitão, bem como contributos de parceiros do Terceiro Sector, universidades e empresas com boas práticas e resultados de sucesso», esclarece a responsável.

O processo é simples. Num primeiro passo, o candidato regista-se na plataforma digital – https://valort.pt/ –, seguindo-se uma avaliação através de entrevistas com psicólogos, para que haja um match, ou seja, «identificar os candidatos mais adequados aos perfis pretendidos pelas entidades empregadoras ». O acompanhamento dos candidatos acontece em toda a fase de selecção, bem como na preparação pós-colocação, em conjunto com as entidades empregadoras. Na fase final, durante 18 meses, é disponibilizado «um plano de acompanhamento com os candidatos colocados e as empresas, contribuindo para uma efectiva integração no mercado de trabalho».

Em dois anos, o balanço é positivo – garante Vanda Nunes –, com mais de 1500 candidatos, para os quais procuram encontrar oportunidades de emprego nas ofertas das entidades empregadoras. «A interacção com os candidatos foi o primeiro desafio», recorda. «Conhecer todos os que se registaram e avançar em cada etapa da nossa metodologia de trabalho, desde logo entrevistar e concluir a fase da avaliação para poder transitar os que mais competências reúnem para a fase de match.»

Paralelamente a esse trabalho «exigente e muito gratificante» com os candidatos, desenvolvem contactos com as entidades empregadoras, apresentando a Valor T como parceira, «com apoio gratuito às empresas que se pretendam valorizar com talento que as transforme. E é o que estamos, juntos, a conseguir, com muito trabalho, tempo e tenacidade», afirma.

Actualmente, são mais de 150 as entidades empregadoras registadas, com cerca de 60 já em processo de recrutamento. «Cada candidato que a entidade empregadora selecciona é acompanhado por nós nas fases de pré e pós contratação, e, presentemente, acompanhamos mais de 200 candidatos nossos já integrados no mercado de trabalho.»

Vanda Nunes realça que sentir a confiança por parte das empresas tem sido gratificante, até porque, tal como com os candidatos, na Valor T «cada empregador é acompanhado da forma mais próxima possível. Se sentimos, juntos, que há um caminho de capacitação de equipas a fazer antes de avançar para a contratação, é esse trabalho de preparação que começamos por desenvolver», garante. «Da nossa experiência, posso afirmar que tem havido uma evolução muito positiva, com envolvimento crescente das entidades empregadoras na concretização do objectivo de recrutar e integrar pessoas com deficiência, procurando- nos para o fazerem com mais informação e apoio em todo o processo de contratação.»

 

As barreiras do estigma e desconhecimento
Para a directora da Valor T, o estigma associado à pessoa com deficiência continua a ser o principal desafio na integração destes profissionais no mercado de trabalho, sendo por isso «necessário conhecer os diversos receios e “rampas”», para melhor poderem «ajudar a desmistificar ». Assim, considera fundamental que «as equipas de Recursos Humanos das empresas possam fortalecer-se com momentos de partilha em que possam, abertamente, oferecer opiniões e colocar as suas dúvidas, previamente à integração profissional de um novo colega com deficiência, desde logo porque as pessoas com deficiência querem ser avaliadas pelo mérito e capacidade, como qualquer outro profissional».

Do lado das empresas, destaca-se «o receio face ao desconhecido, algo tão natural à condição humana», ressalva Vanda Nunes. E aí, o papel da Valor T é fulcral. «Caminhar para que a deficiência seja vista como uma característica e não como uma condição, no que diz respeito ao mercado de trabalho, é um desafio que temos testemunhado nos contactos que fazemos com as empresas.»

As medidas de «apoio à contratação de pessoas com deficiência existem, têm sido melhoradas e alargadas», defende. «A evolução é notória, mas haverá sempre a fazer e melhorar. As políticas públicas devem ser concebidas com foco nas respostas às necessidades existentes, trata-se assim de um processo evolutivo que deve ser desenvolvido, com proximidade, para melhor conhecer os problemas e a forma integrada e eficiente de construir e implementar as soluções.»

A verdade é que a integração de pessoas com deficiência representa para as empresas «a mesma vantagem que a contratação de um bom profissional que acrescenta valor». Integrar pessoas com deficiência é «respeitar e valorizar a diversidade, considerar a pessoa pelo que é capaz na dimensão global que traz como colaborador da empresa», e é «assim que todas as pessoas devem ser considerados, numa gestão atenta e próxima».

«Cada um de nós é diverso no seu funcionamento », por isso «quanto mais uma empresa aceitar o desafio e conseguir incluir e abraçar a diversidade humana, mais potencial diferenciado terá, tornando- se mais bem preparada, mais inovadora e mais competitiva», acredita a responsável. Atrair e motivar talento – já que «fidelizar é consequência» –, com ou sem deficiência, «é investir nos melhores recursos, é gerar motivação e promover o engagement dos colaboradores, é somar produtividade e multiplicar resultados, é criar futuro consolidando a cultura e identidade da própria entidade empregadora».

A directora da Valor T nota um foco cada vez maior nas soft skills, como «a conduta profissional, como capacidades interpessoais, de comunicação, de gestão do stress, de gestão do tempo, de tomada de decisão, de negociação e resolução de conflitos, entre outras». Por outro lado, têm verificado que «competências como domínio de línguas e conhecimentos em TI são sempre bastante requisitados pelas empresas que buscam perfis mais técnicos». Do lado dos candidatos, valorizam uma empresa «que abraça a sua diversidade e os trata como iguais, garantindo direitos e exigindo deveres».

 

Leia o artigo na íntegra na edição de Outubro (nº.154) da Human Resources, nas bancas. 

Caso prefira comprar online, tem disponível a versão em papel e a versão digital.

Ler Mais