Rui Lança, SLB. Avaliar, treinar e desenvolver: O triângulo (des)alinhado
«As empresas e as equipas investem milhões na formação e no treino, e sentimos diversas vezes, mais nas empresas, que as métricas para conferirmos se há uma real melhoria de produtividade directa ou indirecta no indivíduo ou no colectivo não são fáceis.»
Por Rui Lança, director Desportivo no Sport Lisboa e Benfica e docente universitário
Todas as organizações convivem com o desafio de avaliar, treinar e desenvolver o seu recurso mais valioso nos dias de hoje: as pessoas. Não sabemos o dia de amanhã, é verdade, mas acredito que as pessoas continuarão a ser o factor diferenciador, até porque as melhores ideias e decisões holísticas sairão das mentes mais competentes e competitivas, e isso advém da vantagem de termos os melhores recursos humanos.
Os desafios que referi não são de agora, mas talvez estejam a ficar cada vez mais visíveis, até pela competitividade e a existência de diferentes ferramentas de melhoria do rendimento que o mundo empresarial vai englobando. Todos os líderes e organizações procuram ter um processo de avaliação que seja totalmente justo (embora isso seja quase impossível), que ajude mais do que possa vir a prejudicar, e, por fim, que todos sintam que o processo de avaliação é uma verdadeira ferramenta para ajudar a organização, a equipa e o indivíduo a construir um real plano de desenvolvimento.
Por outro lado, as empresas e as equipas investem milhões na formação e no treino, e sentimos diversas vezes, mais nas empresas, que as métricas para conferirmos se há uma real melhoria de produtividade directa ou indirecta no indivíduo ou no colectivo não são fáceis. E sentimos que numa das áreas continua a ser muito complexa a medição de verdadeira melhoria ou mudança: as denominadas soft skills. A juntar a tudo isto, quer o processo de avaliação, quer o de formação teimam em não ser o momento inicial da criação de um verdadeiro plano de desenvolvimento da pessoa com o qual exista um real compromisso.
A avaliação e a formação acabam por ser processos que até podem estar interligados num fluxograma, mas que falham redondamente na capacidade de os mesmos serem 1+1= 3 ou até mais. Que naquele momento a pessoa sinta verdadeiramente estar a começar a desenvolver algo e como o vai fazer. Se há aspectos que o desporto pode transferir para as organizações ditas normais, é que a capacidade e a relação entre o treinador e o atleta, entre a avaliação e o treino, tem de resultar em algo mensurável, prático e útil; em que o atleta quase exige que o feedback seja efectivamente algo útil para saber o que alterar, como alterar e o que tem de desenvolver. O contrário implicará por parte do atleta uma avaliação em que o treinador, o seu líder, não está a contribuir para o seu desenvolvimento. Por norma, isso costuma ser o início do fim de algo.
Por isso, enquanto a construção e a aplicabilidade de um modelo de avaliação servir apenas para distinguir quem faz bem, ou os melhores dos piores, servirá apenas para criar um mapa onde se distribuem os colaboradores por categorias. A sua riqueza será maior quando o mesmo potenciar na pessoa o desejo de melhoria, de desenvolvimento de um plano efectivo de formação e de treino, quando criar no colaborador um melhor autoconhecimento e o mesmo fazer parte da viagem de melhoria. Esse sim, será um plano que potenciará melhores competências, compromisso, retenção dos melhores, que gostarão de trabalhar com líderes que os ajudem a melhorar e, com isto, elevar os resultados em diversos campos.
Por fim, isto também cria necessidades em quem avalia. Conseguir criar valor com o seu feedback, com os seus conselhos, com as suas orientações e directrizes não é tarefa fácil. Mas se não for assim, a avaliação pode muito bem ser “apenas” um mapa que não ajuda a alterar o território. Especialmente para um território melhor!
Este artigo foi publicado na edição de Maio (nº. 149) da Human Resources, nas bancas.
Caso prefira comprar online, tem disponível a versão em papel e a versão digital.