Vanda de Jesus, Portugal Digital: «A diversidade impulsiona o sucesso»

Vanda de Jesus, directora Executiva do Portugal Digital faz notar que «os dados do terceiro relatório da McKinsey (“Diversity Wins: How Inclusion Matters”, Maio de 2020), comprovaram que, quanto maior for a representação da diversidade, maior será a probabilidade de um desempenho superior». Leia o seu testemunho.

 

No especial sobre “Liderança no feminino”, foi uma das 12 mulheres em cargos de topo em Portugal que partilhou a sua experiência e visão sobre o tema da Igualdade de Género.

 

«As pessoas são a minha maior motivação. Todas aquelas com quem colaborei na vida profissional ajudaram-me a traçar uma parte muito significativa do meu caminho. Porque acredito que o que nos caracteriza individualmente nos fortalece, considero imperativo o momento da escolha das nossas equipas e, principalmente, dos nossos líderes. Com quem queremos caminhar? Quem queremos seguir? Com quem queremos aprender? Para mim, a resposta será sempre sustentada por aquilo que nos diferencia.

Quando assumi o papel de directora executiva da Estrutura de Missão Portugal Digital, tive a liberdade e o privilégio de escolher a minha equipa de raiz. Escolhi alinhar os perfis que queria e os percursos que sabia serem uma mais-valia para a organização. Escolhi diversidade, e tenho-o feito sempre ao longo da minha carreira profissional.

Acredito que existe mais diversidade que deve ser exaltada para além das questões de género, mas não é por isso que a considero menos premente. Acima de tudo, sou mulher. Mãe, companheira e amiga. Todos estes papéis fazem parte da minha identidade e do que trago para uma organização quando me junto a ela. Felizmente, nunca senti na pele a discriminação de género ao longo do meu percurso profissional – não travou nem dificultou os cargos que ocupei e ocupo, mas tenho a certeza de que os enriqueceram.

Sabemos, no entanto, que nem todas as mulheres têm a mesma experiência. O espaço que nos é reservado ainda não é sólido o suficiente para muitas de nós se sentirem confortáveis nos s eus postos de trabalho, para serem as primeiras a usar da palavra nas reuniões de equipa, para negociarem os seus salários. Ainda não estamos, de forma igualitária, nos Conselhos de Administração das empresas. Muitas acumulam ainda o trabalho em casa, não remunerado, de cuidadoras primordiais de quem mais precisa, sejam os seus filhos ou os seus pais.

Apesar do caminho trabalhoso que a igualdade de género acarreta, temos dado passos largos, e acredito que estamos no caminho certo. No último ano, de acordo com o Banco Mundial, Portugal destacou-se entre os 10 países que obtiveram pontuação máxima no índice “Mulheres, Negócios e Lei”, entre 190 analisados. Portugal obteve a melhor pontuação possível em todas avaliações nos vários sectores: mobilidade, local de trabalho, salário, casamento, parentalidade, empreendedorismo, activos e pensões. Este sinal é muito positivo e deve ser motivo de orgulho.

Mas continua a ser preciso reiterar que a igualdade é um investimento e que precisa de ser incentivado. Hoje, defendo que a regulação seja usada sempre que é necessário forçar e acelerar uma posição dominante e acredito que o recurso às quotas ajuda a colmatar alguns desafios que as mulheres enfrentam. A imposição de incluir mais mulheres no Parlamento, nos Conselhos de Administração e nas estruturas das organizações e empresas potencia o acesso e a iniciativa. Permite que mais mulheres se sintam representadas, garantindo de forma eficaz que aqueles espaços também lhes pertencem.

Na particular área em que me insiro, tecnológica e digital, que tem vindo a crescer e a evidenciar-se mais necessária do que nunca, o desequilíbrio na inclusão ultrapassa as barreiras do género, mas atinge-as com particular força. Em Portugal, 48% dos cidadãos não possuem competências digitais básicas e 18% nunca usaram a internet. Acresce que existem grupos dentro da nossa população que enfrentam riscos acrescidos de exclusão digital, motivados pela sua idade avançada, baixos rendimentos ou níveis igualmente baixos de escolaridade. Das pessoas que se inserem nestes grupos, mais de 60% são mulheres.

Do outro lado da moeda, no universo das 54% das mulheres que se matricularam no Ensino Superior em 2020, apenas 12% enveredaram em Engenharias Tecnológicas. O valor desce ainda mais quando olhamos para as mulheres especialistas nas TIC (Tecnologias de Informação e Comunicação) – 0,7%. Apesar de Portugal estar acima da média europeia com mais mulheres nas áreas das STEM (Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática), os números são exponenciados pelas Ciências e mostram-se muito inferiores nas outras referidas áreas.

Por tudo isto, a inclusão e literacia digital e tecnológica são prioridades do Governo português, como podemos evidenciar nas medidas e iniciativas do Plano de Acção para a Transição Digital.

Mas, para além do género, acredito que todas as vertentes da diversidade contribuem positivamente para a riqueza de uma organização – não apenas pelo lado mais humano da sua composição, mas também pelo reflexo que ela tem na operação. No terceiro relatório da McKinsey (“Diversity Wins: How Inclusion Matters”, Maio de 2020), dedicado a compreender o impacto da diversidade nas organizações, a defesa da diferença e da inclusão saíram reforçadas e tornou-se evidente que importam, hoje, mais do que nunca.

Os dados comprovaram que, quanto maior for a representação dessa diversidade, maior será a probabilidade de um desempenho superior. As empresas que tinham nas suas equipas mais de 30% de mulheres executivas demonstram melhor performance. Comprovaram também que as empresas que se concentram mais na diversidade racial e étnica tiveram 36% mais hipótese de ter retornos financeiros acima da média do seu sector.

Na minha equipa, escolhi diversidade. Escolhi diferentes percursos académicos e personalidades. Dos oito elementos, quatro são mulheres. E apesar de os homens – também eles de áreas tão díspares – nos ajudarem a caminhar e nos enriquecerem a travessia, hoje dou destaque a elas e às suas valências: À Diana Marques, que veio da Engenharia, à Ana Cordeiro, da Matemática, à Ana Marques, de Direito, e a mim mesma, de Gestão. E destaco-as não só pelo género que nos une, mas pelas diferenças que nos separam e que melhoram o trabalho de equipa.

As histórias que nos distinguem e trouxeram até aqui são o motor da nossa diversidade e deixarão a nossa marca. Juntos no que nos distingue, seremos sempre melhores.»

 

Este artigo faz parte do tema de capa da edição de Março (123) da Human Resources.

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