Randstad: A transformação digital como uma mudança cultural
Na Randstad, a transformação digital é encarada como uma mudança de paradigma que vem alterar a relação das empresas com clientes e colaboradores.
A transformação digital é um processo que está a ter impacto nas empresas, nas suas mais variadas dimensões. Com mudanças a ocorrer na gestão dos recursos humanos, é cada vez mais importante olhar para a experiência do colaborador e adaptar os processos de formação e recrutamento & selecção. Mariana Delgado, manager Information Technology da Randstad Portugal, explica à Human Resources Portugal como estão a ocorrer estas transformações.
Quais os sectores em que a Transformação Digital dos últimos anos mais se faz sentir e com que tipo de impactos?
É interessante pensar como a transformação digital pode impactar as mais diversas áreas da sociedade. Até mesmo qualquer empresa, independentemente de qual o seu sector, poderá ser alvo do processo de transformação digital e beneficiar por desenvolver uma cultura que privilegia o digital. Nos últimos anos vários são os sectores a destacar, desde a área da saúde, educação, consumo, indústria, tecnologia, entre outros.
Sem dúvida nenhuma que a transformação digital é uma reacção aos novos hábitos dos consumidores. O segredo para as empresas passa por estarem atentas às novas tecnologias e, principalmente, às mudanças de comportamento de consumo.
São claros os impactos do processo de transformação digital e até visiveis no nosso dia-a-dia. Desde logo, o crescimento dos negócios de e-commerce que traduzem a transição do físico para o digital. Outro bom exemplo, é a presença no mercado de empresas que desenvolvem produtos, desde logo, digitais (ex: empresas Fintechs e empresas de SaaS). Mas de facto o mais notório neste processo de transformação é a capacidade de relacionamento que se criou com os consumidores/clientes. E neste ponto, a tecnologia mudou totalmente a forma como nos conectamos com os clientes e lhes oferecemos uma proposta de valor acrescentado. O próprio feedback do cliente é o melhor mecanismo de impulsionar a marca, o que torna (para o bem e para o mal) o processo de propaganda e influência mais assertivo, dinâmico e crítico para o sucesso das empresas.
De que forma esta Transformação está a evoluir na área de gestão de pessoas e com que resultados?
Hoje é indiscutível o papel estratégico que a tecnologia assume nas organizações, não descurando, obviamente o papel das pessoas neste processo. E para que o processo de transformação digital ocorra é necessário apostar no foco no consumidor (entender preferências e garantir que através dele possamos recolher feedback de como aportar maior valor ao produto); apostar nos processos ágeis e nos novos modelos de gestão (garantindo que a tomada de decisão estratégica é rápida, ágil e flexível quando necessário reformular e baseada em dados e informações relevantes); bem como o foco na adaptação à mudança (entendida neste ponto como a necessidade de se incutir uma mudança cultural, que pressupõe um desafio mais alargado de envolver as pessoas no processo de mudança). Todos os pontos anteriores são conduzidos entre pessoas, de pessoas e para pessoas, pelo que se considera essencial o papel dos líderes organizacionais no estabelecimento de directrizes claras e objectivas para o alcance destas metas. Mas não só, importa entender que, com os mais recentes modelos de gestão, todos os elementos das equipas poderão ter um papel determinante no processo de transformação, porque também eles deverão ter conhecimento da tecnologia, aperfeiçoar a técnica no que diz respeito à sua implementação e acompanhar os resultados positivos e menos positivos que daí advêm, promovendo desta forma um processo de melhoria continua.
No que concerne à área de recursos humanos, especificamente, o paradigma também mudou, obrigando as equipas de RH a mudar a forma como as empresas operam internamente. Mais uma vez, o físico cedeu o seu lugar a ferramentas digitais, estratégicas e voltadas para as necessidades emergentes da área. Acima de tudo, com o intuito de proporcionar uma melhor experiência ao colaborador, optimizando tempos e processos e garantindo a consistência necessária, tranversalmente em todos os processos de gestão de pessoas, por via de práticas automatizadas e baseadas em dados. Algumas soluções comuns de transformação digital usadas na estratégia digital de RH são visíveis nos processos de recrutamento & selecção (aposta em novos softwares de gestão para optimizar o processo e para que o mesmo seja orientado por recursos a tecnologias inteligência artifical) e formação, por exemplo, quando se assiste a um aumento de cursos e formações e-learning.
Quais os principais desafios que tem trazido esta Transformação Digital?
Aliado à falta de investimento e de iniciativa por parte de algumas empresas, que é um dos principais desafios ao processo de transformação digital, importa referir que o outro obstáculo diz respeito à falta de profissionais/recursos humanos qualificados e capacitados para promover este processo. Neste ponto, verificamos uma tendência das estruturas organizacionais para reforçarem as equipas com perfis mais híbridos, com conhecimento técnico do processo e das ferramentas, do negócio a par dos conhecimentos/ competências de gestão.
Como tem sido conduzida a adaptação das pessoas?
O ser humano é adaptável por natureza, muito embora um pouco resistente a qualquer processo de mudança organizacional. Contudo, se o processo de transformação digital é desenvolvido por pessoas, são elas as principais responsáveis pelo sucesso da iniciativa. A forma como cada organização conduz e comunica o processo de transformação digital determina o envolvimento e o sucesso da adesão dos colaboradores ao processo.
As transformações recentes traduzem-se numa maior aposta/necessidade de formação? Com que objectivos?
Dado que o objectivo é promover uma mudança cultural cujo conceito implica implementar uma mentalidade digital e, de certa forma, uma mudança de mindset, as lideranças têm um papel determinante neste propósito. Desta forma, devem direccionar os seus esforços para que sejam as equipas os agentes de transformação. E para ser agente de transformação, o processo passa, naturalmente, por ser conhecedor da tecnologia e dos processos (sendo esta uma das principais necessidades de formação eventualmente). Adicionalmente, parece-me necessário proporcionar maiores níveis de autonomia e confiança nas equipas, para que encarem com maior responsabilidade e sentido crítico o papel de “agentes”. Posteriormente, e assumindo com toda a legitimidade este novo papel, é necessário medir os resultados das mudanças e acompanhar as iniciativas que estão a ser implementadas e praticadas, para que se possa visualizar o seu real impacto. Tudo isto, com vista a um processo de melhoria contínua e desde logo, com a certeza de que será um projecto continuo e inacabado.
Quais os temas prioritários a curto prazo em matéria de Transformação Digital?
A prioridade deverá ser definida de acordo com a maturidade do processo de transformação digital no qual a empresa se encontra. Para situações em que a gestão de recursos possa ser crítica, é sempre interessante fazer uma aposta na procura de serviços de consultoria especializados nas áreas de transformação digital, enquanto parceiro de negócio. Mesmo nestas circunstâncias, é determinante que o projecto de tranformação digital seja encarado por toda a organização de forma positiva, garantindo o envolvimento de todos os stakeholders.
Que implicações teve a aceleração da Transformação Digital nos perfis que são hoje procurados pelas empresas com quem trabalham?
Como resultado da aceleração da Transformação Digital, hoje, assistimos cada vez mais à existência de perfis mais híbridos/ polivalentes no mercado, tendo sido verificado o desaparecimento de alguns cargos e o surgimento de novos perfis para fazer face às necessidades e à procura do mercado por determinadas competências.
Olhando para o futuro, e o futuro é agora, os perfis tendência para o ano de 2022 estão relacionados com big data, data analytics, business intelligence, internet of things (IoT), realidade virtual e aumentada, blockchain, inteligência artificial, machine learning, cloud computing, robotic process automation (RPA) e cyber security.
No entanto verificamos também uma alteração na procura do mercado, por perfis não necessariamente tecnológicos (tais como perfis de apoio à gestão ou vendas) em que competências aliadas à transformação digital passam a ser críticas e altamente valorizadas. Por exemplo já não é incomum em departamentos de gestão de pessoas encontrarmos profissionais com competências em RH e backgroung/ formação em analytics.
Qual a dimensão que prevê que todas estas mudanças venham a ter no trabalho no futuro mais imediato?
Todos nós concordamos que o nosso quotidiano ficou bem “mais fácil”, a partir do momento em que dispomos de serviços e produtos automatizados que oferecem uma comodidade impensável e neste momento, indispensável, quando comparado há uns anos atrás. Claramente sentimos que no nosso dia-a-dia houve uma mudança nos hábitos de consumo e que ainda que resistentes no início, agora se valorizam, como por exemplo as compras on-line. Por via de sistemas de entrega ágeis e rápidos e por via de soluções de pagamento automáticas e seguras, comprar online é uma tendência que veio para ficar. Outro exemplo que espelha uma mudança de tendências é a forma como nos relacionamos com clientes/consumidores (encurtamos distâncias com recurso a reuniões digitais, via Teams/ google meet e negociamos através do WhatsApp, numa era em que o Outlook e o Gmail já nos surgem como uma proposta formal e complexa de comunicação para quem necessita apenas de uma breve confirmação de reunião.
Contudo, para quem quer agir rápido e acompanhar tendências, nomeadamente de processos que derivam do processo de transformação digital, é crucial estarmos preparados para gerirmos novos desafios – a experiência do utilizador/ cliente/consumidor. À distância de um clique ou de um comentário, erguemos um negócio ou derrubamos uma marca. Quero com isto dizer que, a par da evolução tecnologica, surgem tanto novas soluções como novos desafios que precisam de igual atenção e que irá certamente obrigar as empresas a adaptar e a reformular novas estratégias.
Quais as grandes tendências para os próximos tempos?
A tendência já está em curso, o futuro reserva grandes mudanças, não só ao nível dos modelos de gestão, automação de processos, mas mais importante ainda, um processo de liderança tranformacional. Não esquecer o desafio de colocar a gestão de pessoas no centro de toda o processo de transformação digital.
Este artigo faz parte do Caderno Especial “Transformação Digital” publicado na edição de Julho (n.º 139) da Human Resources.
Caso prefira comprar online, tem disponível a versão em papel e a versão digital.