Isabel Borgas, NOS: É na liderança que tudo começa
Reconhecendo que estamos «todos a aprender a viver e a trabalhar neste novo contexto», Isabel Borgas também sabe que é na(s) liderança(s) que tudo começa. Na fase actual em que se instalam novos paradigmas, exigem-se «mudanças de postura e de abordagens para organizações que precisam de continuar a competir por e com o talento».
Por Ana Leonor Martins | Fotos Nuno Carrancho
Isabel Borgas assumiu a direcção de Pessoas e Organização da NOS em Setembro de 2020, e algumas coincidências contribuíram para que esta mudança tenha confluído com um exercício interno de repensar as principais prioridades da companhia para os próximos anos. Isto trouxe a oportunidade de evoluir a partir de um modelo “folha em branco” para o programa Next Gen People. Ao longo do último ano, o foco tem estado na construção evolutiva do propósito e dos valores da empresa, havendo também uma evolução dos modelos de Gestão de Pessoas e estando a ser feito um redesenho da experiência de colaborador. A responsável faz ainda notar que «a acepção clássica do papel da Gestão de Pessoas, centrada em torno da atracção, recrutamento, desenvolvimento e retenção de talento, está a ser ultrapassada pela necessidade premente de manter as equipas alinhadas e unidas, envolvidas e a cooperar».
Desde o primeiro desconfinamento, há mais de um ano e meio, que andamos a falar de regresso à “normalidade”. Foi sendo progressivamente adiado, e, em muitas empresas, as decisões mais definitivas em relação ao modelo de regresso dos trabalhadores parece novamente adiada, para início do ano. Como está a ser na NOS? Setembro marcou efectivamente o regresso?
Vemos o regresso à “normalidade” como um caminho progressivo, e acreditamos que vamos ter de nos habituar a viver com o vírus, como já antes nos habituámos a viver com uma série de outros vírus.
Ainda assim, a verdade é que, na NOS, não temos certezas absolutas quanto a um “modelo final”, como aliás julgo que nenhuma empresa terá. Estamos todos a aprender a viver e a trabalhar neste novo contexto, a adaptarmo-nos a cada momento, com a informação disponível e a experiência que fomos adquirindo ao longo do último ano e meio.
Mas, com a taxa de vacinação perto dos 90% e com o levantamento de muitas das restrições, foi possível fazer regressar progressivamente os nossos colaboradores, desde o início de Setembro.
E em que moldes esse regresso progressivo está a ser feito? O que serviu de base à escolha do modelo a adoptar? Ouviram os colaboradores, analisaram o que traria maiores benefícios para o negócio…?
Hoje, temos implementado um modelo híbrido de três dias fixos no escritório e dois fixos dias em remoto, que nos parece ser um modelo equilibrado, um modelo que se adapta à fase actual, mas que é flexível para poder evoluir. Numa auscultação que fizemos antes do Verão, mais de 60% dos colaboradores indicaram preferir um modelo que conjugasse a presença nos escritórios com trabalho remoto. E foi o que fizemos, assim que vimos reunidas condições para isso.
Temos também vindo a acompanhar as tendências e os movimentos de outras empresas e a aprender com elas. Ao longo destes últimos meses temos assistido a uma evolução, natural diria, na forma como as empresas vão olhando para estes temas do workplace e workspace. Depois da euforia do remoto, têm ganho força correntes de pensamento que defendem os escritórios como elementos centrais para o engagement dos colaboradores e para a construção de uma cultura forte, essencial ao desenvolvimento e crescimento futuro das organizações. Isto já para não falar da importância que tem na saúde mental das nossas pessoas.
Têm sentido resistência por parte dos colaboradores ou, pelo contrário, a maioria mostra-se entusiasmada e motivada com o regresso?
Arrisco dizer que a esmagadora maioria das nossas pessoas está feliz com este regresso à normalidade, mas não podemos esquecer que somos milhares de colaboradores.
O equilíbrio mental e emocional do ser humano advém, em grande medida, da capacidade de fazer reset, e isso perdeu-se com o confinamento e com o full remote. Aconteceu com todos. O espaço nas nossas casas perdeu identidade, a fronteira entre a vida pessoal e a vida profissional esbateu-se ainda mais, o direito a desligar foi sendo esquecido… o que mudou na vida das pessoas neste último ano e meio foi muito mais do que o interface.
Voltar a estar presencialmente no escritório e trocar impressões no café ou ter companhia para almoçar na cantina, são rotinas saudáveis e essenciais para o nosso bem-estar. Não é possível negar isto.
Agora, não deixa de ser mais uma mudança e o ser humano, por regra, reage mal à mudança, por isso não é estranho que nem todas as medidas que estamos a implementar sejam consensuais. Mas não tenho dúvidas que, enquanto organização, temos a maturidade necessária para lidar com as nossas pequenas frustrações iniciais e pensar no bem maior, para em conjunto fazermos o caminho rumo ao futuro.
O modelo agora adoptado é significativamente diferente do que tinham em Fevereiro de 2020? Que vantagens e desvantagens identifica e que mudanças vem exigir?
Até à COVID-19, o modelo que tínhamos, como na generalidade das organizações, era de cinco dias por semana no escritório. Hoje, é bastante diferente.
Os modelos híbridos trazem inúmeros desafios. Desde logo, um desafio corporativo, na medida em que o valor confiança é realmente central na cultura das organizações. Há também um desafio nas lideranças. Sabemos que parte do segredo de uma boa liderança tem a ver com a capacidade de adaptação aos diferentes contextos. Por isso mesmo, as competências exigidas aos líderes, hoje, têm intensidades diferentes das que eram comummente aceites antes de todas estas transformações.
Outro desafio, bastante prático, mas muito relevante no momento da concretização, é o da reinvenção dos espaços de trabalho. Olhamos para os escritórios como laboratórios vivos de inovação e cocriação, onde se desenvolvem relações de proximidade que são essenciais para o equilíbrio individual de cada um e para a evolução colectiva da organização, o que torna o desafio acrescido face a toda a imensidão de variáveis que temos de considerar.
Os resultados do Barómetro Human Resources, realizado em Agosto passado, revelou que a maioria dos responsáveis – 57% – admitiram ir adoptar o modelo híbrido nas suas empresas não por acreditarem que traz vantagens em relação ao modelo presencial, mas porque os profissionais assim o exigem. Será esta a melhor razão para tomar esta decisão? Não pode “o tiro sair pela culatra”?
O facto é que estas novas formas de trabalhar serão uma variável incontornável de atracção e retenção de talento. As tendências de flexibilidade, agilidade e transformação digital já cá estavam, a pandemia só veio acelerá-las. São mais estruturais do que conjunturais.
Falou no desafio das lideranças… Qual o seu papel em todo este processo e como é que, elas próprias, se têm adaptado a este novo contexto?
É por aí que tudo começa. O sucesso destes novos modelos de trabalho estará naturalmente dependente das lideranças. Das lideranças alinhadas com os princípios e os sentidos certos que, neste contexto, têm de fazer um exercício de reinvenção, de desenvolvimento de competências vitais como a inteligência emocional e flexibilidade cognitiva, liderança aspiracional, pensamento ágil, resiliência e cooperação.
O que está a ser mais desafiante nesta altura, em termos de Gestão de Pessoas?
Estamos numa fase de mudanças de paradigmas muito acelerada. Novos argumentos, novos contextos, novos talentos, nova competição… Há muita novidade a exigir mudanças de postura e de abordagens para organizações que precisam de continuar a competir por e com o talento. A acepção clássica do papel da Gestão de Pessoas, ou Recursos Humanos, centrada em torno da atracção, recrutamento, desenvolvimento e retenção de talento, está a ser ultrapassada pela necessidade premente de manter as equipas alinhadas e unidas, envolvidas e a cooperar. Com diferentes abordagens e muito com a evolução de processos, o grande desafio é manter ou recuperar um clima organizacional funcional, equilibrado e eficaz.
Leia a entrevista na íntegra na edição de Outubro (nº.130) da Human Resources, nas bancas.
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