Será que o teletrabalho veio para ficar? Três especialistas respondem

O teletrabalho veio para ficar, em algumas actividades de forma total e noutras de forma parcial. A excepção serão algumas áreas em que, pelas caraterísticas específicas do tipo de negócio, este modelo de flexibilização laboral será impossível de praticar. Esta foi uma das conclusões que resultou da mesa redonda virtual que juntou consultores e gestores no âmbito das Insights Talks 2020.

 

O debate centrado no tema «O teletrabalho gera ou não mais produtividade (vantagens e desvantagens)» juntou, na quarta-feira à noite, Carlos Vasconcelos, presidente da Medway; Alexandre Real, partner da consultora Sfori e membro da equipa de coordenação do Rock in Rio Academy; e Anabela Ventura, country manager da LHH|DBM Portugal, consultora especializada em outplacement, desenvolvimento de liderança e gestão da mudança.

Os oradores centraram as suas intervenções nas consequências e efeitos a longo prazo do teletrabalho, um modelo organizacional que entrou no dia a dia das organizações, acelerado drasticamente pela actual pandemia da COVID-19. Todas as intervenções destacaram a importância de se continuar a assegurar o acompanhamento dos trabalhadores, quer em termos de produtividade, quer de motivação individual, quer ainda de ligação emocional à empresa.

«O teletrabalho não pode estar sujeito às regras do trabalho no escritório, nomeadamente em matéria de horários», defendeu Carlos Vasconcelos, que acrescentou: «O teletrabalho tem de ter uma amplitude mais larga para que cada colaborador possa organizar o seu trabalho em função da sua vida particular».

Por exemplo, se na empresa entra às 9h00 e sai às 17h30, em teletrabalho deve ter a possibilidade de escolher o seu próprio horário, desde que execute as tarefas que lhe estão destinadas. «Deve ser permitido a cada um adaptar o seu tempo de trabalho à sua vida familiar, ao seu ritmo biológico e à sua disponibilidade. Esta é a grande vantagem do teletrabalho», frisou.

A Medway que emprega mais de 900 trabalhadores, dos quais só cerca de 180 com funções administrativas puderam passar para teletrabalho, fez já um inquérito a este grupo a pensar no futuro. Destes, 78% manifestaram intenção de continuar em regime de home office no pós-pandemia. «Vamos apenas criar uma norma interna que obrigue a uma presença física regular na empresa, que pode ser uma vez por semana ou por quinzena, em função do departamento e respetiva chefia», disse Carlos Vasconcelos.

Anabela Ventura, por seu turno, chamou a atenção para o facto de teletrabalho e ficar em casa a tomar conta de crianças serem duas funções incompatíveis – ou se faz uma coisa ou se faz outra. «Ficar em teletrabalho implica que os trabalhadores e as famílias têm de se organizar tal e qual como se organizavam se fossem trabalhar para a empresa», referiu a responsável da LHH|DBM.

E acrescentou, «não é possível imaginar que a produtividade vai funcionar em simultâneo com as responsabilidades familiares. Para se poder ser produtivo é preciso assegurar convenientemente a retaguarda».

A consultora lembrou igualmente a importância da questão logística, com o confinamento, as empresas preocuparam-se, em primeira linha, em dotar os seus colaboradores que passaram a trabalhar a partir de casa com computadores portáteis, telemóveis de última geração e comunicações adequadas, mas não basta. «E as cadeiras em condições e as mesas ergonómicas? O que acontece a uma pessoa ao fim de algumas semanas a trabalhar num cantinho? Ganha uma tendinite», exemplificou.

Alexandre Real, da Sfori, lembrou que a sua empresa tem o teletrabalho implementado desde 2015, uma experiência que foi particularmente útil na fase da pandemia, na medida em que permitiu dar conselhos às organizações que acompanha diariamente sobre as boas práticas deste modelo organizacional. «O teletrabalho tem muitas vantagens, a começar na produtividade, mas também acarreta alguns perigos, incluindo o cansaço do trabalhador», frisou.

O consultor defendeu que, para o futuro, cada organização deve ter a capacidade de respeitar o colaborador enquanto entidade única e não implementar um sistema laboral como um todo. «É importante respeitar quem quer continuar em teletrabalho e quem quer voltar a ir diariamente para o escritório».

Um processo de gestão da mudança, acrescentou, deve ser estruturado e planeado. Ou seja, algo que na fase aguda da COVID-19 não existiu, quando, de uma semana para a outra, as organizações tiveram de adaptar completamente o seu sistema produtivo e os colaboradores a sua forma de trabalhar. «Num processo planeado de teletrabalho a sobrecarga familiar não faz sentido».

As Insights Talks 2020 são um ciclo de debates promovido pelo LabEST – Laboratório de Empreendedorismo, Sociedade e Tecnologia, em parceria com a coordenação da licenciatura de Gestão do Instituto Piaget de Almada e o apoio da equipa do Gestão Summit.

O ciclo prossegue na próxima semana, com a realização do último debate, marcado para 16 de Julho, às 21 horas, com o tema “O que as empresas procuram na corrida à digitalização”. Como convidados estarão três gestores de referência ligados às áreas da tecnologia e da inovação.

O evento tem acesso gratuito, através da plataforma Zoom, com inscrição prévia através do site do Instituto Piaget.

 

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