Susana Gonçalves, Abreu Advogados: «A advocacia continua a ser uma profissão atraente»
O mundo da advocacia ainda é visto como tradicional e formal, mas Susana Gonçalves descreve como «verdadeiramente fantástica» a capacidade que o sector teve para acompanhar uma «evolução tecnológica alucinante». Assim, compete em pé de igualdade no campeonato da atractividade enquanto empregador. E talvez até parta com “vantagem histórica”.
Por Ana Leonor Martins | Fotos Nuno Carrancho
Este ano, a Abreu Advogados está a comemorar 30 anos de actividade. E desde então muito mudou. Se recuarmos a 2001, ano em que Susana Gonçalves – que lidera a área de Gestão de Pessoas – começou a trabalhar, também numa sociedade de advogados, encontramos uma realidade em que «nenhum escritório tinha um departamento de Recursos Humanos organizado, não existia um plano de formação estruturado, a avaliação de desempenho era um processo discricionário, e a maioria dos estagiários e advogados entrava por decisão directa dos sócios. E era raro o advogado que não trabalhava 10 a 12 horas por dia», conta, assegurando que «hoje, o cenário é muito diferente ». Só podia ser, porque o “campeonato” está mais exigente e há muitas variáveis novas. A inteligência artificial é uma delas. Mas a responsável acredita que «estamos longe de um cenário em que a IA possa substituir profissionais altamente qualificados como os advogados». E duvida que «o ChatGPT passasse no exame de agregação à Ordem dos Advogados».
A liderança de Recursos Humanos na Abreu Advogados é um desafio recente. O que destaca dos primeiros meses?
Fui muito bem recebida por todos, e os objectivos que me propuseram atingir são interessantes e desafiantes. A Abreu tem um projecto de futuro, com especial foco na inovação, sustentabilidade e excelência, com o qual me identifico muito e para o qual quero contribuir. O que mais destaco nestes primeiros meses é a visão humanista e inovadora que as pessoas da Abreu me transmitem em cada projecto.
O que me fez aceitar este desafio é trabalhar numa organização que trate as pessoas como pessoas e não como números, que seja aberta a novas ideias e projectos, e que esteja disponível para aceitar a visão de que o investimento que fazemos nas pessoas tem um impacto directo e profundo no nosso negócio. Estou convencida de que a Abreu é esse local.
O que lhe foi pedido?
Foi-me pedido que contribua para o crescimento da Abreu e para a felicidade e bem-estar das suas pessoas. Os objectivos de curto-médio prazo passam pela atracção de talento, pela aposta na formação e desenvolvimento de todos os profissionais, e pelo desenvolvimento de boas práticas de Gestão de Pessoas.
O mundo da advocacia costuma ser visto como mais tradicional e formal, talvez pouco inovador e dinâmico. Ainda é assim?
Sim, existe essa ideia, e é natural que ainda exista. Tal como em diferentes áreas de actividade, o sector jurídico é um melting pot geracional, onde o tradicionalismo e o formalismo de gerações mais antigas convive com a inovação e o dinamismo de gerações mais novas.
Mas o motor de transformação no mundo da advocacia não é uma responsabilidade exclusiva das sociedades de advogados e dos seus profissionais. A estrutura e o funcionamento das instituições jurídicas, nomeadamente da Ordem dos Advogados, do Ministério da Justiça, dos Tribunais, etc., têm de assumir o seu papel na mudança, tornando-se elas próprias mais flexíveis, inovadoras e dinâmicas, contribuindo de forma clara e inequívoca para uma mudança de mentalidades no sector jurídico.
Também era comum os pais desejarem que os filhos seguissem estudos para serem médicos ou advogados. Eram talvez vistas como as profissões mais respeitadas. Isso ainda corresponde à realidade?
Acredito que sim. Dou comigo muitas vezes a recomendar aos filhos dos meus amigos o curso de Direito, quando estão com dúvidas. E costumo dizer, na brincadeira: “Para o médico e para o advogado, há sempre trabalho!” E continuarão a ser profissionais muito respeitados no mercado de trabalho.
Tenho ideia de que há muita gente a formar- se em Direito, mas muito menos a seguir essa via profissional. É porque o mercado não absorve todos, ou porque se “desencantam” com a profissão?
Direito é um dos cursos com mais saídas profissionais – e maior empregabilidade em Portugal –, não se restringe à advocacia. Existem licenciados em Direito que são juristas, magistrados, professores, políticos, jornalistas, etc., e ainda bem, porque o mercado da advocacia não teria capacidade para absorver anualmente todos os licenciados. Mas entre os que optam por fazer o estágio da Ordem dos Advogados, a maioria acaba por ficar no sector após a agregação.
E as faculdades, estão a preparar os profissionais de que o mercado precisa?
Algumas universidades já estão no bom caminho, adicionando aos seus programas curriculares matérias que vão muito além do Direito, enriquecendo as licenciaturas com conteúdos importantes para a formação dos advogados do futuro. Muitos cursos já incluem disciplinas de gestão, de idiomas ou informática, mas infelizmente, nem todas as universidades estão a seguir o mesmo caminho.
Que competências são fundamentais, hoje?
Obviamente que as competências técnicas são essenciais, porque um advogado tem de saber de Direito, essa é a sua competência core. Mas os advogados são profissionais que trabalham com clientes muito diversos. A necessidade de adaptação permanente obriga a que desenvolvam competências e conhecimentos que lhes permita explorar alguma versatilidade no exercício da sua profissão. Áreas como a informática, a negociação, a gestão financeira, a gestão de conflitos ou domínio de idiomas são alguns exemplos de competências que todos os advogados devem desenvolver. E que os cursos de Direito poderiam incluir nos seus programas.
Leia a entrevista na íntegra na edição de Junho (nº. 150) da Human Resources, nas bancas.
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