Quatro aceleradores do processo de transformação da função de Recursos Humanos

Tecnologia, novo modelo organizacional, estratégia integrada de Gestão de Pessoas e COVID-19. São estes os “quatro aceleradores” através dos quais a função RH actuará cada vez mais como um agente de mudança e um catalisador da evolução organizacional.

 

Por Margarida Santos, Career associate da Mercer

 

As organizações têm assistido à transformação dos seus departamentos de Recursos Humanos (RH) de forma contínua e acelerada, durante as últimas décadas. Não obstante, ainda vamos observando conversas à volta do seu efectivo contributo e impacto no negócio.

Um artigo de Março do “The Economist” refere que, se no passado, e após uma crise de natureza financeira, o papel do Chief Financial Officer (CFO) foi a figura de referência para salvar as empresas, hoje, o contexto mostra-nos que é o papel do Chief Human Resources Officer (CHRO) que assume uma maior preponderância.

Esta situação é notória ao vermos a sua crescente influência junto das equipas de gestão de topo, ocupando um permanente “lugar à mesa”, integrando reuniões de decisões críticas para os negócios de forma recorrente ou no papel de um advisor fundamental.

Destaco assim quatro aceleradores de mudança enquanto impulsionadores deste movimento de evolução da função RH:

  • Tecnologia

Este é o tema recorrentemente mais referido enquanto principal foco de disrupção para os negócios, assumindo também especial destaque enquanto motor da evolução da função RH. De notar que as áreas de Recursos Humanos mais digitais demonstram até quatro vezes maior probabilidade de ocuparem uma posição mais estratégica na organização (Mercer Global Talent Trends, 2020).

Hoje, já não falamos apenas do impacto da automação, mas sim na forma como a tecnologia irá exponenciar a acção humana. Na perspectiva da função RH, falamos na forma como se terá de passar de uma abordagem de “process orientation” para “experience design”. O que significa isto? Que as áreas de RH terão cada vez mais de pensar na experiência que proporcionam aos seus colaboradores ao longo do seu ciclo de vida nas organizações, tendo por base, por exemplo, os princípios do design thinking e questionando-se permanentemente sobre “quais as interacções – pessoal, digital ou ambas –, que trazem maior satisfação e engagement para os colaboradores”.

 

  • Novo modelo organizacional

Neste ponto, uma das principais referências em Gestão de Pessoas, Josh Bersin, destaca o trabalho desenvolvido pela Mercer, reforçando um olhar mais amplo para a função RH.  O desafio colocado está na importância de evoluir de um modelo de “entrega de serviço” para um modelo “ágil”, indo beber ao mindset de funções tipicamente das Tecnologias de Informação (TI), como seja a gestão, desenho e desenvolvimento de produto ou o cada vez maior foco (quase obsessão) por data e analytics.

No entanto, quando questionadas as organizações sobre “o que é mais importante em ser mais ágil”, apenas 5% aponta as práticas de trabalho ágeis, o recurso ao desenvolvimento de produto de forma interactiva, uso de protótipos ou de uma fase de testes. A principal valorização está ainda no “agile teaming and workers” – equipas que se integram e desintegram, consoante a necessidade (30%).

Este pensamento ainda recente, mas necessário, terá como consequência inevitável o upskilling e reskilling de colaboradores de Recursos Humanos, uma tendência que observamos de forma global e que é vista pelos executivos como a mais capaz de entregar retorno.

 

  • Estratégia integrada de Gestão de Pessoas

Ao observarmos as high performing companies, vemos que estas têm até seis vezes maior probabilidade de terem uma integrated people strategy. Esta “estratégia integrada de Gestão de Pessoas” tem como premissa a capacidade de entrega da proposta de valor ao colaborador, desde atracção até à sua saída, passando pelo onboarding, desenvolvimento, compensação e reconhecimento, gestão da saúde e bem-estar.

Assim, a qualidade da experiência de colaborador e o desenho das interacções terá tanto maior impacto quanto o nível de integração com o qual os Recursos Humanos projectarem esta estratégia em prol das necessidades do negócio. No entanto, apenas dois em cinco responsáveis de RH referem fazê-lo (Mercer Global Talent Trends, 2020).

 

  • COVID-19

Apesar de todos os desafios, o actual contexto permitiu a conquista de um activo importantíssimo do ponto de vista organizacional e, em particular, da Gestão de Pessoas. Assistimos desde a rápida passagem parcial ou total da força de trabalho para o contexto remoto, à implementação de medidas de gestão de risco, higiene e segurança sem precedentes, ao acompanhamento do bem-estar e saúde mental de forma mais efectiva, até à tomada de decisões de gestão, nomeadamente lay-off ou revisão de remunerações, num contexto repleto de incertezas.

Todas estas decisões foram tomadas a um ritmo frenético. Esta velocidade é, pois, um aspecto que deve enraizar-se, e que é destacado como essencial para 77% dos executivos que esperam uma Gestão de Pessoas cada vez mais ágil (Mercer Global Talent Trends, 2020).

 

Em suma: através destes “quatro aceleradores”, a função RH actuará cada vez mais como um agente de mudança e um catalisador da evolução organizacional. Deve procurar reinventar-se na sua interacção com o negócio e com os seus stakeholders, bem como investir continuadamente no reforço das suas HR skills (como design thinking, change management, data analytics e data science, ou inteligência artificial). Apenas através deste percurso, ainda longo, garantirá o seu posicionamento na linha da frente e uma actuação enquanto role model no futuro das organizações.

 

 

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