Um em cada quatro médicos internos tem sintomas graves de burnout e mais de metade está em risco de desenvolvê-lo

Um em cada quatro jovens médicos apresenta sintomas graves de burnout e 55,3% está em risco de desenvolver a síndrome, revela um estudo da Ordem dos Médicos.

 

O mesmo estudo dirigido especificamente a internos refere que 35,5% iniciou apoio psicológico ou psiquiátrico durante o internato.

Quase 65% dos internos inquiridos encontra-se num nível de exaustão emocional grave, 45,8% num nível elevado de despersonalização/desumanização e 48,1% apresenta elevada diminuição da realização profissional, adianta o estudo, realizado pelo Conselho Nacional do Médico Interno (CNMI).

O objectivo do estudo, que decorreu entre Agosto e Setembro de 2023 e contou com 1.737 respostas (taxa de resposta de 16,9%), visou avaliar o burnout nos internos e a sua associação com variáveis socioprofissionais.

Comparando com o último estudo feito em 2016, os internos têm uma prevalência de burnout grave (24,7%) mais de três vezes superior aos restantes médicos (7%), e também têm níveis superiores equiparando com a média de estudos realizados noutros países (22,9%).

«Os médicos internos há mais tempo no internato, que consideram como mais desequilibrada a relação entre trabalho e vida pessoal, com menos autonomia no seu trabalho e que realizam mais horas extraordinárias apresentam níveis superiores de burnout», salienta o estudo.

A percentagem de internos totalmente envolvidos no seu trabalho é de apenas 5,3%, uma percentagem cerca de quatro vezes inferior à de outros países. Apenas 16,5% considera a relação entre a vida pessoal e profissional equilibrada.

Há maior percentagem de médicos com sintomas de burnout na região Norte (28,6%), seguindo-se Lisboa e Vale do Tejo (23,7%) e Centro (22,1%).

É na especialidade de Anestesiologia que se encontram os níveis mais elevados (32,4%), seguida de Cirurgia Geral (29,7%), Medicina Interna (28,9%), Medicina Intensiva (26,2%) e Ginecologia/Obstetrícia (22,2%).

Segundo o estudo, 84,8% dos inquiridos realiza horas extraordinárias, com uma média de trabalho semanal de 52,8 horas, o equivalente a cerca de 2,5 meses de trabalho extra por ano.

Mais de metade (55,1%) faz turnos mensais com duração superior a 12 horas, 62,1% realiza trabalho noturno e 55,9% tinha dois ou menos fins de semana livres por mês.

A elevada carga horária associada ao trabalho e estudo autónomos e prossecução de objectivos curriculares foi o principal tema elencado na pergunta do questionário sobre condições laborais.

Em declarações à agência Lusa, o presidente do CNMI, José Durão, considerou os resultados deste primeiro estudo nacional «bastantes preocupantes».

«Tínhamos a sensibilidade de que havia muitos internos com a sua saúde mental ameaçada, com muitos deles já a ter de recorrer ao psicólogo ou psiquiatra, ou mesmo a medicação, que acusavam muitas horas de trabalho, poucas horas de sono», afirmou.

Porém, «não esperávamos descobrir que praticamente 25% (…) estivessem em burnout severo». Questionado se esta situação se deve ao trabalho nos serviços de urgência, José Durão referiu que será «uma das explicações», mas considerou que o problema «é multifactorial».

«Estamos a falar de várias situações, em várias especialidades, em várias regiões e, portanto, é difícil apontar uma só razão», mas, observou, «não é por acaso que os níveis mais elevados de burnout são detectados em especialidades hospitalares, nomeadamente médicas e cirúrgicas, com carga de horário de urgência também mais acentuado».

José Durão observou alguns fazem «dois, três turnos de 24 horas de urgência numa só semana, o que não só não é legal, nem está previsto nos seus programas de formação, como, obviamente, qualquer pessoa com bom senso percebe que não pode ser bom para a saúde mental das pessoas».

«Estamos a falar da geração que vai substituir nos próximos anos os médicos mais velhos que irão sair. Em que condições é que essas pessoas vão chegar ao início da sua carreira e com que vontade é que têm de continuar a trabalhar maioritariamente no Serviço Nacional de saúde, onde as condições também são piores e que mais facilitam este tipo de situação. Portanto, isto é muito, muito grave», lamentou.

O CNMI defendeu a criação de tempo protegido no horário de trabalho para estudo autónomo, a necessidade de revisão e uniformização das grelhas de avaliação do internato médico, promovendo a valorização de competências clínicas, e a agilização de apoio psicológico e/ou psiquiátrico aos internos em todas as instituições de formação.

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