Há vida para além de Silicon Valley
Por Joana Russinho, People Enthusiast, head of Human Resources
– Sinto que estes case studies e frameworks não são para nós – confessou-me uma colega de profissão enquanto assistíamos a uma apresentação feita por uma consultora sobre sustentabilidade.
– Percebo. Como consultora estavas habituada a lidar com várias empresas, sectores de negócio e geografias, agora, numa PME a trabalhar num ambiente mais específico, onde os desafios e necessidades são diferentes, não vês a aplicabilidade directa destes casos – respondi.
– Sim, e mais, sinto que não me ajudam no que faço e pretendo fazer. Gostava que partilhassem case studies locais, de empresas do mesmo sector, ou similares, mas da mesma dimensão, que me fizessem pensar em outros caminhos, outras alternativas que porventura nem me ocorrem por desconhecimento. Há pouca informação e aposta na divulgação do que se faz a nível das PME.
Atrevo-me a dizer que esta sensação de aparente descoordenação entre as soluções que procuram os gestores de PME e o que o mercado de serviços oferece como exemplos de boas práticas, não é apenas sentida pela minha colega.
Comecemos por ver o copo meio cheio:
- Estes case studies, que numa reacção imediata arrumamos no nosso cérebro como “não aplicáveis”, trazem insights valiosos sobre diferentes estratégias, assim como práticas e soluções eficazes que foram aplicadas em outras empresas/geografias. Alguns podem ser adaptados e aplicados de forma criativa para resolver desafios específicos, ajudando também a identificar áreas de melhoria;
- A análise de case studies pode inspirar a inovação e a criatividade ao expor-nos a diferentes abordagens e soluções para problemas semelhantes. Ou seja, pode estimular a reflexão sobre como adaptar e aplicar essas ideias de forma a dar resposta às necessidades específicas das PME;
- Só o processo de pensar e discutir case studies, ajuda a desenvolver habilidades analíticas, de resolução de problemas e de tomada de decisão, na medida em que estamos a identificar padrões, avaliar opções alternativas e a antever cenários de consequências de diferentes estratégias:
- Destaco ainda que a partilha de case studies permite a disseminação de conhecimento e experiência. Isso promove uma cultura de aprendizagem contínua e colaboração, onde as todos beneficiamos de lições aprendidas e dos sucessos de outras organizações.
Não obstante, há também um esforço que pode ser feito da parte de quem os apresenta, e assim deixo o meu apelo à atenção aos seguintes aspectos:
- É possível contextualizar os case studies de forma mais próxima da realidade das PME, tornando as histórias relevantes e tangíveis para o público-alvo? Ficamos fascinados com histórias de grandes multinacionais, mas desencantados com recursos e estratégias inacessíveis;
- É possível destacar os princípios e conceitos subjacentes aos casos de estudo, em vez de apenas se focarem nos resultados específicos, permitindo uma melhor compreensão e aplicação dos mesmos? Aplaudimos resultados com mais de 6 dígitos, mas ficamos na mesma se não for clara a forma como se chega lá;
- Por que não oferecer orientação prática sobre como adaptar e implementar as ideias apresentadas nos case studies às circunstâncias específicas das PMEs, incluindo recursos e ferramentas úteis para facilitar esse processo? Simpatizamos com quem implementou com sucesso um programa de gestão de talentos para reter e desenvolver os colaboradores, mas mais ainda com quem partilha uma possível abordagem sobre como adaptar essa estratégia para empresas de menor dimensão e com recursos limitados.
- Há vida para alem de Silicon Valley! E se acompanharem os case studies com exemplos concretos de outras partes do mundo e de PME que conseguiram aplicar com sucesso os princípios discutidos, demonstrando a sua relevância e viabilidade no contexto das pequenas e médias empresas, teremos uma proposta de valor concreto.
Talvez integrando estas abordagens tenhamos um só copo com a apresentação de case studies que podem melhorar significativamente a sua utilidade e aplicabilidade para as PME em Portugal.