Trump, reindustrialização e tarifas: oportunidades para Portugal e o talento nacional

Por Valter Ferreira, especialista europeu em tecnologia urbana e cidades inteligentes

As primeiras medidas da presidência de Donald Trump trouxeram uma agenda económica que promete redefinir o mercado de trabalho global. A reindustrialização dos Estados Unidos e a aplicação de novas tarifas sobre produtos europeus colocam desafios às economias e empresas, mas também abrem oportunidades para os países que souberem adaptar-se. Portugal, com a sua posição estratégica no eixo atlântico, pode destacar-se pela resiliência e inovação, aproveitando estas mudanças para repensar a gestão de pessoas e desenvolver o talento nacional.

A estratégia norte-americana de reindustrialização procura trazer a produção de volta para os Estados Unidos, com o objectivo de criar empregos industriais e fortalecer a economia local. Contudo, esta abordagem vai além das fábricas tradicionais, exigindo competências técnicas especializadas e uma transição para tecnologias avançadas. A automação e a inteligência artificial, pilares desta política, estão a substituir tarefas manuais por processos mais eficientes, revolucionando o perfil das competências necessárias.

Estas transformações têm implicações globais. Para a Europa, e em particular para Portugal, implicam a necessidade de adaptação às novas exigências do mercado. Inovação, formação contínua e retenção de talento tornam-se fatores críticos para a competitividade das empresas num cenário global em mudança.

Portugal enfrenta estes desafios com particularidades próprias. Sectores como os combustíveis minerais, máquinas e aparelhos, produtos químicos, plásticos, borracha e têxteis, que representam uma parte significativa das exportações para os Estados Unidos, poderão ser directamente impactados pelas tarifas. Contudo, apesar da agenda proteccionista de Trump, existem oportunidades para Portugal se posicionar como uma base estratégica para empresas norte-americanas que procuram aceder ao mercado europeu. A combinação de localização privilegiada, infraestruturas como o porto de Sines e relações históricas com os EUA pode criar dinâmicas económicas, beneficiando o desenvolvimento do talento nacional.

O eixo atlântico desempenha um papel fundamental nesta estratégia. A ligação histórica e cultural com os Estados Unidos, aliada às vantagens geográficas, posiciona Portugal como uma ponte natural entre os dois continentes. Esta condição é particularmente relevante para a gestão de recursos humanos, abrindo portas para a mobilização, formação e retenção de talento global, enquanto reforça as oportunidades no mercado transatlântico.

Mais do que uma questão económica, atrair investimento norte-americano representa a oportunidade de construir ecossistemas de talento assentes na inovação e na sustentabilidade, consolidando a posição de Portugal num mundo em transformação.

Neste contexto, o talento português desempenha um papel central. A automação e a inteligência artificial, que já estão a transformar o mercado de trabalho, exigem trabalhadores com competências actualizadas e adaptáveis. O investimento na formação digital e tecnológica é urgente. De acordo com o World Economic Forum, 85% das empresas globais estão a aumentar os seus investimentos em automação, sublinhando a importância de uma força de trabalho qualificada e preparada para responder às novas exigências.

As empresas portuguesas também precisam de repensar as suas estratégias de gestão de talento. A atracção e retenção de profissionais requerem modelos de trabalho flexíveis, formação contínua de excelência e planos de carreira que alinhem os objectivos empresariais às aspirações individuais. Estas iniciativas são indispensáveis para competir num mercado global cada vez mais exigente e tecnológico.

Paralelamente, a diplomacia económica tem um papel crucial. Portugal deve tirar partido da sua relação histórica com os Estados Unidos para negociar acordos bilaterais que favoreçam as empresas nacionais e o desenvolvimento do talento português. Programas de intercâmbio, projectos de formação conjunta e incentivos ao investimento estrangeiro são formas de consolidar a posição do país como parceiro de confiança no eixo atlântico.

O sector de recursos humanos assume uma posição estratégica nesta transformação. Compete-lhe liderar a adaptação das empresas ao novo contexto global, promovendo culturas organizacionais orientadas para a aprendizagem contínua e a inovação. Além disso, o sector deve identificar oportunidades de colaboração transatlântica que maximizem o potencial do talento nacional, enquanto cria ambientes de trabalho que valorizem o bem-estar, a sustentabilidade e o equilíbrio entre vida profissional e pessoal.

Apesar das incertezas associadas às políticas proteccionistas dos Estados Unidos, Portugal tem uma oportunidade única para se afirmar como líder na transição para um mercado de trabalho mais digital e sustentável. Ao apostar no talento nacional e ao posicionar-se como porta de entrada para o mercado europeu, o país pode transformar desafios em vantagens competitivas, prosperando num futuro em rápida transformação.

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