Preciso de contratar. E agora?
O que ainda está por simplificar e que pode incentivar a contratação em Portugal.
Por Paulo Teixeira, bastonário da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução
Num primeiro (e incauto) olhar, parece simples dar resposta ao que são as obrigações aquando da contratação. Afinal de contas, apesar de, enquanto cidadãos, sonharmos sempre com o dia em que bastará reportarmos uma vez um dado facto à Administração Pública, a verdade é que as comunicações à Segurança Social e à Autoridade Tributária não se revestem de uma complexidade que nos faça hesitar no momento de aumentar a equipa.
No entanto, não é apenas isto que está em causa quando se pretendem proteger direitos e legítimos interesses de trabalhadores e empregadores. E, para isso, não basta ir à internet procurar uma minuta de contrato, nem pedir ao Chat GPT que redija uma “num instantinho” (num clique, literalmente). Num país onde há uma vasta panóplia de modelos de contratação (e, acreditem, não falo “apenas” na possibilidade de teletrabalho), é decisivo conhecer, com rigor, o objectivo e as prioridades de quem está a contratar. E é aqui que profissionais habilitados, como os solicitadores, podem fazer toda a diferença. Ou seja, este é um momento de prevenção do litígio e em que muitos conflitos se podem evitar mediante a redacção de um contrato sólido e robusto, capaz de prever todas as especificidades, acabando, inclusivamente, por acarretar benefícios para ambas as partes.
É claro que também cá estamos para ajudar a resolver os problemas (problemas que existirão sempre e que também se renovam e inovam)…, mas já imaginou como tudo seria mais simples se o contrato pudesse funcionar como uma espécie de manual de instruções? Parece exagerado? Acredite que não. Na verdade, o contrato, para cumprir a sua missão primordial, deverá mesmo conseguir dar respostas às diversas questões que podem surgir no âmbito daquela relação específica entre trabalhador e empregador.
Importando, também nesta matéria, explorar e activar as potencialidades dos avanços tecnológicos permanentes, sem que isso signifique a despersonalização ou a desumanização do processo de contratação e de acompanhamento do trabalhador, e sendo esta uma área em que os solicitadores têm uma consolidada e reconhecida intervenção, não tenho dúvidas de que ainda há um caminho a fazer no que toca à simplificação e à promoção de sinergias (entre pessoas, instituições e sistemas).
E, num curto exercício de análise, baseado na experiência quotidiana e nos reportes de outros colegas de profissão, surgem logo sugestões para projectos que poderiam tornar esta relação mais eficiente, transparente e inclusiva. Além, evidentemente, do incentivo que representaria à contratação em Portugal.
Quando falamos em desburocratizar, temos obrigatoriamente de referir a necessidade gritante de simplificação do processo de contratação de trabalhadores estrangeiros. Este é um processo que, mesmo nos dias de hoje, em que a expressão “aldeia global” já parece datada, ainda se pode revelar complexo, nomeadamente devido aos procedimentos necessários para obtenção de vistos para trabalho, de autorizações de residência, entre outras burocracias. Simplificar e desmaterializar esses processos, garantindo que empregadores possam vir a acompanhar, em tempo real, o progresso dos vistos e autorizações, iria, com toda a certeza, agilizar e promover o recrutamento em sectores com escassez de mão-de-obra.
Não ficamos por aqui… pensemos, por exemplo, na implementação de uma Plataforma Integrada para Formação Profissional. Como sabem, os empregadores são obrigados a proporcionar formação profissional contínua aos trabalhadores. No entanto, muitos reclamam da complexidade associada ao cumprimento desta obrigação. Uma plataforma digital integrada, através da qual as empresas pudessem inscrever directamente os seus trabalhadores em cursos certificados e receber relatórios automáticos de conformidade, poderia desburocratizar e estimular esse processo. Algo que também asseguraria, aos trabalhadores, o acesso a formações de qualidade, beneficiando, em última instância, o cidadão, munido de mais e melhores garantes de qualidade dos serviços prestados.
São apenas ideias, bem sei. As dificuldades inerentes à interoperabilidade de sistemas e, acima de tudo, ao alinhamento de instituições (e pessoas) representam obstáculos que, muitas vezes, aparentam ser intransponíveis. Mas, fazendo jus à natureza dos solicitadores e enquanto bastonário da casa que os representa, eu só posso pensar em soluções. E em querer fazer parte delas, apoiando os cidadãos e as empresas e, obviamente, servindo a Justiça.