Um Chief Transformation Officer chamado COVID-19
«No âmbito da gestão, pouco interessa a dimensão ou a extensão da crise provocada pelo vírus. O sucesso duma organização no pós-pandemia vai depender essencialmente da capacidade dos seus líderes de atrair, desenvolver e reter os seus talentos.»
Por José Bancaleiro, managing Partner da Stanton Chase Portugal – Your Leadership Partner
Tal como já aconteceu com muitas outras crises, a COVID19 vai passar! Por muito dramático que esteja a ser o seu impacto social e económico, dentro de alguns meses ou anos passará ser uma recordação cada vez mais difusa e menos ameaçadora. O mundo, os negócios e as organizações retomarão a sua evolução “normal”, mesmo que seja um “novo normal”.
Significa isto que eu estou a desvalorizar a violência deste fenómeno contundente e inesperado que se abateu sobre todo o planeta? Definitivamente, não! Todos já nos apercebemos que, do ponto de vista de saúde pública, já existiram outras epidemias bem mais perigosas e ameaçadoras que esta, mas a verdade é que, provavelmente, nenhuma outra provocou uma crise sócio-económica com um impacto tão profundo e tão dramático na vida das pessoas, organizações e países.
E quanto às suas consequências futuras? Há quem defenda que está crise vai ter um efeito revolucionário na forma de gerir as empresas e na forma de relacionamento humano. Dão como exemplo, as novas formas de trabalho (remoto), o medo no convívio social e a desumanização provocada pelas tecnologias.
Eu acho que quem (com todo o direito) assim pensa, só o faz porque tem andado muito desatento. Na minha opinião a crise da COVID-19 irá ter um efeito de grande acelerador de tendências na gestão das organizações e nas relações entre pessoas que já se tinham iniciado há muito e já eram bem evidentes. Há, aliás, quem diga que a pandemia foi o “CTO – Chief Transformation Officer” mais eficaz que até hoje surgiu nas empresas. Conseguiu fazer em três meses o que muitos dos mais bem pagos CTOs do mundo não conseguiram fazer em cinco anos.
De facto, não era preciso estar muito atento para perceber que a tendência para o trabalho remoto já estava em crescimento acelerado. O Zoom, por exemplo, já existia e estava em expansão há mais de três anos. A COVID19 só veio dar-lhe um crescimento exponencial.
Este é um fenómeno que veio para ficar, não só porque as equipas remotas tendem a ser mais produtivas que as equipas de escritório, mas, principalmente, porque se sabe que as novas gerações preferem trabalhar remotamente, mesmo que isso signifique uma redução salarial.
O trabalho remoto liberta as pessoas de ter de sair duma reunião para ir buscar os filhos à creche, de andar em filas trânsito ou transportes públicos apinhados ou ainda de ter de pagar uma renda elevada num cubículo no centro duma grande cidade. Por outro lado, um escritório físico significa, em muitos casos, limitações geográficas de recrutamento. Na próxima década, uma empresa que queira atrair talentos não pode deixar de ter esta realidade em conta. Quem não o fizer terá, seguramente, dificuldades de atracção e retenção de talentos.
Há também quem continue a confundir a utilização de tecnologias com desumanização. A tecnologia não é um fim por si só. É um meio que, se bem utilizado, pode ser um “enabler” das experiências dos colaboradores e dos clientes. Seja como for, pensar que se pode contrariar o uso de tecnologias é entrar na contramão da história. Uma das competências fundamentais dos profissionais de RH no futuro é o domínio das tecnologias.
Do lado das organizações é importante referir que, mesmo em plena crise, não podem, por medo ou por estarem confusas, parar de pensar e planear estrategicamente. Sabe-se que são as empresas que melhor se adaptam às mudanças que afastam as que não têm a capacidade de o fazer atempadamente. A Kodak, a Nokia e o Myspace são, entre muitos outros, exemplos paradigmáticos disso. O receio ou a recusa de transformação pode ser mais fatal que a COVID19.
A atracção, desenvolvimento e retenção de talentos vai ser um dos aspectos estratégicos fundamentais no pós- pandemia. Como dizia David Whirwam, CEO of Whirlpool Corporation “o que me acorda no meio da noite não é o que pode acontecer na economia ou o que nossos concorrentes farão a seguir. O que me preocupa é saber se temos a capacidade de liderança e o talento necessário para implementar as novas e mais complexas estratégias globais”
No âmbito da gestão, pouco interessa a dimensão ou a extensão da crise provocada pelo vírus. O sucesso duma organização no pós-pandemia vai depender essencialmente da capacidade dos seus líderes de atrair, desenvolver e reter os seus talentos.
Pense nisso!