Excesso de trabalho mata a produtividade
As organizações tendem a sobrecarregar os colaboradores na esperança de maximizarem o seu desempenho. Mas os custos do excesso de trabalho estão bem documentados. Assim, como podem as organizações evitá-lo?
Por Sheila Dodge, Don Kieffer e Nelson P. Repenning, na MIT Sloan Management Review
Quem trabalha numa organização sabe o que é ter demasiado que fazer e poucos recursos para tal. As ferramentas digitais de comunicação e colaboração foram criadas para tornar tudo mais fácil de gerir, mas o acesso à tecnologia nem sempre resolve a base dos problemas: um mau design estrutural e comportamentos organizacionais enraizados.
Os custos do excesso de trabalho estão bem documentados: as pessoas ficam menos criativas, menos produtivas e mais propensas a ficar doentes, a falhar prazos e objectivos e a deixar a organização para ir trabalhar noutro lado. Esses custos passam também por grandes acidentes e desastres, como foram exemplo a explosão na Texas City Refinery da BP ou as recentes colisões da Marinha norte-americana. Mas, apesar de todas as provas, muitos líderes continuam a acreditar que as suas organizações prosperam quando têm excesso de trabalho, muitas vezes criando pressão e recompensando os que cumprem os objectivos sob stresse. É uma abordagem popular, mas patológica.
As empresas norte-americanas sofreram bastante com esta abordagem durante décadas, até muitas encontrarem uma via mais adequada.
Antes dos anos 80, os gestores de fábrica acreditavam que manter ocupadas todas as pessoas e todas as máquinas era a chave do sucesso. Se todos estivessem ocupados, a fábrica produziria mais. Mas algumas visitas a fábricas japonesas e livros como “The Goal” mostraram que esta abordagem prejudicava o desempenho. Actualmente, as fábricas são geridas de outra forma. Ao todo, os gestores tornaram-se mais conscientes das operações fundamentais para o desempenho geral – e as fábricas de produção e de montagem são agora mais eficientes e flexíveis do que o eram nos anos 80.
Ainda assim, a teoria “manter todos ocupados” permanece activa noutros contextos, principalmente em projectos que envolvem conhecimento. Embora não tenham sido tão extensivas nesses contextos, as provas sugerem que em muitos tipos de empregos – por exemplo, servir clientes em bancos, fazer cirurgias complexas e desenvolver produtos inovadores – as organizações sobrecarregam os colaboradores na esperança de maximizarem o desempenho da empresa. Têm muito a aprender com a produção, onde os gestores adoptaram um sistema de “puxões” para controlarem o número e ritmo das tarefas num processo laboral.
Neste artigo, explicamos como este conceito do mundo do trabalho físico pode ser usado para melhorar a distribuição de recursos e impedir o excesso de trabalho noutros locais. Exploramos também como a “gestão visual”, uma técnica frequentemente usada na gestão ágil de projectos, pode facilitar a aplicação do pensamento de “puxão” num portefólio total de desenvolvimento, ao tornar as tarefas não físicas mais tangíveis.
Para exemplificar, descrevemos duas alterações recentes no Broad Institute do MIT e de Harvard, um centro de pesquisa biomédica e genómica em Cambridge, Massacgusetts, EUA, onde um de nós, Sheila Dodge, supervisiona a principal plataforma tecnológica. A primeira intervenção simplificou as operações nos laboratórios, um contexto semelhante às operações de produção e montagem, e a segunda melhorou a circulação do trabalho de I&D e desenvolvimento tecnológico. Embora o Broad pareça um caso especializado, a nossa pesquisa sugere que os gestores de qualquer organização que lide com conhecimentos e tenha excesso de trabalho, podem aprender com os erros passado do instituto e com as melhorias nos seus processos.
Gerir o laboratório como se fosse uma fábrica
Terminada em 2001, a sequenciação do primeiro genoma humano demorou quase 10 anos e custou 2,3 mil milhões de euros. Alguns anos mais tarde, em 2004, o Broad Institute foi criado com a missão de transformar a Medicina ao compreender sistematicamente os princípios genéticos das doenças com análises e tecnologias inovadoras. O custo da sequenciação dos genomas desceu mais de mil vezes e pode ser agora feito em dias por cerca de 850 euros.
Actualmente, a estrutura organizacional do Broad Institute engloba dois componentes distintos: (1) um conjunto de programas de pesquisa que explora como a informação genética pode explicar a origem de doenças como cancro e diabetes, e (2) um conjunto de plataformas tecnológicas que apoia a pesquisa ao analisar amostras (normalmente de sangue ou tecido) e identificar sequências de ADN.
Mas o Broad nem sempre foi assim. Começou como uma organização de pesquisas repleta de químicos, biólogos e peritos em Matemática Aplicada, e a plataforma de tecnologia genómica assemelhava-se aos laboratórios de pesquisa. O trabalho era feito em quantidades pequenas, muitas vezes seguindo processos informais ou até improvisados. Tendo em conta as pessoas capazes e altamente instruídas que o Broad contratava, nunca havia falta de ideias novas.
Esta configuração flexível de colaboradores dedicados produziu rápidos avanços na tecnologia de sequenciação – até esse crescimento revelar os limites da abordagem do Broad na gestão e cumprimento de tarefas. Em 2012, o ciclo do processamento de amostras durava mais de 120 dias, deixando o Broad incapaz de acompanhar a procura do sector de análises a amostras. Investigadores de instituições com quem colaboravam começaram a mandar as análises para outros laboratórios.
Para abordar este desafio, o Broad alterou a sua abordagem do tradicional sistema de “empurrões” para um sistema baseado em “puxões”, que simplificou a circulação de amostras da manipulação química para a análise e a sequenciação. Num sistema de “empurrão”, as tarefas são efectivamente separadas e cada pessoa “empurra” o máximo de trabalho possível para o passo seguinte do processo, quer a próxima pessoa esteja preparada para tal ou não, criando frequentemente um excesso de trabalho dispendioso. Num sistema de “puxões”, a quantidade de trabalho no sistema é cuidadosamente controlada, levando a uma melhoria na transparência, o que possibilita a aprendizagem e uma maior produtividade. Tendo em conta que é uma abordagem que pode beneficiar qualquer organização onde as tarefas – quer seja trabalho físico ou cognitivo – tendem a acumular entre passos de um processo, descreveremos como a mudança decorreu no Broad.
Os custos de um processo “empurrão”
A dificuldade do Broad em lidar com a procura dos seus serviços tinha como base a utilização de um sistema de “empurrão” para gerir a circulação de amostras de laboratório. Quando uma amostra chegava, ia imediatamente para a primeira etapa preparatória dos processos de análise e sequenciação, onde ficaria até alguém lhe pegar. Quando essa tarefa estava terminada, a amostra passaria para a etapa seguinte, onde, mais uma vez, esperaria pelo processamento e assim por diante, até chegar às máquinas de sequenciação que analisam o ADN.
As amostras que se acumulavam entre etapas constituíam um inventário de trabalho em curso, ou TEC. Quando usado de forma adequada, o TEC melhora a produtividade geral ao separar as etapas – mesmo que a pessoa acima esteja presa numa tarefa difícil, o inventário TEC permite que se continue a trabalhar. Os académicos na gestão de operações desenvolveram modelos sofisticados para descobrirem exactamente a quantidade de TEC que deve ser colocada entre operações num processo de produção.
Infelizmente, a prática nem sempre segue a teoria. A equipa do Broad trabalhava arduamente todos os dias para fazer com que as amostras passarem pelo sistema, mas o desempenho estava cada vez pior. As pilhas de TEC continuavam a crescer, ficando muito abaixo do aceitável. Quando alguém precisava de uma amostra específica, demorava dois dias a encontrá-la. Gerir a consequente congestão e confusão ocupava uma boa parte do tempo da equipa de gestão.
Para apreciar melhor os desafios criados por um sistema de “empurrão”, vejamos o processo do ponto de vista de um indivíduo: quando o TEC se acumula em cada etapa, a pessoa que executa uma operação particular enfrenta muitas vezes mais trabalho do que consegue completar num determinado turno. Ela pode refazer as prioridades, o que significa que olha para a pilha de tarefas, determina quais as importantes e trabalha primeiro nessas. Embora seja uma abordagem sensata do ponto de vista individual, quando cada pessoa (ou equipa) num processo determina as suas prioridades de forma diferente, o desempenho do sistema de trabalho torna-se cada vez mais variável. Se uma tarefa é considerada prioridade alta por todos os que se encontram na cadeia, é feita rapidamente. Mas isso significa que outra tarefa passou para o fundo de várias listas de tarefas, e pode demorar semanas ou meses a passar pelo sistema.
Antes de passar do “empurrão” para o “puxão”, os colaboradores do Broad começavam todos os dias definindo prioridades para as suas tarefas, perguntando: “Há algum conjunto particular de amostras que precise de ir primeiro?
Devo tratar da próxima amostra da pilha ou responder ao investigador em fúria que acabou de ligar a queixar-se de não ter recebido os seus dados?” À medida que milhares de amostras em curso se acumulavam, não só o tempo médio do ciclo aumentou, como os resultados se tornaram cada vez menos previsíveis. Algumas amostras eram completadas relativamente depressa, enquanto outras demoravam seis meses ou mais.
A tendência dos sistemas de empurrão para produzirem ciclos de tempo longos e imprevisíveis cria outro problema. Quando um trabalho realmente importante aparece, as pessoas não querem correr o risco de o colocar numa pilha de TEC. Por isso dão a volta ao sistema para assegurarem que as tarefas ganham prioridade em cada etapa. Nas fábricas, isso chama-se “aceleração”. Antes da revolução “lean”, era normal as fábricas terem pessoal dedicado aos projectos “especiais” na linha de produção. Mas a aceleração é como um narcótico – quanto mais se usa, mais é necessária. Quando um projecto é acelerado, todos os outros TEC ficam para trás. Eventualmente, essas tarefas ficarão tão atrasadas que exigirão igualmente uma aceleração, criando um ciclo vicioso.
No Broad, a equipa de produção desenvolveu horários diários, mas raramente aderiu aos mesmos durante mais do que algumas horas antes de alterar as tarefas para cumprir exigências.
Alterar localmente as prioridades e acelerar tarefas, criou uma necessidade quase constante de “apagar incêndios”. Quando um técnico queria começar a preparar uma amostra para a sequenciação, a primeira coisa a fazer era encontrá-la. Muitas vezes, a meio da procura, a sua atenção virar-se-ia para outro conjunto de amostras que subitamente se tornaria mais prioritário. A equipa de operações passaria o dia a responder a queixas, levando a uma distribuição de recursos cada vez mais ineficiente. Apesar de trabalhar mais horas, o laboratório estava a ficar para trás. A moral desceu e as discussões eram diárias, à medida que os líderes da equipa tentavam perceber porque é que outra amostra estava prestes a falhar o prazo de entrega prometido.
Os benefícios de um processo “puxão”
Para retirar às operações o constante excesso de trabalho e o ter de andar a apagar incêndios, a plataforma de genómica do Broad passou para um sistema de “puxão”. A chave para compreender a diferença entre “empurrão” e “puxão” é reconhecer que o inventário do TEC é uma faca de dois gumes. Embora fosse feito para ajudar a mitigar a variabilidade na velocidade e na produtividade entre etapas num processo, também esconde informações que supervisores e operadores podem usar para gerir e cumprir o trabalho com mais eficácia.
Num sistema de “empurrão” com muito TEC, um operador pode concentrar-se na sua tarefa individual, sem pensar muito no que está à sua volta.
Mas um sistema de “puxão” força a que se perceba melhor o que se passa à volta e define limites claros (acima e abaixo) na acumulação de TEC. Quando um indivíduo ou uma equipa atinge um desses limites, é porque existe um problema subjacente, mas os gestores podem contrabalançar a produtividade a curto prazo e a aprendizagem a longo
prazo ao ajustarem os limites do TEC. Limites mais restritivos permitem-lhes identificar e resolver problemas no sistema; um alcance mais abrangente leva a menos contratempos e a um rendimento mais virado para o curto prazo.
No Broad, implementar o sistema “puxão” começou com a reconfiguração das áreas de inventário entre as etapas. Um simples sistema com um código de cores indica agora aos técnicos sinais claros do estado do projecto em relação ao sistema de produção geral.
Cada projecto tem agora uma caixa TEC com três secções, de cor verde, amarela e vermelha. Se a caixa está totalmente vazia, então o técnico deve processar amostras. Assim que a área verde está cheia, pode abrandar, e preencher a área amarela significa que o dia de trabalho está a chegar ao fim. Uma secção totalmente vermelha avisa que está na altura de parar.
Se um técnico acabou o seu trabalho do dia, pode avaliar rapidamente o estado geral do sistema ao olhar para as caixas dos outros e identificar um colega que possa estar a ficar atrasado e que precisa de ajuda. Ao fornecer sinais claros de fazer e parar, um sistema de “puxões” promove um equilíbrio eficaz na linha.
Esses sistemas fornecem igualmente um conjunto claro de sinais vitais que podem ser controlados pelos gestores. No Broad, uma passagem rápida pela área de produção revela quais as partes da operações que estão em movimento e quais as que estão paradas. Uma caixa perpetuamente cheia significa que as tarefas da secção abaixo estão a mover-se demasiado devagar ou que a secção acima está a mover-se demasiado depressa. Uma caixa vazia no final do dia significa que algo está errado com a operação que a alimenta.
Com esta transparência, a equipa de operações consegue identificar e abordar vários problemas que anteriormente estavam por baixo das pilhas de amostras em curso. Por exemplo, as caixas vazias mostraram à equipa como uma alteração aparentemente pequena nos horários dos turnos fez com que as máquinas de sequenciação muitas vezes acabassem o trabalho a um sábado ou domingo, não podendo ser recarregadas até à segunda-feira seguinte, reduzindo a utilização.
Limitar o TEC entre etapas e permitir e alteração das prioridades apenas no início do processo resultou num sistema mais célere e fiável. Mas resistir à tentação de acelerar continuou a ser um desafio para a equipa do Broad. Com tempo, contudo, a cultura mudou e as pessoas começaram a responsabilizar-se por ma terem o processo. Na reunião de produção matinal, é normal ouvir os membros chamarem-se uns aos outros “empurrões”, um lembrete ligeiro de que estão a cair de novo no vício da aceleração. Até o director do centro concordou em parar de mudar as prioridades a meio do processo.
Implementar o sistema de “puxão” criou ganhos significativos no Broad. Com o novo sistema, a utilização de máquinas de sequenciação – o maior investimento – subiu quase imediatamente e eventualmente mais do que duplicou. Actualmente, raramente fica abaixo dos 90% e ultrapassa frequentemente os 95%. O tempo do ciclo de processamento acabou por cair mais de 85% e os desvios desceram drasticamente. Um processo mais rápido, mais previsível e mais transparente criou estabilidade e vantagem competitiva. O laboratório recebe menos dúvidas dos investigadores sobre os seus dados, e os colaboradores que se dedicavam a acelerar amostras podem agora concentrar-se a lidar com problemas fundamentais que impedem que o processo funcione como desejado. Foram também libertados recursos para inovar, fazendo com que a plataforma se tornasse pioneira em vários serviços líderes do sector, como a sequenciação clínica do genoma, em que os dados são entregues aos pacientes, e a biópsia líquida com células livres, possibilitando uma caracterização de metástases cancerígenas com o mínimo de invasão.
Gerir o desenvolvimento tecnológico
As melhorias que o Broad fez nas suas operações seriam impressionantes em qualquer sector. Mas foi um salto relativamente modesto, de um ambiente tradicional de produção e montagem para a implementação de um sistema de “puxões” no laboratório de amostras. A intervenção seguinte do Broad foi mais inovadora: adaptar a abordagem dos “puxões” para gerir o desenvolvimento tecnológico. Embora muitos especialistas em gestão argumentem que a eficiência e a inovação não se cruzam, o Broad criou um sistema que lhe permite ser um processador altamente eficiente e líder no sector na criação de tecnologia nova.
Quando os processos laborais com conhecimentos são geridos com “empurrões”, é difícil controlar as tarefas no processo porque muitas delas encontram-se em emails individuais, ficheiros de projectos e listas de coisas para fazer. Para complicar a questão, os colaboradores talentosos – principalmente aqueles que se encontram em ambientes de inovação – têm tendência para trazerem mais ideias para uma organização do que aquilo para o qual ela está preparada. Estudos feitos em organizações com desenvolvimento de novos produtos no sector da electrónica de consumo e motociclos, sugerem que os sistemas de I&D muitas vezes têm três a cinco vezes mais projectos em curso do que conseguem completar.
Os processos de I&D na plataforma de genómica do Broad são um exemplo. Em 2012, o grupo tinha mais ideias para desenvolvimento tecnólogo sob consideração do que as que conseguiria investigar totalmente e muitos mais projectos em curso do que as suas operações sobrecarregadas alguma vez conseguiriam implementar. Além disso, a abordagem de “empurrão” para a gestão de desenvolvimento tecnológico criou obstáculos semelhantes aos experimentados no laboratório. Acostumadas a ter autonomia considerável, as equipas de desenvolvimento mudavam regularmente de prioridades e de enfoque de uma ideia para a outra, reduzindo a produtividade e criando variabilidade.
Quando sentiam alguma urgência, muitas vezes devido a pedidos de clientes ou alterações na tecnologia de um fornecedor, largavam tudo e apagavam um incêndio novo. Com um processo de desenvolvimento lento e imprevisível, os líderes recorriam frequentemente à aceleração, esta tornou-se o processo de desenvolvimento, e a plataforma de genómica estava a perder a posição de liderança tecnológica que adquirira a custo.
Para aplicarem a conceito de “puxões”que funcionou bem no laboratório de amostras, as equipas de desenvolvimento tecnológico usaram a visualização para darem ao seu trabalho menos tangível uma “cara” física. Os gestores fizeram no em contextos de risco e crise durante décadas, muitas vezes obtendo dados necessários para uma fusão ou aquisição numa “sala de guerra” ou dedicando uma divisão para ser o “comando de incidentes” após um problema. Embora a visualização seja menos comum em “tempo de paz”, pode ser igualmente eficaz na gestão do trabalho do dia-a-dia, já que o nosso ambiente físico molda a forma como vemos e processamos a informação.
No trabalho físico, é visualmente óbvio quando o TEC excessivo se acumula e as linhas de produção param, por isso os colegas aproximam-se naturalmente para ajudar. Mas quando o trabalho num dos principais componentes de um projecto de I&D pára, isso normalmente não envia um sinal claro a toda a organização. A gestão visual faz com que seja mais fácil ver o que está em movimento e o que está parado.
As equipas tecnológicas do Broad tornam o seu trabalho mais tangível ao desenharem um esquema simples do “funil” de desenvolvimento numa parede e criando uma caixa individual para cada grande fase (viabilidade, design e validação). Trabalhando em conjunto e aproveitando diversos emails, folhas de cálculo e ficheiros, criara uma lista de todos os projectos em curso. Depois transferiram cada um deles para uma nota num post-it e colocaram no diagrama em funil na caixa correspondente à fase de desenvolvimento em que se encontrava.
Embora a criação da representação visual de um projecto individual não seja novidade (as equipas ágeis fazem-no a toda a hora), é raro criar uma para todos os projectos em desenvolvimento, como fez o grupo de I&D do Broad. O exercício levou a duas conclusões. Primeiro, havia uma falta clara de prioridades comuns: ninguém tinha noção de todos os projectos, havia pouco consenso sobre quais os mais importantes e muitos projectos sobrepunham-se ou competiam uns contra os outros. Segundo, o sistema tinha demasiado trabalho em curso. A comparação entre o número de projectos actuais e os últimos entregues mostrou que os colaboradores tinham pelo menos o dobro do trabalho que seriam capazes de completar na melhor das hipóteses.
Depois de tornarem visíveis as consequências imprevistas de “empurrar” continuamente novas ideias num sistema de desenvolvimento sobrecarregado, as equipas começaram a encontrar-se todas as semanas à frente do funil para determinarem quais as actividades do portefólio em dificuldade e que precisavam de ser encaradas pela liderança. Para cada projecto, um conjunto de notas em post-its identificava três elementos: actividades relevantes (como o desenvolvimento de um protocolo de testes), o nome do “proprietário” de cada actividade e as datas dos prazos.
Durante a reunião semanal, as pessoas reportavam brevemente se as actividades estariam prontas a tempo. Se a resposta fosse “não”, um post-it de uma cor diferente (normalmente cor-de-rosa) era colocado no topo da entrada original para assinalar que algo não estava a correr segundo o plano.
Assim que uma actividade “bloqueada” era identificada, os líderes das equipas podiam discutir formas de fazer com que se movesse, acrescentando recursos ou removendo obstáculos. Após estarem terminadas todas as actividades de uma fase em particular, o grupo discutiria se o projecto seria suficientemente interessante para passar para a próxima fase de desenvolvimento. Se sim, então novos post-its, representando o próximo conjunto de actividades importantes, eram colocados no quadro.
Este exercício também ajudou o grupo a identificar e a cancelar as actividades com prioridades mais baixas. Ao longo de dois anos, o número de projectos em curso diminuiu para metade, reduzindo o tempo necessário para completar os projectos sobreviventes e aumentando o rendimento geral. Mas diminuir o portefólio não era suficiente para suportar as melhorias. Cientistas e técnicos do Broad continuavam a gerar mais ideias boas do que os recursos para as executar. Sem regras para gerir o portefólio, o excesso de trabalho era quase certo e seriam necessários cortes dolorosos.
Por isso a plataforma de genómica fez algumas alterações nas reuniões semanais e no quadro visual. Primeiro, foi acrescentado um pequeno funil à frente do funil principal para recolher e representar todos os projectos propostos que ainda não começaram. Para facilitar a partilha de prioridades, o grupo classificou cada projecto no pequeno funil por possível impacto e esforço necessário para o completar. Era possível acrescentar ideias ao pequeno funil em qualquer altura, e as sugestões novas eram discutidas e classificadas todas as semanas. Segundo, uma coluna “aprovado e pronto” foi acrescentada entre o pequeno funil e a primeira fase do funil de desenvolvimento. Para aí iam as ideias novas merecedoras de desenvolvimento. Os gestores e os colaboradores depois analisavam-nas em conjunto todas as semanas e ajustavam as prioridades conforme necessário. Terceiro, também analisavam a quantidade de trabalho nas diversas etapas do funil e só retiravam da coluna “aprovado e pronto” quando todos concordassem que havia espaço suficiente para começar um novo projecto.
Para determinar se haveria espaço para um novo projecto, o grupo de I&D modificou a abordagem de “puxão” usada para as amostras do laboratório. No laboratório, as amostras podem ser facilmente reduzidas a uma unidade comum de trabalho, e por isso é relativamente simples especificar rapidamente os recursos necessários.
Em contraste, os projectos e I&D têm diferentes formas e feitios. Por isso, o quadro em funil, por si só, não oferece informações que cheguem para distribuir recursos. Em vez disso, o grupo depende de relatórios semanais, facilitados pelo sistema visual, para avaliar a quantidade de trabalho que as pessoas conseguem cumprir, permitindo assim que as equipas aproveitem a experiência e os conhecimentos dos seus membros.
Apenas alguém que esteja totalmente familiarizado com uma tarefa pode calcular o tempo e esforço necessários. O prazo de cada actividade baseia-se na avaliação do tempo que demorará a cumpri-la em circunstâncias normais – ou seja, num sistema de desenvolvimento adequado. Os contribuidores relevantes são depois inquiridos se conseguem cumprir o prazo, tendo em conta o trabalho que têm em mãos. Se disserem “não”, é um sinal (como a profusão de Post-its cor-de-rosa) de demasiado trabalho nessa parte do sistema. A actividade nova não pode avançar enquanto outras não estiverem terminadas ou forem canceladas.
Os líderes também utilizam o quadro para detectar engarrafamentos ou outras questões de gestão de desempenho individual. Se certas partes do túnel se movem mais lentamente do que outras, os recursos precisam de ser alterados ou os colaboradores relevantes precisam de encarar o trabalho de forma diferente.
Criar um sistema de “puxão” para o desenvolvimento tecnológico no Broad levou a ganhos significativos, tal como aconteceu no laboratório. Depois de aumentar consideravelmente a velocidade e o rendimento do seu sistema, o grupo de desenvolvimento libertou recursos para criar novos produtos e serviços, incluindo sequenciação para clientes comerciais, processamentos de amostras clínicas para pacientes individuais e criação de uma plataforma de dados que faz com que mais cientistas usem pesquisas com dados genéticos. Os colaboradores reportam um envolvimento mais profundo no seu trabalho e maior sucesso nas colaborações transversais (menos guerras “territoriais”, por exemplo, e objectivos mais integrados).
Enquanto o grupo de I&D desenvolvia este sistema, todos os post-it que saíram do quadro no final de uma actividade foram guardados zelosamente e colocados numa enorme estaca. Após quatro anos de sistema, gestores e colaboradores fizeram uma pequena celebração e contaram todas as notas na pilha – mais de quatro mil actividades de desenvolvimento individuais, ou cerca de uma a cada duas semanas para cada membro da equipa de liderança.
Estruturar o trabalho para as pessoas
Quando começámos a ensinar este material no MIT, a pergunta mais habitual, de longe, que nos fazem é algo do género: “Claro, isto funciona nos vossos exemplos.” (Normalmente debatemos produção, sequenciação de genomas e extracção de petróleo.) “Mas será que irá funcionar na minha organização?” Damos sempre a mesma resposta: “Aquilo que ensinamos funciona apenas em organizações que têm pessoas.”
A Toyota e outras fabricantes asiáticas catalisaram a revolução no mundo físico, e as empresas ocidentais passaram uma boa parte de duas décadas a aperfeiçoar a gestão de qualidade e a produção lean, um esforço que continua até este dia. Mas, enquanto as empresas que usam estes métodos desenvolveram uma capacidade significativa na produção e nas operações da cadeia de abastecimento, muitas não viram o quadro geral. As ferramentas e práticas associadas à gestão de qualidade e abordagens lean funcionam não porque são melhores formas de organizar a actividade de produção, mas porque são melhores formas de organizar a actividade humana.
Criar sistemas que permitem às pessoas verem o seu trabalho não físico de forma mais clara – quando está em movimento e bloqueado – pode representar a próxima fronteira da melhoria do desempenho organizacional.
Este artigo foi publicado na edição 96 da Human Resources.