“Um líder tem que ter visão global”

A crise económica e o desemprego são ameaças ao negócio do head hunting. Razões que levaram a Boyden a alterar a sua estratégia, focando-se na aproximação ao cliente. Saiba os resultados.

Por Maria João Vieira Pinto

Trina Gordon é CEO da Boyden World Corporation e foi, em 2008, reconhecida pela “BusinessWeek” como um dos 50 profissionais de recrutamento mais influentes a nível mundial. De resto, um caso raro de liderança nos Recursos Humanos, no feminino! E é a própria que, em entrevista à Marketeer, confessa que para uma mulher ser líder «tem que ser excelente comunicadora, ter uma boa capacidade de relacionamento, paciência, persistência, um grande entendimento do cliente, ser flexível e capaz de influenciar pessoas de forma a que a respeitem». Maiores competências do que as exigidas para um homem!

E Trina Gordon sabe do que fala. Antes de fazer parte da equipa da Boyden, foi partner na William H. Associates, Inc., tem vasta experiência nas áreas de consultoria de gestão e executive search em instituições internacionais do sector público, bem como em empresas do sector privado e organizações de direito privado, tendo nos últimos 10 anos conduzido processos de recrutamento para Conselhos de Administração, cargos CEO e COO, e trabalhado de forma recorrente com organizações multinacionais! Uma corrida de fundo para uma mulher que gosta, ela própria, de correr longas distâncias, quase diariamente.

Diz que nunca se enganou nas suas escolhas e conselhos. E que, quando tem em mãos a tarefa de procurar um líder, há características básicas a que não deixa de olhar: «Paixão, um sentido de curiosidade muito forte, alguém que queira continuar a aprender e que consiga ver oportunidades mesmo que estejam fora da sua zona de conforto, que não tenha medo de arriscar, que não receie cometer erros.»

HR: O que explica que, num ano de crise económica geral, empresas de executive search como a Boyden continuem a crescer?

Trina Gordon: A Boyden tem crescido a nível global mesmo num ano de recessão, em resultado da estratégia que adoptámos. Iniciámos e estamos a desenvolver um trabalho de aproximação ao cliente.

Em cada passo que damos, em todos os níveis de cada processo, temos sempre o cliente no cen­tro. E isto é diferenciador na forma de construir relações de negócios. Por que é que é único? É único porque conseguimos uma combinação, um cruzamento entre empresas globais, este­jam elas em Lisboa ou Paris – temos parceiros em todo o mundo – com conhecimentos es­pecíficos de diferentes sectores. Além de que temos ainda ofertas a nível de tecnologia, segu­rança ou saúde que são aplicadas localmente de acordo com as necessidades de cada cliente.

HR: Mas é assim tão diferente de outras em­presas a trabalhar neste sector?

Trina Gordon: Penso que sim. A Boyden é uma organiza­ção de parceiros; uma marca privada que pro­cura sempre a melhor aproximação e o melhor tratamento do cliente. Alguns dos nossos cole­gas estão no sector público, o que significa que por vezes se está mais focado nos objectivos, nos resultados e isso pode resultar em maior volume de trabalho para se conseguir esses mesmos resultados. Nós, por outro lado, tra­balhamos como parceiros, somos parceiros na gestão do próprio negócio do cliente. Não es­tamos atrás, nos bastidores. Somos o parceiro mais empenhado nesse relacionamento e ten­do sempre em conta essas equipas globais com conhecimentos locais, pelo que sentimos que esta é uma combinação muito forte.

HR: Conhecimento global mas actuação lo­cal, é isso?

Trina Gordon: Exactamente.

HR: E essa é uma estratégia vencedora!

Trina Gordon: Acreditamos que esta é uma estratégia vencedora. Vimos a recessão iniciar-se em 2008, avançar em 2009 e chegar a 2010, e os nossos resultados foram muito fortes em 2010 e estão a sê-lo em 2011. O próximo ano é outro ano incerto, mas iremos manter a nossa estra­tégia, o foco no cliente, e alargar uma platafor­ma de colaboradores extra que não fazem outra coisa a não ser pesquisa. Acreditamos que esta é a melhor combinação para os nossos clientes.

HR: Que objectivos tem para 2012?

Trina Gordon: Os meus objectivos estão bem definidos: continuar a expansão nos nossos mercados­-chave, ter a certeza que os escritórios-chave espalhados pelo mundo podem ajudar no de­senvolvimento de outros mercados, como Portugal e Espanha, e de alguns mercados emergentes como Ásia, Brasil, Índia, China. Queremos continuar a crescer e aprofundar que saírem desta recessão apenas estarão inte­ressados em quem tiver as melhores compe­tências para os poder ajudar em determinado mercado. E podemos estar a falar de necessi­dades muito específicas, como ter o melhor fi­nanceiro para gerir um negócio energético em S. Paulo, por exemplo.

HR: Os pedidos dos vossos clientes muda­ram, desde o início desta recessão?

Trina Gordon: Sem dúvida. A principal mudança foi constatar que nos começaram a dizer: “Não nos interessa quais são as vossas melhores compe­tências a nível global. O que têm é que nos en­tregar resultados.” Ou seja, os partners, agora, têm que ter capacidade para perceber necessi­dades muito específicas, para ter conhecimen­tos muito precisos, e trabalhar em conjunto com o cliente de forma a conseguir resultados. Além disso, o cliente hoje espera que lhe en­treguemos qualidade num período de tempo considerado eficiente!

Se têm importantes oportunidades de mar-keting nos seus mercados, procuram-nos no sentido de lhes indicarmos uma solução. Por­que podem não saber onde está o talento ou como começar uma nova estrutura a partir do zero no Vietname… O que procuram em nós é que respondamos com esse conhecimento lo­cal, seja na China, Tailândia ou Vietname.

Ou seja, temos que responder com todo o nosso conhecimento global que se cruza com a competência local. É preciso ter um nível de experiência bastante aprofundado, que per­mita responder de forma bastante rápida e com excelência.

HR: Ou seja, querem resultados!

Trina Gordon: Querem resultados.

HR: O modelo de head hunting, de uma forma geral, está portanto a mudar!

Trina Gordon: Está a mudar. E se não se tiver essa percep­ção e capacidade para construir uma equipa em conjunto com o cliente, com essas caracterís­ticas e competências, se não se conseguir obter resultados com qualidade, o cliente irá procu­rar noutro lado qualquer.

HR: O facto do desemprego continuar a au­mentar é uma ameaça ao negócio de empre­sas como a Boyden?

Trina Gordon: Quando os clientes são desafiados, nós so­mos desafiados. Mas o que percebemos foi que quando um cliente tem necessidades específi­cas, temos que conseguir responder-lhe

Sabemos, neste momento, que tanto Por­tugal como Espanha têm necessidades especí­ficas. O que procuramos é ajudar empresas por­tuguesas em Angola ou empresas espanholas que queiram entrar em mercados emergentes. Se há problemas particulares de mercado, como crises económicas ou condições laborais, temos que encontrar formas de ajudar esses clientes.

HR: Acredita que os departamentos de Re­cursos Humanos das empresas ganharão maior relevo, maior dimensão, mais força?

Trina Gordon: Penso que um bom departamento de Re­cursos Humanos que seja parceiro do negócio é chave fundamental para que as empresas con­sigam uma performance de sucesso. Se não se valoriza o talento, então pode-se vir a ter um enorme problema…

HR: … mas nem sempre esses departamentos são vistos dessa forma!

Trina Gordon: Não são, de facto. Há uma co-relação di­recta entre as empresas com melhor desem­penho e as que mais valorizam os seus cola­boradores, os Recursos Humanos, enquanto verdadeiros parceiros para atingir a liderança. Porque aconselham sobre a forma como as pes­soas interferem no negócio, como afectam os clientes… porque há uma diversidade imensa de necessidades por parte dos consumidores. Não é em todo o lado, mas os verdadeiros líde­res, visionários, certificam-se que constroem uma cultura e que o departamento de RH fun­ciona como verdadeiro parceiro.

HR: Há características que permitam perce­ber que determinado líder é um visionário?

Trina Gordon: Há. Um líder visionário tem traços tangí­veis, capacidades que uma companhia pode precisar para determinado sector ou função mas, no geral, um líder de futuro é alguém que consegue ter uma visão global. Tem que con­seguir trazer inovação para a empresa, tem que saber motivar, inspirar, guiar, por vezes in­fluenciar as pessoas a atingir os seus objectivos, tem que ser eticamente respeitado e fomentar uma cultura de forma a tornar a companhia num “great place to work”, acreditando e tra­zendo talento para a organização.

HR: Isso é na fase em que já é líder. Mas quando está a recrutar alguém, consegue perceber se tem essas características?

Trina Gordon: Parte disto são capacidades inatas. Eu, por exemplo, quando faço esse trabalho procuro encontrar paixão, um sentido de curiosidade muito forte, alguém que queira continuar a aprender e que consiga ver oportunidades mes­mo que estejam fora da sua zona de conforto, que não tenha medo de arriscar, que não re­ceie cometer erros. Depois, há sempre alguma coisa na presença física que se destaca. Não é o preço do fato mas a atitude, o dinamismo! A parte mais engraçada em encontrar estas pes­soas – que nem sempre são fáceis de encontrar – é perceber que nos podemos sentar com elas e ajudá-las a dar o seu próximo passo, sabendo de antemão que aquele indivíduo vai ser um líder.

HR: Teve sempre facilidade em encontrá-los?

Trina Gordon: Nem sempre.

O nosso negócio parece simples mas, na verdade, nem sempre o é. Nem sempre é fei­to de relacionamentos mas da capacidade para perceber competências, conhecimentos, ca­racterísticas. E mesmo que algumas pessoas os tenham, é preciso perceber até que ponto se encaixam em determinada circunstância, em determinado perfil ou função. O que implica que temos que conhecer muito bem a cultura do cliente e saber que um líder nem sempre é bom em qualquer empresa!

HR: Já se enganou?

Trina Gordon: Até à data, ainda não.

HR: Há alguma diferença determinante en­tre liderança masculina e feminina?

Trina Gordon: Diria que a liderança não tem género. Mas para uma mulher ser líder tem que ser uma ex­celente comunicadora, tem que ter uma boa capacidade de relacionamento, paciência, per­sistência, um grande entendimento do cliente, ser flexível e ter capacidade para influenciar pessoas de forma a que a respeitem.

HR: Um trabalho ainda duro, portanto!

Trina Gordon: Mais exigente que o dos homens.

HR: Mas olhando para as empresas consta­ta-se que continua a haver departamentos – como os recursos humanos ou o marketing – onde o peso das mulheres é proporcional­mente maior do que noutras áreas. Por que razão? Há profissões mais femininas e ou­tras mais masculinas?

Trina Gordon: Não sei se ainda continua a haver profis­sões mais masculinas que outras. De uma for­ma clara, as mulheres podem ser excelentes engenheiras, mas o que é facto é que ainda não há empresas de engenharia com presidentes no feminino. Por vezes, essa escolha tem que ver com o sector em si, outras com a cultura da própria companhia.

HR: Há, ou não, skills masculinos para de­terminadas funções?

Trina Gordon: Com certeza. Se pensarmos numa empresa do sector energético ou numa empresa trans­formadora, por exemplo, será mais provável que ascenda a CEO alguém que tenha um ba­ckground em Engenharia Química. Já há muitas mulheres a destacarem-se em Engenharia, mas não penso que, aqui, o pipeline de caminhada até ao topo já tenha tido um grande progresso.

Ainda não há assim tantas mulheres nos cargos de CFO, em direcções de marketing ou de vendas. Nos RH continua a haver por uma questão histórica, porque durante muito tem­po as mulheres trabalharam nesta área.

HR: Quando um cliente contacta a Boyden porque precisa de encontrar um CEO, cos­tuma indicar se procura homem ou mulher?

Trina Gordon: Alguns clientes pedem, outros não. Neste último caso, a responsabilidade de “entregar o envelope” com a proposta de nome é só nossa.

HR: O que faz de pessoas como Bill Gates ou Steve Jobs líderes carismáticos?

Trina Gordon: São visionários.

Steve Jobs foi o exemplo de alguém que percebeu perfeitamente o que era o seu negócio e tinha como objectivo fabricar produtos que entregassem algum benefício aos consu­midores, aos utilizadores. E as pessoas segui­ram-no. Seguiram-no porque é um exemplo de líder visionário, que cumpre!

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