Portugal tem talento

Por Vítor Ferreira, CEO e co-fundador da Startup Leiria

Na área de Gestão, há 20 anos, o termo mais usado na Gestão de Pessoas era  “Recursos Humanos”. Porém, à medida que avançámos no século XXI, cada vez mais esse conceito foi substituído por “Gestão de Pessoas”  – reconhecendo que o termo “recursos” não reflectia a dimensão holística dos colaboradores. É fundamental, na gestão, considerarmos a dimensão social, psicológica e relacional dos colaboradores e repensar desde a forma como asseguramos a sua felicidade até à ideia de que, como gestores, gerimos relações, emoções e bem-estar.

Paralelamente, nos últimos sete anos, a palavra “talento” ganhou preponderância, talvez porque a escassez de competências tenha enfatizado a procura pelas pessoas certas, ou porque num mundo em que muito do que era repetitivo, do ponto de vista intelectual, foi substituído por processos digitais. Logo, a necessidade de pessoas criativas, que vão “além da máquina”, tornou-se imperativa. Assim, o mundo acordou para a competição pelo talento. E onde está esse talento? Neste caso, o talento deixou de ser uma expressão exclusiva das artes e dos programas de variedades, mas algo que está em todas as profissões.

É essencial valorizar o talento português nas áreas das Tecnologias de Informação, Engenharia e Ciências, que são, aliás, alguns dos sectores em que mais nos temos distinguido. Portugal destaca-se pela formação de alta qualidade que as universidades nacionais oferecem, dando origem a profissionais de excelência equipados de competências técnicas notáveis (temos algumas das melhores escolas de gestão do mundo). Outro factor de relevância é a histórica capacidade de adaptação dos portugueses a mudanças e desafios e a sua habilidade para superar adversidades. Adicionalmente, o multiculturalismo e a apetência para o domínio de línguas estrangeiras tornam os profissionais portugueses mais valiosos e desejados além-fronteiras.

Apesar de nos últimos anos se ter vindo a impulsionar o crescimento do empreendedorismo e a criação de startups em Portugal, bem como a atracção de investimento estrangeiro – o que, consequentemente, fortalece a economia local – nem sempre o talento português tem o reconhecimento devido ou consegue o seu espaço no contexto nacional.  Por essa razão, são muitos aqueles que escolhem emigrar, a fim de alcançar melhores condições de vida e um lugar onde se sintam apreciados e estimulados e no qual tenham a oportunidade de crescer profissionalmente. Consequentemente, Portugal está a perder estes profissionais que, muitas vezes, nunca mais regressam. Por outro lado, o país compete com outras regiões na procura de talento internacional, que muitas vezes também não tem reconhecimento nas empresas locais.

Nesse sentido, é impreterível que sejam criadas circunstâncias para alterar esta realidade e a minha sugestão é começar pelo sector de recrutamento e gestão de pessoas das empresas, apostando naqueles que definem quem é contratado ou não e mudar a perspectiva de ver as pessoas como meras competências para uma visão global de talento e experiência. As equipas de RH devem receber mais autonomia e apoio, formação e mentoria para que possam realizar o seu trabalho da forma mais assertiva, capacitando-as para seleccionarem o melhor talento.

Uma forma de fazê-lo é através da organização e promoção de iniciativas destinadas a gestores, CEO e profissionais da área de RH, que proporcionem uma plataforma para conhecerem-se, trocarem conhecimentos e partilharem experiências, facilitando a formação de parcerias. Falo inclusive de eventos como palestras e workshops conduzidos por especialistas, que abordam as últimas tendências e inovações em gestão de talento e divulgam métodos e estratégias adaptáveis a qualquer organização.

Além disso, estes eventos podem encorajar a criação de ambientes de trabalho mais inclusivos e diversos, promovendo a equidade e o respeito, e podem ainda contribuir para causas sociais, como no caso do Talent Summit, recentemente realizado em Leiria, que doou parte das receitas para a Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral de Leiria. Assim, são também uma forma de fomentar a conscientização sobre a importância da responsabilidade social corporativa e do envolvimento comunitário.

Se apostarmos, primeiro, nos decisores e formadores estamos no caminho certo para alcançar o melhor do talento português nas nossas empresas, impedindo que este nos escape. Ao investir em eventos focados na gestão de RH, fora do âmbito tradicional e estritamente processual que estes departamentos muitas vezes assumem, as empresas estão, na verdade, a investir no seu capital humano, o que, por sua vez, traduz-se num ambiente de trabalho mais saudável e produtivo.

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