Os números da (des)igualdade de género, a nível global

Nenhum de nós verá a igualdade de género durante a nossa vida, e nem provavelmente muitos dos nossos filhos. É essa a constatação preocupante do Global Gap Report 2020, do Fórum Económico Mundial, que revela que a igualdade de género não será atingida nos próximos 99,5 anos. Eis o que o relatório destaca.

 

A igualdade de género tem uma influência fundamental na capacidade que as economias e sociedades têm para prosperar ou não. O desenvolvimento e aproveitamento de metade do talento disponível no mundo têm uma enorme influência no crescimento, na competitividade e na disponibilidade futura de economias e empresas em todo o mundo.

As classificações do índice oferecem um meio eficaz para avaliar o progresso. Foram concebidas para criar consciência global dos desafios que as diferenças entre géneros representam, bem como das oportunidades que surgem quando são tomadas medidas para as reduzir.

 

Representação política em ascensão, mas será que é suficiente?

Agora no seu 14.º ano, o Global Gap Report 2020 compara 153 países no seu progresso em direcção à igualdade de género em quatro dimensões: Participação e Oportunidade Económicas, Desempenho Educacional, Saúde e Sobrevivência, e Responsabilização Política. Além disso, o relatório deste ano examina as perspectivas de disparidade de género nas profissões do futuro.

 

O relatório apresenta uma imagem decididamente mista. No geral, a procura pela igualdade de género melhorou, ficando abaixo de um século e registando uma melhoria acentuada dos 108 anos do índice de 2018. Uma maior representação política para as mulheres contribuiu para isso, mas, em geral, a esfera política continua a ser a dimensão com o pior desempenho.

No outro extremo da escala, prevê-se que sejam precisos apenas 12 anos para atingir a igualdade de género na educação e, de facto, de maneira geral, a igualdade de género foi totalmente alcançada em 40 dos 153 países classificados.

 

O “efeito do exemplo a seguir” colhe dividendos no topo…

Aprofundando factos e números, levará 95 anos para diminuir a diferença entre géneros na representação política, com as mulheres em 2019 a ocupar 25,2% dos assentos parlamentares e 21,2% das posições ministeriais.

Positivamente, o chamado “efeito de exemplo a seguir” pode estar a colher dividendos em termos de liderança e salários. A melhoria da emancipação política das mulheres tem, como regra geral, correspondido ao aumento do número de mulheres em cargos de chefia no mercado de trabalho.

 

… mas não abaixo

Em contraste com este progresso positivo no mundo da liderança, a participação das mulheres no mercado de trabalho mais amplo estagnou e as disparidades financeiras estão a aumentar. Globalmente, a tendência é de deterioração nas economias emergentes e em desenvolvimento, que está a compensar os ganhos obtidos nos países da OCDE.

Embora a escolaridade e a saúde e sobrevivência estejam muito mais próximas da igualdade (96,1% e 95,7%, respectivamente), uma área importante de preocupação é a participação e as oportunidades económicas. É a única dimensão em que o progresso retrocedeu. Aqui, os números são preocupantes, com uma situação em deterioração que empurra a igualdade de género para os 57,8%, o que representa, em tempo, 257 anos antes que a igualdade de género seja alcançada.

O relatório destaca três razões principais para isso:

– as mulheres têm mais representação nas funções que estão a ser automatizadas;

– há poucas mulheres a ingressar em profissões onde o crescimento salarial é mais pronunciado (obviamente, mas não exclusivamente, o sector tecnológico);

– as mulheres enfrentam o eterno problema de falta de infra-estruturas de assistência e acesso ao capital.

 

 

Olhando para os futuros empregos

Para o futuro, o relatório revela que o maior desafio que impede a redução da diferença de género económica é a sub-representação das mulheres em cargos emergentes. No cloud computing, apenas 12% dos profissionais são mulheres. Da mesma forma, em Engenharia e Dados e Inteligência Artificial, os números são 15% e 26%, respectivamente.

Para resolver essas lacunas, as estratégias da força de trabalho devem garantir que as mulheres estejam melhor equipadas (em termos de melhoria ou requalificação de competências) para lidar com os desafios e aproveitar as oportunidades da Quarta Revolução Industrial.

A contratação diversificada é outra área a ser melhorada (reflectindo a situação actual que vê a igualdade de género num conjunto de competências procuradas, mas onde não existe uma representação igual), assim como a criação de culturas de trabalho inclusivas.

 

Os melhores

– O principal país na igualdade de género continua a ser a Islândia (pelo 11.º ano consecutivo).

– Os países que mais melhoraram foram a Albânia, Etiópia, Mali, México e Espanha.

– Dos 149 países classificados, 101 melhoraram as suas pontuações em comparação com o índice de 2019 (isto exclui os cinco novos países que ingressaram no ranking este ano).

– Outros 48 mantiveram o desempenho, enquanto o 10.º percentil de topo viu as suas pontuações melhorarem mais de 3,3% ano a ano.

– Um total de 35 países alcançou a igualdade de género na educação.

– Na área da saúde, 48 países quase alcançaram a igualdade e 71 fecharam pelo menos 97% da diferença.

 

Os que poderiam fazer mais

– Globalmente, a igualdade de género encontra-se nos 68,6%, e os 10 países inferiores diminuíram apenas 40% da diferença de género.

– As pontuações de emancipação política são baixas. Em termos de representação parlamentar, globalmente, as mulheres conseguiram apenas 25% das posições disponíveis, número que cai para 21% a nível ministerial. Nesse nível, há nove onde elas não têm representação.

– Nos últimos 50 anos, 85 estados não tiveram um chefe de estado feminino.

– Em termos de participação económica, a diferença de género levará 257 anos a diminuir (em comparação com 202 anos no relatório de 2019).

– Globalmente, apenas 55% das mulheres (de 15 a 64 anos) estão envolvidas no mercado de trabalho, contra 78% dos homens.

– Existem 72 países onde as mulheres são impedidas de abrir contas bancárias ou obter crédito.

– Não existe nenhum país onde os homens passem a mesma quantidade de tempo em trabalho não remunerado que as mulheres. Nos países em que a proporção é mais baixa, ainda assim é de 2:1.

 

Tendências

– Por região, a Europa Ocidental fez o maior progresso na igualdade de género (76,7%), seguida pela América do Norte (72,9%), América Latina e Caraíbas (72,2%), Europa de Leste e Ásia Central (71,3%), África Subsaariana (68,2%), Sul da Ásia (66,1%) e Médio Oriente e Norte da África (60,5%).

– Esses números, no entanto, ocultam várias tendências importantes, que têm um impacto significativo numa era de igualdade de género. Na América do Norte, o progresso estagnou durante 2019, enquanto mais a sul, na América Latina e nas Caraíbas, vários países tiveram um forte desempenho ao longo do ano.

 

Isto traduz-se em igualdade de género, em anos, como:

54 – Europa Ocidental

59 – América Latina e Caraíbas

71,5 – Sul da Ásia

95 – África Subsaariana

107 – Europa de Leste e Ásia Central

140 – Médio Oriente e Norte da África

151 – América do Norte

163 – Leste Asiático e Pacífico

 

Como chegar à frente

O índice deste ano destaca áreas em que os líderes políticos precisam de focar mais a sua atenção. A nível federal, uma maior representação política – e, em algumas nações, qualquer representação – por parte das mulheres é uma necessidade premente.

Sem representação de metade da população na política nacional e local, o progresso será obstruído noutras áreas pertinentes às mulheres e na procura pela igualdade de género. Isso é claramente demonstrado na dimensão da participação económica e da oportunidade.

Sem alterar a legislação e as atitudes culturais / sociais em relação à quantidade relativa de tempo que as mulheres gastam em tarefas e cuidados domésticos não remunerados, o fardo dos deveres domésticos e dos cuidados não será reequilibrado, uma situação que continuará a prejudicar as oportunidades profissionais das mulheres.

No futuro, os líderes políticos precisam de tomar medidas para munir melhor as gerações mais jovens – particularmente nos países em desenvolvimento – com as competências necessárias para terem sucesso no mundo dos futuros empregos.

É preciso aumentar a escolaridade formal – e aplaudir a forte igualdade de género nessa área -, mas é insuficiente para fornecer aos jovens, rapazes e raparigas, de todos os níveis académicos o tipo de competências necessárias para o mercado de trabalho da Quarta Revolução Industrial. A esse respeito, as diferenças de género permanecem e provavelmente acabarão por se exacerbar, a menos que sejam abordadas agora.

 

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