48: é o número de dias, num ano, que uma mulher trabalha sem auferir retribuição
Assinala-se, hoje, 8 de Março, o Dia Internacional da Mulher.
Por Ana Rita Ferreira, advogada na Dower Law Firm
A simbolização desta data remonta a 8 de Março de 1917. Nesse dia, cerca de 90 mil operárias russas percorreram as ruas, reivindicando melhores condições de trabalho e de vida. Esse evento, que ficou conhecido como “Pão e Paz”, deu origem ao Dia Internacional da Mulher, que veio a ser instituído pela Organização das Nações Unidas em 1975.
Com a comemoração desta data, vêm sendo, ano após ano, assinaladas as disparidades de género e a discriminação ainda existentes.
Na verdade, quase 50 anos depois, não foi ainda atingida a tão almejada igualdade.
Abunda a legislação quer internacional, quer nacional, sobre o Princípio da Igualdade de remuneração entre mulheres e homens em situações de trabalho igual ou de igual valor. Em Portugal, este princípio encontra-se plasmado, entre outros, na Lei n.º 60/2018, de 21 de Agosto.
Apesar disso, é ainda uma realidade bem presente a desigualdade existente entre mulheres e homens, no que concerne ao mercado de trabalho, continuando aquelas a ser grosseiramente prejudicadas, essencialmente a nível remuneratório.
É inegável que a participação das mulheres no mercado de trabalho veio crescendo significativamente, não existindo, actualmente, diferenças em relação à dos homens. Aliás, o que se verifica é que as mulheres vêm apresentando níveis de formação académica superiores. Ainda assim, permanece o estigma da remuneração do trabalho das mulheres ser inferior ao dos homens.
Sem embargo, é irrefutável que vamos assistindo a uma diminuição da disparidade salarial de género. Em 2010, foi de 17,9%. Em 2021, de 13,1%. E estes 13,1% são a percentagem obtida quando se considera apenas o salário-base. Isto porque, quando se considera o ganho, isto é, todas as restantes componentes remuneratórias, além do vencimento-base, nomeadamente as variáveis, a discrepância ascende aos 15,9%.
Em termos numéricos, significa isto que, pelo mesmo trabalho, as mulheres ainda recebem, em média, menos 150,30 euros do que os homens. E se este número já é chocante o suficiente, a verdade é que o mesmo aumenta à medida que também as qualificações e as responsabilidades do cargo crescem. A título de exemplo, as mulheres em cargos de chefia auferem cerca de 593,30 euros a menos do que os homens. Já no que respeita a trabalhadores com ensino superior, a diferença é de 504,90 euros, em desfavor das mulheres.
Estes são os últimos dados disponíveis na edição de 2023 do Barómetro das Diferenças Remuneratórias entre Mulheres e Homens do Gabinete de Estratégia e Planeamento do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.
Em suma, existe uma diferença salarial entre homens e mulheres correspondente a 48 dias de trabalho. Por outras palavras, é como se as mulheres, durante o ano, trabalhassem 48 dias de trabalho sem auferirem qualquer vencimento pelo trabalho prestado.
Assim, é premente que sejam adoptados mecanismos que promovam a efectiva igualdade remuneratória entre mulheres e homens, não só ao nível do salário-base, mas igualmente do ganho, ou seja, de todas as componentes que acrescem ao vencimento-base.
Com este desidrato, foi criada a NP 44588:2023 Sistema de gestão para a igualdade remuneratória entre mulheres e homens, que visa contribuir para a eliminação da discriminação e para a promoção da igualdade remuneratória entre mulheres e homens, no âmbito do trabalho por conta de outrem.
São estabelecidas nesta norma os requisitos e as orientações necessários para as empresas implementarem um sistema de gestão para a igualdade remuneratória entre mulheres e homens, contribuindo para a eliminação da discriminação remuneratória em função do sexo e a promoção da igualdade na remuneração entre mulheres e homens, no âmbito do trabalho por conta de outrem. Pode ser utilizada para efeitos de certificação ou como um referencial para criação de um sistema de gestão da igualdade remuneratória entre mulheres e homens.
Seja através desta norma ou de outro mecanismo, é urgente continuar a trabalhar-se na extinção da desigualdade remuneratória entre mulheres e homens.
Para já, esta igualdade é apenas um mito, que ainda não passou a realidade. Deseja-se que no próximo ano, aquele em que se assinalam 50 anos sobre a comemoração do dia da mulher, a conclusão possa ser diferente.