Que prioridades para a Lei Laboral? João Pedro Tavares (ACEGE) responde

João Pedro Tavares, presidente da Acege, identificou quais deviam ser as prioridades do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS) e que medidas deveriam ser prioridade em termos de trabalho.

 

«Existem enormes desafios ao nível do contexto laboral em Portugal, da produtividade aos salários, às condições de trabalho, ao bem-estar dos trabalhadores e, em particular, no que respeita aos que não exercem nenhuma actividade, pois encontram-se no desemprego, ou, ainda, aos que foram precocemente descartados e não conseguem regressar ao mercado de trabalho.

Os governantes legislam sobre “agendas de trabalho digno”, como aconteceu em 2023, com mais de 70 medidas que pretendiam corrigir situações que vão surgindo – como sejam as plataformas e o vínculo daqueles que a partir delas trabalham, ou regras sobre os despedimentos e outsourcing, ou medidas específicas para os jovens, entre outras – mas, na sua maioria, em modo “avulso”, ou de implementação demorada, ou ainda criando outros problemas que obrigariam a nova legislação correctiva. O actual governo já referiu a necessidade de avaliar e rever o que se legislou anteriormente.

Que prioridades existem? Alguns aspectos a destacar:

1. Antes de mais, estes são temas que obrigam a uma abordagem mais profunda e estruturada, que não traga apenas resultados imediatos, mas sobretudo a médio e longo prazo, e que perdurem para lá dos governantes em funções. A disponibilidade dos políticos é, principalmente, de curto prazo, carecendo-se por isso de uma reestruturação mais profunda. Esta também é, sem dúvida, uma responsabilidade da sociedade civil, das associações empresariais, dos sindicatos, dos líderes empresarias. Os governos mudam, mas as empresas e os trabalhadores continuam, e nem tudo se resolve com afinco legislativo.

2. É, assim, importante promover uma reestruturação da economia portuguesa, com empresas mais sólidas, de maior dimensão e crescimento na cadeia de valor, em particular as que exportam, num trabalho conjunto entre todos os intervenientes, tornando-as mais competitivas. Há, ainda, que valorizar o papel das gerações mais jovens, mais empreendedoras e qualificadas, e requalificar os trabalhadores mais velhos, para que o País se torne menos empobrecido, mais competitivo e com uma nova filosofia de gestão assente na renovação das estratégias empresariais.

3. É necessário promover o investimento na valorização das pessoas e na aplicação da tecnologia, melhorando a produtividade. Não há que ter receio do bom uso da tecnologia, procurando-se actuar com ética e propósito. Na realidade, os portugueses são extraordinários trabalhadores, amplamente reconhecidos pelas suas capacidades, atitude, valores e capacidade de se adaptarem à mudança, mas na realidade, o País tem um enormíssimo défice de produtividade que importa inverter. Um desafio para os líderes empresariais que devem ter visão, ambição e coragem.

4. Existem 30% de pobres em Portugal que trabalham, 25% da população activa que recebe o salário mínimo e um salário médio cada vez mais próximo do mínimo. Assim, impõe-se perguntar: como resolver estas incongruências?

5. A legislação tende a proteger o trabalho, mas não as pessoas (incluindo os que estão no desemprego). A defesa da dignidade dos trabalhadores é um aspecto central e determinante. Defendemos que a família seja considerada como um stakeholder importante que importa proteger, e que o Estado seja guardião de um salário digno para as famílias. Haverá situações em que o salário mínimo poderá ajudar às condições mínimas de dignidade, mas sabemos que, na maioria dos casos, esta realidade está longe de ser uma garantia.

Se realmente ambicionamos uma “agenda de trabalho digno”, há que analisar estas questões com a seriedade e dignidade que merecem.»

 

Este artigo foi publicado na edição de Maio (nº. 161) da Human Resources, nas bancas.

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