Mais Filosofia na Gestão, por favor!

Por Carlos Sezões, Managing Partner da Darefy – Leadership & Change Builders

Neste mundo dinâmico da gestão empresarial, o foco está geralmente nos objectivos, métricas e metas. Financeiras, essencialmente. Do EBITDA ao lucro final. E claro, para o acionista, a remuneração do capital investido. E, para tal suceder, a montante, em garantir a eficiência dos processos e optimização dos recursos. Nada de mais natural. E legítimo. Embrenhados nesta intensidade das operações, somos hoje, e cada vez mais, também acelerados pelas tecnologias, que nos facilitam o acesso à informação. Mas que também nos submergem com notificações baseadas em algoritmos que nos guiam (sem nos darmos conta, em “piloto automático”) e, não raras vezes, nos distraem do essencial. E esse “essencial” (visão, propósito, valores), no fundo o “porquê” do que fazemos, não se pode, na minha óptica, perder.

Não, não venho aqui com “teorias zen”, baseadas num misto de esoterismos e pseudo-bem-estar. Apenas, de forma prática, pugnar para que a eficiência (fazer bem) esteja alinhada com a eficácia (fazer o que deve ser feito). Olhemos para (ou desenhemos) o futuro.

Poderá parecer um paradoxo, mas acredito que o trabalho e a gestão do futuro conciliarão a digitalização de processos com a humanização das experiências. Como tal, as ciências sociais e humanas, que nas últimas décadas foram menosprezadas no mundo empresarial, voltarão a ser incontornáveis: a ética, a antropologia, a sociologia, a psicologia ou a filosofia, voltarão a ter palco. Competências como a empatia, a inteligência emocional, a arte de dar feedback e a capacidade de inspirar e criar serão mandatórias. No fundo, tudo o que nos diferencia das máquinas e pode marcar a diferença.

Em concreto, um movimento crescente de líderes empresariais sugere que trazer a filosofia de volta à gestão empresarial pode criar uma abordagem mais ponderada, ética e sustentável à tomada de decisões. Não poderia concordar mais! A filosofia, tradicionalmente associada ao pensamento abstrato, oferece, de facto, uma base valiosa para resolver problemas complexos do mundo real. Ao integrar os princípios filosóficos nas estratégias de gestão, as empresas podem também promover a inovação e melhorar a sua cultura empresarial. Questionar as suposições, avaliar criticamente os desafios e antecipar as consequências a longo prazo. Nas equipas, numa lógica top-down, incentiva a reflexão, o raciocínio ético e a capacidade de navegar na ambiguidade – competências que são cada vez mais valiosas num mundo caracterizado por mudanças rápidas e complexidade moral – como a ética da inteligência artificial, a sustentabilidade ou diversidade. Equilibrando racionalidade e a humanidade.

Como apaixonado que sou pela filosofia, permitam-me sugerir um regresso (crítico, claro) a algumas linhas de pensamento que nos podem ajudar. Para começar, o utilitarismo, a tomada de decisões para um bem maior. Como defendia Jeremy Bentham e John Stuart Mill, devemos assegurar decisões e acções que maximizem a felicidade geral e minimizem os danos. Não olhando apenas para os acionistas, mas para todos os stakeholders. Podemos também revisitar a ética de Aristóteles na construção de modelos de liderança – valorizando traços de carácter, como a coragem, a integridade e a justiça. Depois, a Ética de Kant.  A adesão aos deveres morais e no respeito e tratamento dos indivíduos como fins em si mesmos, e não apenas como meios para atingir um fim.

Podemos ainda regressar ao existencialismo de Sartre e Kierkegaard: assumir a nossa autenticidade e a responsabilidade individual pelas nossas escolhas e tomada de decisões. Ou, como último exemplo, reforçar o estoicismo de Zenão e Marco Aurélio, que nos ensina também a manter uma atitude calma e racional, independentemente dos eventos – onde nos devemos concentrar naquilo que podemos controlar e aceitar o que não podemos influenciar.

Integrar a filosofia na gestão empresarial não é apenas um exercício académico; é uma estratégia prática para navegar pela complexidade do mundo actual, construir uma cultura forte e tomar decisões que beneficiam tanto a organização como a sociedade. Nos resultados directos e nos impactos sociais.

 

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