MIT: Romper a ligação entre salário e motivação
Os sistemas de remuneração por desempenho surgiram na era industrial e permanecem em muitas empresas, mas há evidências de que, na era do conhecimento, os sistemas de compensação independentes dos objectivos podem ter resultados superiores.
Por Jonas Solbach, Klaus Möller e Franz Wirnsperger, MIT Sloan Management Review
Os sistemas de remuneração por desempenho (PFP) foram inventados na era industrial para impulsionar o desempenho individual e, apesar de a investigação mostrar que esta abordagem não é adequada para grande parte do trabalho de conhecimento que é actualmente realizado nas organizações, a prática persiste como norma.
Estes sistemas permanecem presos no passado por várias razões. A primeira é, essencialmente, inércia: as empresas utilizam o PFP há décadas, e as melhores práticas divulgadas pelos consultores de compensação derivam geralmente dela. Além disso, a maioria dos líderes não conhece as pesquisas sobre PFP ou rejeita-as como pouco fiáveis. Por fim, deixar o PFP para trás e dar o salto necessário para conceber e implementar um novo sistema de compensação pode parecer assustador, dado o potencial impacto no desempenho e nos resultados como consequência de o fazer erradamente.
No entanto, as organizações podem ter mais a perder se não avançarem para além do PFP. Conduzimos uma experiência em larga escala com um sistema de compensação independente dos objectivos. Os resultados apontam para um forte argumento para tornar o PFP uma coisa do passado.
Os elementos disfuncionais do PFP Nos últimos 50 anos, académicos como Edward L. Deci e Jeffrey Pfeffer, e especialistas como Alfie Kohn e Daniel H. Pink, têm argumentado que o “pay-for-performance” (PFP) é inerentemente disfuncional. Isto tem como base duas fontes principais:
1.º Primeiro, o PFP concentra-se em resultados estritamente definidos, tais como o número de vendas fechadas, mas ignora as formas como esses resultados são atingidos. Isto introduz a possibilidade de que o acaso – ou, pior, o comportamento reprovável – seja recompensado e que a tentativa de alcançar a recompensa prometida prejudique outros comportamentos desejáveis, como o trabalho de equipa e a colaboração.
2.º Em segundo lugar, o PFP fornece a motivação extrínseca da recompensa financeira, mas ignora os poderosos e benéficos motivadores intrínsecos, como a alegria da própria tarefa, o sentido de contribuir e pertencer a uma equipa, e o desenvolvimento pessoal. As recompensas financeiras levam os trabalhadores a focar-se em objectivos específicos e a evitar actividades que não conduzam directamente à realização desses objectivos. O PFP suprime a motivação intrínseca, conduzindo, na melhor das hipóteses, ao cumprimento – e não alimenta um compromisso duradouro dos colaboradores ou a sua identificação com a empresa. A longo prazo, isto reduz o desempenho global.
Independentemente das disfunções que possa gerar, o PFP tem as suas utilizações. Pode impulsionar um desempenho superior quando os trabalhos oferecem pouca ou nenhuma oportunidade de motivação intrínseca. Quando os postos de trabalho são monotonamente simples ou orientados para o volume, a motivação extrínseca fornece um foco para o esforço e comportamento dos trabalhadores.
Mas o PFP prejudica o desempenho do trabalho que exige que as pessoas explorem problemas complexos, desenvolvam soluções criativas e alcancem resultados qualitativos que não podem ser totalmente especificados com antecedência. Além disso, quando os objectivos de desempenho se tornam obsoletos, como, por exemplo, quando as linhas de produção foram encerradas e as vendas caíram na fase inicial de confinamentos devido à COVID-19, o PFP perde o seu poder de motivação, porque não pode concretizar as recompensas que prometeu.
Procura de alternativas ao payforperformance: case study
Os líderes do Grupo Hilti, empresa com sede no Liechtenstein que oferece produtos e serviços à indústria da construção, têm as suas próprias dúvidas sobre a eficácia do PFP e se o seu enfoque no desempenho individual está desfasado da cultura de colaboração da empresa.
A empresa familiar emprega mais de 30 mil pessoas, 70% das quais vendem os seus produtos e serviços directamente a empreiteiros de estaleiros de construção em 120 países. A Hilti tem uma estrutura descentralizada, e as organizações do país mantêm as suas próprias equipas comerciais. À medida que a gama e complexidade do portefólio de produtos e serviços da empresa tem crescido, o mesmo acontece aos desafios do seu pessoal comercial. Inicialmente, limitaram-se a oferecer os produtos da empresa ao maior número possível de empreiteiros dentro dos seus territórios atribuídos. Contudo, à medida que a Hilti penetrava completamente nos seus territórios de vendas, o crescimento contínuo exigia que a empresa ganhasse uma maior quota de empreiteiros. Para esse fim, a empresa aumentou a personalização e acrescentou novas soluções digitais, mas essas mudanças também levaram a vendas mais complexas, ciclos de vendas mais longos, e uma abordagem de venda baseada em soluções.
Actualmente, os vendedores da Hilti são mais semelhantes a consultores. Muitas vezes, especializam-se nas necessidades de indústrias específicas e colaboram com colegas, engenheiros, pessoal de serviço ao cliente e líderes de equipa para satisfazer as necessidades dos clientes.
A compensação das vendas na Hilti tem sido baseada num sistema de pagamento por desempenho adaptado, mediante directrizes estabelecidas centralmente, às necessidades locais. Mas o foco do PFP no desempenho e volume de vendas individuais está cada vez mais desfasado da estratégia e cultura da empresa. Assim, em 2018, a direcção da Hilti pediu-nos que propuséssemos e testássemos um novo sistema de compensação de vendas que estivesse mais alinhado com as suas necessidades.
Revimos as organizações de mercado da empresa a nível mundial e identificámos uma organização nacional na Europa de Leste que se adequava bem ao estudo rigoroso de uma intervenção envolvendo um novo sistema de compensação. Na altura, os 190 vendedores da organização do país recebiam 65% do seu salário em compensação fixa e 35% em compensação variável, em média. Mas havia problemas neste sistema.
A direcção investia uma quantidade significativa de tempo e energia na fixação de objectivos de compensação justos e motivadores. Os ciclos de vendas mais longos e o esforço de equipa necessário para fechar negócios dificultavam a atribuição de vendas a vendedores individuais. Além disso, as questões de quando e como ajustar os objectivos eram frequentemente debatidas e contestadas. Apesar dos esforços da direcção para resolver estes problemas com várias fórmulas, a fixação de objectivos para os prémios constituía um desafio crónico, que frequentemente resultava em insatisfação no seio da força comercial.
O sistema de compensação também se tornara demasiado complexo devido aos esforços da administração para o utilizar de modo a conduzir um número crescente de prioridades organizacionais. Muitos vendedores não compreendiam o seu pagamento de compensações ou que acções se pretendia incentivar, tornando todo o sistema ineficaz como ferramenta de motivação.
Outra questão era que os vendedores recorriam a comportamentos tácticos para encerrar as vendas necessárias e ganharem os seus prémios mensais. Estes comportamentos diluíam a estratégia de vendas da organização, que se destinava a investir o tempo necessário para estabelecer e alimentar relações de longo prazo, baseadas em valores, com os clientes.
E, por fim, os vendedores estavam descontentes com a variabilidade da sua compensação. Os longos ciclos de vendas causavam um elevado grau de flutuação na compensação mensal de vendas, o que deixava por vezes os vendedores incapazes de pagar as suas despesas de subsistência.
Leia o artigo na íntegra na edição de Agosto (n.º 140) da Human Resources.
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