Rebeldia (ou a negação do conformismo)
Por Carlos Sezões, Managing Partner da Darefy – Leadership & Change Builders
Ser “rebelde” tem uma conotação negativa. Associamos o adjectivo a pessoas difíceis de gerir ou alinhar, fontes de conflitos e com propensão a contrariar e desafiar. Pessoas que, tipicamente, serão fontes de imprevisibilidade e de riscos. Desde sempre (e desde tenra idade, na vida de cada um de nós), a função dos sistemas sociais – a escola, a universidade, a empresa – tem sido combater as tendências para a rebeldia e mostrar a importância das regras como cimento da sociedade.
Não nego, claro, o primado de convenções mínimas que, nos valores, princípios e conduta social, estabeleçam as bases para a coesão de qualquer sociedade. Mas quero crer que, a partir de um certo nível, e falando em concreto no contexto organizacional, devemos ter abertura à diversidade e aproveitar o talento e o capital de criatividade e inovação de quem assume diferentes perspectivas e comportamentos em contexto profissional.
Francesca Gino é uma conceituada professora e investigadora da Harvard Business School que investiu já mais de uma década a estudar “rebeldes” em diversas organizações, a nível global. No seu livro (já um best-seller) Rebel Talent – Porque vale a pena quebrar as regras no trabalho e na vida, lançado em 2018, apresenta as suas teses em defesa da rebeldia com exemplos práticos em várias indústrias e marcas consagradas – da BBC à IDEO, da Olivetti ao Deutsche Bank. Ou citando os exemplos mais conhecidos de Albert Einstein ou Steve Jobs. De como pessoas “diferentes” desafiaram as convenções para fazerem mais e melhor. Advoga as mais valias da curiosidade, das perspectivas alternativas, da diversidade, da autenticidade e do poder transformador de um (efectivo) engagement nas organizações. De como estes traços e características devem ser incentivadas e não reprimidas no contexto organizacional. Questões concretas: deveremos seguir e respeitar sempre, de forma cega e acrítica, o status quo hierárquico? Deveremos sempre seguir os procedimentos que alguém redigiu em tempos passados, quando a solução concreta e actual exige uma acção diferente? Devemos seguir o planeamento rígido sem questionar “porquê” e ou perguntar “e se em vez disso”? Ou porque que não cruzar áreas de conhecimento diversas e gerar a partir daí uma inovação disruptiva?
Tal como Francesca Gino, acredito que o futuro do mundo “corporate” será bastante moldado pelos rebeldes organizacionais. Nestes tempos voláteis, incertos e nada lineares, as suas perspectivas, atitudes de questionamento e competências serão bastante relevantes. Na adaptabilidade de processos e modelos de negócio, na exploração e definição de cenários, na gestão do risco, na ligação da estratégia à acção ou na agilidade da gestão operacional. Ou no mais conceptual pensamento out-of-the-box, com soluções inovadoras para os problemas organizacionais. Assim como o conformismo (ou atitudes de resignação passivas), as falsas alegações, pretensões ou deturpações – em nome de um pretenso valor de “estabilidade” – não são o caminho a seguir para o sucesso individual ou colectivo.
E sim, é possível às organizações desenvolverem culturas mais abertas e tolerantes à diversidade, que estimulem e aproveitem o “talento rebelde”. E no final, como bem nota Francesca, a “rebeldia” tem vantagens que se estendem para além da vida profissional – permite a uma vida pessoal mais intensa, gratificante e sustentável. Um bom contributo para estes tempos de transformação cultural nas organizações.