Riscos antecipados há uma década materializaram-se (e agravaram-se). Empresas portuguesas identificam os mais preocupantes

Instabilidade política e social é o risco mais significativo que as empresas nacionais prevêem enfrentar este ano. A conclusão é da 10ª edição do estudo “A visão das empresas portuguesas sobre os riscos”, realizado pela Marsh Portugal, que traça também um balanço do cenário de risco dos últimos 10 anos.

 

Cerca de 49% dos inquiridos apontam os eventos climáticos extremos enquanto principal risco que o mundo enfrentará em 2024. Este risco ocupava a terceira posição do ranking na edição do ano passado, registando uma subida de sete pontos percentuais. Seguem-se o crime cibernético generalizado e a insegurança cibernética (42%), a estagnação económica prolongada (34%), os conflitos interestatais (28%) e a geopolitização de recursos estratégicos (27%).

Relativamente aos riscos que as empresas consideram que as afectarão directamente a nível nacional, destaca-se a instabilidade política e social (58%), que sobe ao primeiro lugar, com um aumento de 13 pontos percentuais face à edição de 2023. Seguem-se os ataques cibernéticos (47%) e a retenção de talento (44%), que regista uma subida de nove pontos percentuais. O quarto e quinto lugares são ocupados pelos eventos climáticos extremos (36%) e pela recessão (24%).

«À entrada de 2024, as empresas portuguesas confrontam-se com um espectro de riscos que desafia a estabilidade e previsibilidade do ambiente geopolítico, económico e financeiro. A convergência destes riscos sugere um período de incerteza e a necessidade de estratégias de mitigação e adaptação mais sofisticadas», afirma Fernando Chaves, Risk specialist da Marsh Portugal.

«Aliada à volatilidade das relações internacionais, a actual tensão geopolítica poderá afectar a economia portuguesa. Perante a possibilidade de novos conflitos, o aumento do proteccionismo e o recuo da globalização, é fundamental que as empresas reavaliem a sua cadeia de abastecimento e considerem cenários alternativos para a continuidade dos negócios», acrescenta.

O estudo “A Visão das Empresas Portuguesas sobre os Riscos” faz uma ponte com o “Global Risks Report 2024”, produzido pelo Fórum Económico Mundial com o apoio estratégico da Marsh McLennan, cujos resultados de ambos foram apresentados pela Marsh Portugal no evento “Raio-X aos Riscos 2024”.

Dez anos de riscos em Portugal

Fruto do histórico de recolha da opinião dos líderes empresariais desde 2004, o estudo da Marsh apresenta, pela primeira vez, uma perspectiva da evolução dos riscos nos últimos 10 anos. Os dados demonstram a crescente complexidade do cenário de risco geopolítico, económico e financeiro enquanto principais factores que marcaram a última década, bem como os avanços tecnológicos e os desafios climáticos.

Neste período, também a crise do custo de vida, a inflação e o risco de recessões profundas tiveram um impacto significativo na confiança global, trazendo consigo desafios prementes, exacerbados pela incerteza política e pelas tensões comerciais.

A revolução digital trouxe consigo os perigos da desinformação, o voto electrónico e a disparidade geracional e regional. A sensação de insegurança cibernética e as consequências imprevistas da inteligência artificial emergiram enquanto ameaças críticas, exigindo políticas de governance mais robustas e coordenadas a nível internacional, de forma a mitigar os riscos associados.

A transição para uma ordem global multipolar foi também um tema recorrente, com médias e grandes potências a desafiarem normas previamente estabelecidas. Este cenário sugere um futuro onde a gestão de riscos globais e a cooperação internacional será ainda mais desafiante, mas também essencial para a estabilidade.

«Esta análise demonstra claramente que muitos dos riscos geopolíticos, económicos e financeiros antecipados há uma década não só se materializaram, como também se exacerbaram, o que representa uma falha colectiva em mitigar eficazmente os seus efeitos», diz Fernando Chaves.

«Apesar da previsibilidade de certos riscos, verifica-se que as acções implementadas foram insuficientes para contrariar as tendências negativas, levando a desafios ainda mais complexos e interconectados. A necessidade de abordagens mais proactivas e cooperativas torna-se evidente, visando não só a mitigação, mas também a prevenção de riscos futuros, sublinhando a importância de políticas de gestão global, inovação e solidariedade internacional na construção de um futuro mais resiliente e sustentável.»

A próxima década

Na perspetiva da Marsh, nos próximos dez anos, as empresas portuguesas terão de se adaptar a um cenário internacional em constante evolução. A diversificação económica e a procura por novos mercados tornar-se-ão estratégias-chave para as empresas prosperarem neste novo cenário.

A tecnologia continuará a ser um factor disruptivo, criando não só riscos, mas também oportunidades. A adopção de tecnologias emergentes poderá ser um diferencial competitivo, mas também uma fonte de vulnerabilidade se não for eficazmente gerida.

«As empresas portuguesas enfrentam um horizonte onde os riscos geopolíticos, económicos e financeiros se entrelaçam com crescente complexidade. A necessidade de adaptação e a prontidão para a mudança não são apenas uma questão de estratégia, mas de sobrevivência e sucesso a longo prazo. A capacidade de antecipar e responder proactivamente determinará a sua resiliência e capacidade de inovar e liderar num mercado global em constante transformação», alerta Fernando Chaves.

 

O caminho para a resiliência

Os dados mostram que cerca de 39% das empresas nacionais atribuem elevada importância à gestão de riscos, o que representa uma quebra de 11% face ao anterior, sendo este o valor mais baixo desde 2018. Apenas 12% atribuem pouca importância a esta temática, com 49% a afirmarem que atribuem importância suficiente.

Relativamente ao orçamento alocado para a gestão de riscos, também em 2024 se verifica um decréscimo do número de empresas que afirma ter aumentado este valor, sendo que apenas 27% o fez (contra os 39% registados em 2023). O valor estabilizou em grande parte das empresas (49%), com 22% a afirmarem não saber qual o valor orçamentado.

«A gestão de risco está cada vez mais associada à resiliência das empresas, sendo que a existência de uma política formal e transversal é um dos factores mais relevantes para a sua sobrevivência ou continuidade», diz Fernando Chaves.

«Uma gestão de riscos mais eficaz permite que as empresas estejam melhor preparadas para enfrentar um mundo cada vez mais complexo e volátil. Será importante perceber ao longo dos próximos anos se o investimento concretizado se materializou numa maior capacidade de adaptação das empresas e superação do quadro económico exigente vivido actualmente», conclui.

 

Participaram no estudo, que decorreu durante Dezembro de 2023 e Janeiro de 2024, 134 representantes de um leque diferenciado de organizações, pertencentes a diversos sectores de actividade.

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