Utopias para organizações realistas
Por Carlos Sezões, Managing Partner da Darefy – Leadership & Change Builders
«O progresso é a concretização de utopias»
Oscar Wilde
Rutger Bregman, historiador e escritor holandês, é um dos pensadores europeus mais interessentes destes nossos tempos. Publicou, até hoje, quatro livros sobre história, filosofia e economia, interligando conceitos de forma criativa e irreverente. Um dos seus livros mais celebrados, Utopia para Realistas, tornou-se um best-selller e desencadeou debates ético-filosóficos… muito práticos e aderentes à realidade. Com exemplos históricos e investigações baseadas em dados, demonstra o enorme salto qualitativo (e quantitativo) das nossas vidas, ao longo dos últimos 200 anos, nas várias sociedades a nível global – da saúde e longevidade à educação, dos recursos materiais e conforto à liberdade de que hoje desfrutamos.
Nessa visita guiada pela História da criação de riqueza e do progresso humano, relembra que ter abundância alimentar, viver em média para além dos 80 anos, conseguir o fim da escravidão, viver em democracia, com eleições e alternância de poder, já foram consideradas utopias. Este livro é um desafio a que regressemos ao idealismo de tempos passados e a sua premissa é simples: está na hora de voltarmos a pensar em termos utópicos e de lutarmos para tornar as utopias realidade. De ter um motivo para nos levantarmos da cama todas as manhãs, com vista a construir um mundo melhor – que vá além de 0,5% do PIB de e de um aumento do consumo per capita. Quais poderão ser essas utopias? O autor adianta (e defende) algumas. De um rendimento básico para todos a uma semana de trabalho de 15 horas, de um mundo sem barreiras e fronteiras à eliminação completa da pobreza. Adianto eu outras: numa perspectiva de exploração dos nossos limites, chegar a Marte ou estabelecer uma base humana permanente noutro planeta.
Passemos da perspectiva “macro” para as realidades mais “micro”. Na óptica das organizações pós-2020, a braços com escassez de talento e com exigências inéditas a nível da agilidade, flexibilidade e bem-estar, este debate sobre missão e propósito é incontornável. Nos muitos estudos de satisfação, engagement e compromisso que já conduzi nos últimos anos, nas organizações mais diversas, a questão da compensação financeira raramente se assumiu como o factor essencial, pela positiva ou pela negativa. As dimensões do propósito, da missão, o significado do trabalho (e consequente contributo individual e colectivo), a cultura de gestão e liderança e outras dimensões como a integração pessoal-profissional foram, frequentemente, as questões-chave para responder à pergunta: o que faz cada um começar o dia com energia e vontade de fazer mais e melhor? Nos esforços de transformação organizacional, a psicologia positiva traz parte das respostas: relembrar o ADN, as forças, o carácter, a história e os maiores sucessos, o sentido de missão, contribuem, de forma clara, para uma maior motivação e empenho das pessoas. E a partir dessa análise, construir uma visão de futuro. Tal reforçará duas percepções essenciais:
- A “vida com prazer”: perceber como as experiências óptimas, caracterizadas por emoções positivas e pela imersão nas tarefas executadas, podem conferir maior satisfação, auto-estima e desempenho superior;
- A “vida com significado”: analisar como o sentido de missão e de pertença e a convicção no papel assumido, podem ajudar cada um a encarar as suas actividades com entusiasmo e sentido de continuidade (percepcionando que se está a contribuir para algo que transcende o indivíduo e que realmente vale a pena).
Bem sei que nem todas as organizações terão missões tão inspiracionais (e recursos para as concretizar) como uma Google (organizar e tornar acessível a informação a nível global), uma Tesla (criar a empresa automóvel mais atractiva do século XXI) ou uma Nike (trazer inovação e inspiração a todos os atletas do mundo). Mas, seja qual for a sua actividade, poderão procurar fazer a diferença e gerar impactos extraordinários nos seus Clientes e na sua Comunidade, atingindo metas antes consideradas utópicas. E trazer os seus colaboradores a bordo dessa missão e dessa utopia, fazendo, como afirma, Rutger Bregman, “o caminho do ideal para o real”.