Trabalho em equipa: mito ou realidade
Quando ouvimos falar em equipas de elevada performance, frequentemente, é utilizado o exemplo das equipas de Fórmula 1. Diria que não é preciso ser especialista no tema para afirmar que só num registo de forte compromisso e trabalho em equipa é que mais de 20 pessoas conseguem mudar quatro pneus de um carro em menos de dois segundos.
Por Catarina Quintela, director of Corporate Solutions na Porto Business School
Então, o que vale a pena aprender com este exemplo? O que podemos extrapolar para a realidade corporativa? No trabalho em equipa, os membros colaboram de maneira que o todo seja maior do que a soma das partes. A sinergia maximiza as competências individuais e gera resultados superiores.
Existem objectivos bem definidos, claros e comuns. Todos trabalham em direcção ao mesmo fim, perfeitamente focados e alinhados. Voltemos ao exemplo da troca de pneus: todos têm tarefas claramente definidas e são responsáveis (e responsabilizados) por as fazer. Ninguém põe em dúvida que a pessoa A ou B não vai fazer. Existe confiança, porque ninguém tem dúvidas sobre o seu papel. Outro aspecto relevante é que a distribuição de tarefas é equilibrada e o trabalho é distribuído com base nas competências e disponibilidade dos membros. Não há a possibilidade de sobrecarregar alguns e de deixar outros inactivos, o que promove a eficiência. Quando algo corre mal e não se atinge o objectivo previsto é feito um debriefing a posteriori em que são identificadas as causas e responsabilidades e o que se poderia ter feito para evitar o sucedido. Toda a equipa é envolvida e todos discutem soluções e tomam decisões com base nos contributos.
Parece simples, mas não é… Caso contrário, não ouviríamos tantas queixas nas empresas referindo a existência de silos nas organizações e a ausência de trabalho em equipa.
A questão que se coloca é: estamos a falar de trabalho em equipa ou estamos à espera de que uma parte das pessoas faça o trabalho que não lhes compete, suprimindo ineficiências internas, nomeadamente das lideranças, na definição do trabalho de cada um?
Frequentemente, o que chamamos de trabalho em equipa é esperarmos que o trabalho apareça feito por aqueles que frequentemente já o fazem sobrecarregados. Valorizamos o trabalho em equipa, esquecendo que nem todos contribuem para o resultado. Daí o “mito”. Assumimos que é muito bom trabalhar em equipa (e é!) e negligenciamos que os benefícios só aparecem se houver um contributo efectivo (ainda que diferente) de todos para o cumprimento do objectivo.
Caso contrário, aquilo que chamamos de trabalho em equipa pode gerar mais prejuízos do que benefícios, tais como: reduzida responsabilização individual, desmotivação, frustrações e ressentimentos dentro da equipa devido à percepção de injustiça, diminuição da produtividade, aumento dos conflitos, ineficiência e ineficácia.
Sabendo que, nas empresas, estes prejuízos podem afectar os resultados do negócio, o que pode ser feito para superar estes desafios?
Há três aspectos cruciais que devem ser tidos em consideração, a saber:
- Desenvolver as lideranças de forma que promovam uma comunicação clara, transparente e fluida, nomeadamente sobre os objectivos e missão da mesma
- Definir papéis claros e responsabilidades, o que ajuda a garantir que todos estão conscientes do que se espera deles
- Promover uma cultura de feedback e accountability: O feedback contínuo, tanto positivo quanto construtivo, ajuda a manter o compromisso e a responsabilidade. Este deve ser regular e para além dos momentos formais que a empresa disponibiliza.
O trabalho em equipa é, de facto, muito importante para o sucesso da organização, como demonstram exemplos de equipas altamente eficazes. No entanto, quando mal implementado, torna-se um “mito”, onde a ilusão da colaboração mascara desequilíbrios de esforço e falta de responsabilidade. Para que o trabalho em equipa seja uma realidade e não um ideal inatingível, é crucial que as empresas implementem estruturas claras, atribuam responsabilidades e promovam uma cultura de comunicação e accountability. Assim, as organizações poderão usufruir dos benefícios do trabalho em equipa, evitando armadilhas que podem prejudicar tanto o desempenho individual quanto o colectivo.