A génese do vigilante e a constante pressão do dumping social

O vigilante… Figura com quem habitualmente nos cruzamos em instituições publicas ou privadas. Quem é este profissional? De onde vem e quais as suas competências legais?

Por Manuel Sacramento, gestor de clientes na COPS

A actividade de segurança privada tem vindo a assumir uma inegável importância em Portugal, quer na proteção de pessoas e bens, quer na prevenção e dissuasão da prática de actos ilícitos. Os profissionais deste sector são elementos habilitados pelo Ministério da Administração Interna (MAI), através de uma formação específica para o desempenho da função. Cabe-lhes a responsabilidade de garantir a integridade física e a segurança dos utentes e colaboradores, seja em espaços ligados à administração pública ou privada. Tem também como dever a boa preservação do património onde trabalham através da elaboração de rondas diárias onde elaboram os respetivos relatórios com registo de possíveis irregularidades detetadas. Na minha opinião a figura destes profissionais enaltece do estatuto de utilidade pública.

A profissão de segurança privada divide-se em nove tipos de especialidades diferentes que obrigam a formações complementares à formação de base, específica para o desempenho dessas funções. Serviços de segurança estática em portarias, centros comerciais, empresas, hospitais e muitos outros locais; serviços de segurança aeroportuária e portuária nos aeroportos e portos marítimos de embarque; Serviços de ARD (assistente de recintos desportivos) para eventos desportivos como jogos de futebol e outros; ARE (assistente de recintos de espetáculo) para eventos musicais, feiras ou outro tipo de espetáculos; O segurança porteiro que exerce funções no controlo de acesso a bares, discotecas e hotéis; O vigilante de transporte de valores que exerce funções na recolha/entrega de valores; O vigilante fiscal de exploração de transportes públicos, no controlo de utentes dos transportes públicos;

O centralista ligado a serviços efectuados em centrais; e o vigilante de proteção e acompanhamento pessoal que tem por função a proteção pessoal e o acompanhamento daqueles que os contratam.

Os vigilantes, na actual conjuntura pandémica que atravessamos, mantiveram-se sempre como a primeira figura no seu posto de trabalho e no controlo preventivo da pandemia, verificando e cuidando da segurança interna e de todos aqueles que se encontram dentro do seu espaço de actuação.

Os profissionais de segurança privada vêem-se, frequentemente, obrigados a trocar o seu conforto familiar pela profissão que exercem. Muitas vezes estão sete e oito semanas sem qualquer fim de semana ou feriados que possam gozar junto da sua família, tal como nas épocas natalícias ou Páscoa que são passadas, muitas vezes, em trabalho. São profissionais habitualmente sujeitos pelas empresas a elevadas cargas horárias de 12 horas por dia num trabalho de relação directa com o utente, que muitas vezes não o respeita, nem tão pouco compreende a função destes profissionais. As excessivas cargas horárias, associadas às frequentes mudanças de turno de trabalho e à tensão diária a que são sujeitos junto dos utentes, levam, muitas vezes, a situações depressivas das quais advêm diversas consequências familiares e muitas vezes profissionais. As empresas do sector nem sempre têm sabido avaliar devidamente as condições psicológicas e de desgaste dos seus profissionais.

O sector da segurança privada, desde a crise financeira de 2008/2012, atravessa momentos bastante complicados devido ao excessivo incumprimento nos direitos laborais por parte das empresas.

Um dos factores que mais alimenta este incumprimento passa pelos baixos valores apresentados na contratação pública que detém cerca de 60% do mercado de trabalho. É muito frequente verificarmos determinados concursos públicos onde os valores colocados são inferiores ao seu custo real. Esta situação leva à prática do dumping social como forma de compensação dos baixos valores das propostas apresentadas, sendo sempre o profissional da segurança privada o grande prejudicado com uma perda constante dos seus direitos consagrados na contratação colectiva de trabalho.
Foram criadas diversas medidas na lei n.º 46/2019, de 8 de julho de 2019, em alteração à lei n.º 34/2013, de 16 de maio de 2013, como forma de combater as propostas de baixo valor, o dumping social e a fuga ao pagamento de impostos, tal como a atribuição da responsabilidade solidária do cliente como forma de melhorar o controlo das más práticas laborais e o incumprimento das empresas. Verificamos, no entanto, que passados praticamente três anos, ainda não existe a regulamentação da lei que permita colocar em prática muitas destas medidas.

Julgo também ser urgente a criação de relatórios de avaliação ao desempenho e à qualidade dos serviços prestados no término de cada contrato estabelecido com administração pública, permitindo que em futuros concursos públicos esses relatórios de avaliação sirvam como critério de avaliação, beneficiando, dessa forma, as empresas mais cumpridoras e corretas.
Não é possível encontrar a estabilidade no sector da segurança privada enquanto a contratação pública se regular unicamente pelo critério de seleção “valor mais baixo”. Este critério serve unicamente para financiar as empresas incumpridoras e desestabilizadoras do setor que se servem do dumping social como forma de conseguirem valores abaixo do custo real.

 

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