Cometer erros é permitido
É este um dos pilares do modelo de gestão de Recursos Humanos da Roche, na qual «a única coisa que não é permitida é: não fazer nada», sublinha António Alberto Rodrigues, director-geral em Portugal.
Por TitiAna Amorim Barroso
A Roche está instalada em Portugal há mais de 30 anos. É líder mundial no tratamento de cancro, tendo, também, uma forte presença nas áreas terapêuticas como as doenças auto-imunes, inflamatórias (como a artrite reumatóide), virologia, doenças metabólicas, transplantes e sistema nervoso central. Este é o retrato de uma empresa que tem no foco da sua visão: os doentes.
A facturação global da Roche foi de 41,5 mil milhões de euros no ano passado e em Portugal de cerca de 162 milhões de euros. Em todo o mundo tem 82.000 trabalhadores, dos quais cerca de 150 estão na corporação portuguesa.
«A grande motivação das minhas equipas tem sido um denominador comum, tanto em Portugal como nos outros países onde tive a oportunidade de trabalhar. O entusiasmo que dividimos é contagiante e propicia um ambiente de trabalho alegre, descontraído e muito empreendedor», salienta António Alberto Rodrigues, hoje o rosto da Roche em Portugal. Com um percurso internacional que inclui vários países da América Latina e América do Sul, conta-nos o seu dia-a-dia na direcção-geral de Portugal, expõe-nos a estratégia de RH, o negócio, os planos que se seguem, entre outros assuntos.
HR: A Roche tem 82.000 trabalhadores em todo o mundo, dos quais cerca de 150 estão na corporação portuguesa. De momento, prevê turnovers?
António Alberto Rodrigues: Vivemos um momento de incerteza e expectativa em relação ao futuro. Actualmente não é possível antecipar as medidas que serão implementadas pelo Governo, à luz do acordo firmado no âmbito da troika, e qual a dimensão do seu impacto no sector farmacêutico. Não prevemos, contudo, alterações de head count na nossa afiliada até ao final do ano. É provável, isso sim, que se proceda à realocação de alguns colaboradores, por forma a preencher lacunas em novas áreas estratégicas e naquelas com maior potencial de crescimento.
HR: Assumiu em Agosto de 2008 a direcção-geral da Roche Farmacêutica em Portugal. Anteriormente ocupava a direcção-geral da Roche Colômbia e Equador. Quais as grandes diferenças de gestão de RH entre os países?
António Alberto Rodrigues: As semelhanças são muito maiores do que as diferenças. Sendo uma companhia internacional a Roche tem uma política de gestão global. Não obstante esse facto, a direcção-geral tem uma grande liberdade para a implementação de iniciativas locais, que considere importantes para o desenvolvimento do negócio e das pessoas que colaboram com a companhia. Como os doentes estão no centro de tudo o que fazemos, a primeira preocupação que tenho enquanto gestor é a de pensar em formas de como podemos trabalhar diariamente no sentido de melhorar a sua qualidade de vida e isso dá um foco muito consistente à minha gestão. Tanto na Colômbia como em Portugal pudemos implementar um Programa de apoio a doentes oncológicos, o Tempo de Viver, que no nosso país já recebeu, inclusivamente, o apoio da Sociedade Portuguesa de Oncologia e que já ajuda, neste momento, mais de 500 doentes em Portugal. A grande motivação das minhas equipas tem sido um denominador comum, tanto em Portugal como nos outros países onde tive a oportunidade de trabalhar. O entusiasmo que dividimos é contagiante e propicía um ambiente de trabalho alegre, descontraído e muito empreendedor.
HR: A quem cabe, fundamentalmente, gerir e desenvolver as pessoas de uma organização?
António Alberto Rodrigues: Este é um trabalho da responsabilidade da equipa de gestão mas também de todos os managers, de todos os colaboradores. O trabalho de coaching deve ser desenvolvido a todos os níveis da estrutura empresarial e o desenvolvimento de cada pessoa depende, numa primeira instância, de si próprio. Na Roche incentivamos as pessoas a crescer profissionalmente e criamos um ambiente de trabalho em que facilitamos esse próprio desenvolvimento.
HR: A Roche caracteriza-se por “um grupo de trabalho dinâmico, que oferece integração numa empresa solidamente implantada, boas condições de trabalho e uma excelente integração profissional.” Como gere os talentos? E os potencia?
António Alberto Rodrigues: Temos uma abordagem holística à gestão de talentos, que pretende identificar, desenvolver e recompensar os colaboradores de forma equilibrada e consistente, oferecendo uma grande diversidade de oportunidades e percursos de carreira. Desenvolvemos o potencial dos nossos colaboradores porque acreditamos que assim conseguiremos concretizar a nossa meta de ser a empresa líder mundial em cuidados de saúde e desta forma materializar a nossa visão.
HR: Para as organizações, é importante não só detectar os talentos, mas também, e sobretudo, colocá-los no sítio certo. Como podem os gestores ser bem sucedidos em ambos os objectivos?
António Alberto Rodrigues: Na Roche existe um acompanhamento próximo entre as chefias e os seus colaboradores, que é assente num plano de desenvolvimento elaborado para cada pessoa, independentemente da sua função. Cada colaborador realiza e implementa um plano de desenvolvimento que prevê vários momentos de análise e reflexão. A avaliação de desempenho, o feedback regular, são algumas das metodologias utilizadas e que permitem identificar pontos fortes e necessidades de melhoria.Este acompanhamento próximo permite-nos identificar e mapear as características e talentos dos nossos colaboradores, de uma forma muito apurada, e conciliar as suas capacidades e características individuais com as necessidades da companhia.
HR: Temos talentos mal geridos em Portugal?
António Alberto Rodrigues: Acredito que Portugal é um país de grandes talentos. Temos vários exemplos de sucesso tanto no mundo empresarial, como na ciência, desporto, cultura, ensino… É importante valorizar e reconhecer os talentos “made in Portugal”.
HR: No actual quadro de crise, como é possível reter talentos e impedir a tão falada fuga de cérebros?
António Alberto Rodrigues: Hoje em dia o talento é parte fundamental das companhias com êxito. As pessoas com talento querem participar em equipas empreendedoras, que são a base fundamental de um bom ambiente de trabalho, de muita comunicação, em constante interacção. Os mercados são muito competitivos e estão em busca constante de talento. A manutenção do talento é, por isso, um elemento chave para o sucesso das companhias. Na Roche, o grau de retenção de quadros é muito elevado. O nosso turnover é inferior a três por cento.
HR: A estratégia de RH da Roche é alinhada internacionalmente?
António Alberto Rodrigues: Existe uma política de RH internacional que é transversal a todo o Grupo e que é orientadora para todas as afiliadas. A nossa estratégia assenta em três premissas: assegurar o sucesso do negócio; foco nos colaboradores – todos os trabalhadores devem-se sentir valorizados e com espaço para crescer e se desenvolver profissionalmente; e nunca esquecer a nossa visão: “Os doentes estão no centro de tudo o que fazemos”.
HR: Quais as políticas e práticas de RH da empresa?
António Alberto Rodrigues: Diria que em termos de incentivos e benefícios para os colaboradores temos as regalias convencionais das empresas internacionais, como seguros de saúde, prémios de desempenho, entre outros. Para, além disso, temos o privilégio de trabalhar em instalações próprias onde dispomos de um parque desportivo constituído por um ginásio e campo de futebol, bem como um restaurante que oferece um serviço de catering de grande qualidade, muito valorizado pelos colaboradores e também pelos nossos clientes.
HR: Quais as boas práticas de gestão de talento da Roche?
António Alberto Rodrigues: O desenvolvimento dos nossos colaboradores é uma prioridade para a nossa empresa e para a nossa afiliada. Um reflexo desta aposta passa pelo número crescente de colaboradores que têm saído de Portugal para prosseguir a sua carreira em funções internacionais. É com grande satisfação, enquanto gestor, que vejo ser reconhecido internacionalmente a qualidade do trabalho que temos desenvolvido localmente no desenvolvimento de talentos.
HR: A Roche Portugal foi uma das empresas portuguesas na lista europeia do Great Place to Work, apresentada recentemente. A que se deveu este reconhecimento?
António Alberto Rodrigues: O próprio prémio define e avalia as dimensões que caracterizam um Great Place to Work e que passam pelo investimento na formação, promoção de condições de bem-estar, bem como o orgulho interno na missão da organização e nos projectos sociais em que esta se envolve. Diria que estes são os factores-chave para definir um Great Place to Work. Este prémio significa, sem dúvida, o reconhecimento dos nossos colaboradores, de uma consistência estratégica, de uma acção em sintonia com a estratégia, cristalizada nos valores da companhia: integridade, coragem e paixão.
HR: Qual a estratégia, a nível de RH, para o ano?
António Alberto Rodrigues: Continuaremos a aperfeiçoar o nosso modelo de gestão de modo a transformá-lo cada vez mais num modelo empreendedor, onde cometer erros é permitido. Incentivamos, por isso, cada vez mais, o desenvolvimento de novas iniciativas que nos diferenciem e ao mesmo tempo nos motivem. Costumo dizer, habitualmente, que a única coisa que não é permitida é: não fazer nada.
HR: Qual o investimento alocado para a formação dos colaboradores?
António Alberto Rodrigues: A formação é uma das principais apostas. A empresa faz um investimento elevado nesta área proporcionando aos seus colaboradores diferentes programas de desenvolvimento e formação, tanto em Portugal como no estrangeiro.
HR: É, também, uma das empresas que mais investe em investigação a nível mundial. No ano passado, a Roche apostou no RoActemra®, contra a artrite reumatóide. Que produtos tencionam lançar?
António Alberto Rodrigues: Em 2009, por exemplo, a Roche era a quarta empresa (considerando todos os sectores de actividade) que mais investia em I&D. Em 2010 o valor alocado a esta área foi superior a 7,5 mil milhões de euros, o que reflecte bem a importância conferida a esta área.
A Roche possui neste momento um dos pipelines mais promissores da indústria farmacêutica. Temos actualmente doze novas entidades moleculares, nos últimos estádios de desenvolvimento, em 5 áreas terapêuticas: virologia, sistema nervoso central, metabolismo, doenças inflamatórias e oncologia. Em Portugal está previsto, para o próximo ano, o lançamento de novos tratamentos para o melanoma e cancro do ovário.
HR: Qual o balanço, a nível de negócio?
António Alberto Rodrigues: O balanço é francamente positivo, não só pelo desenvolvimento do negócio “per se”, mas também pelo facto de, enquanto laboratório farmacêutico de investigação, continuarmos a inovar e a desenvolver moléculas que permitem a satisfação de necessidades de tratamento em áreas ainda não satisfeitas. É extremamente gratificante trabalhar numa companhia que contribui para o aumento da qualidade e da esperança de vida das populações a nível mundial.
HR: Como é um dia típico de trabalho?
António Alberto Rodrigues: É difícil, com a minha função, falar num dia típico de trabalho. A agenda desenrola-se de forma variada, mas consistente e disciplinada. Tanto posso passar a manhã em reuniões internas de planeamento e estratégia com os meus colegas de direcção, como ter um compromisso com um cliente importante num hospital, ou uma reunião com um representante de uma Associação de Doentes. Enquanto membro da direcção da APIFARMA tenho também, por vezes, algumas reuniões no âmbito desta função, quer com os meus colegas da indústria farmacêutica como com os parceiros políticos e empresariais com que nos relacionamos. Habitualmente rentabilizo a hora de almoço e aproveito este período para reunir com colaboradores ou com outros stakeholders relevantes para o negócio.
Sendo a Roche uma companhia multinacional, parte do meu dia é também ocupado com contactos e viagens internacionais. Faço também questão de estar presente nas principais reuniões científicas e congressos nacionais e internacionais referentes às áreas terapêuticas em que desenvolvemos investigação, pelo que estas são iniciativas sempre presentes na minha agenda. Procuro, entretanto, dedicar o máximo de tempo possível aos nossos clientes, junto dos quais desenvolvemos relações de confiança e identificamos novas oportunidades.