A mudança, as pessoas e o acelerador COVID: Uma reflexão maior

Desde que o mundo é mundo, a mudança está presente enquanto elemento essencial para a evolução. Sendo a mudança uma constante na vida, do ponto de vista biológico, psicológico e social é também parte integrante das organizações. Nos dias que correm, em resposta aos efeitos da pandemia COVID 19, a maioria das empresas encara a necessidade de mudança como uma condição de sobrevivência e sucesso. Ora se a mudança é difícil ao nível individual, não é mais simples do ponto de vista organizacional, com autores como Kotter, por exemplo, a indicarem que apenas 30% dos projectos de gestão de mudança são bem-sucedidos.

Por Tânia Baptista, directora da Academia Formação e Desenvolvimento da EMEL

 

A Covid19 foi o acelerador universal da mudança, e eu diria que esta grande mudança não se prende tanto com a transformação digital, já iniciada em muitas empresas, mas antes com o sentido de urgência generalizado que se instalou, a velocidade que sentimos que temos de atingir e que chega a ameaçar a sustentabilidade das empresas. A tecnologia promete agilizar e optimizar a qualidade dos serviços prestados, a clientes externos e internos, e por isto muitos sentiram a necessidade de mudar o foco, repensar métodos de trabalho, acelerar a digitalização de processos, rever produtos e serviços.

Ora é com este novo enquadramento que muitas empresas abraçam hoje a gestão da mudança, como o caminho para atingir os seus resultados, procurando manter o compromisso e alinhamento com as suas pessoas. Temos medo de “perder o comboio”, mas, este é um período onde é essencial manter o foco e a sensatez. O ser humano é um ser social. O nosso cérebro continua a precisar de interacções e afectos para se desenvolver de forma equilibrada e estes tempos difíceis não apagam essas necessidades da espécie. Pelo contrário, precisamos urgentemente de criar equilíbrio entre a produtividade e a saúde física, emocional, social, mental e espiritual. No fim, só as pessoas importam. E falar de gestão de mudança é falar de pessoas.

 

Uma Equipa de Gestão da Mudança

Ao nível da empresa, a sustentabilidade da mudança é essencial e o sucesso implica o envolvimento de todas suas pessoas. Idealmente, para a condução interna destes processos, deve existir uma equipa de gestão da mudança, multifuncional, com foco nas pessoas e com vista a facilitar os diferentes processos de adaptação que têm lugar na empresa e nas suas diferentes áreas.

A Resistência à Mudança

Engana-se quem acha que queremos todos seguir em frente. A mudança e a adaptação são processos dolorosos. A resistência à mudança é uma resposta natural que importa assumir e compreender, de forma a podermos responder adequadamente. Debra Meyerson refere-se à gestão da mudança como um processo onde o compromisso deve ser forte, mas os meios devem ser flexíveis – é um caminho!

Etapas a Considerar

Gerir processos de mudança é gerir pessoas: comportamentos, hábitos, atitudes, crenças, medos, motivações. Não havendo receitas, seguem algumas etapas a considerar:

  • Desenhar a transformação com base na realidade da empresa e seu contexto: pensar concretamente para a realidade da empresa, sem receitas recicláveis.
  • Criar e comunicar o sentido de urgência: sem este as pessoas não têm porquê mudar. Mudar dá trabalho, tem de ser encarado como uma necessidade.
  • Envolver as lideranças: conduzir a mudança só é possível quando as lideranças estão alinhadas e apoiam essa mudança.
  • Alinhar objetivos estratégicos e culturais da empresa: há que identificar comportamentos e iniciativas que apontem num mesmo sentido. Se a cultura sempre foi condição de sucesso de qualquer processo de gestão da mudança, hoje, com o formato de trabalho híbrido, a cultura assume-se como condição obrigatória para uma mudança sustentável.
  • Gerir as emoções das pessoas: equilibrar realismo e optimismo. Reconhecer, escutar, apoiar as pessoas, mantendo o foco.
  • Criar confiança: quer do ponto de vista relacional como da competência com que desenham, comunicam e implementam a mudança. Uma equipa formada e preparada para gerir estes processos é uma condição para o sucesso dos mesmos.
  • Estabelecer quick wins: os nossos cérebros valorizam recompensas. As neurociências falam do papel da dopamina, mas é mais do que isso. Sabe-se que as recompensas facilitam a manutenção dos novos comportamentos e criação de hábitos. Assim importa escolher as iniciativas que geram resultados rápidos mais cedo e celebrar.

 

Cada mudança é única, tal como a realidade a que diz respeito. Desiludir-se-ão os que buscam regras ou dicas milagrosas. A única ideia que reforço é pensar à medida: perceber o contexto e definir objectivos, iniciativas, experimentar em pequenos pilotos, ajustar e ampliar às restantes áreas. Vivemos anos desafiantes, por vezes inquietantes, mas como em outras épocas vamos adaptarmo-nos. A nossa capacidade de mudança foi e será a essência da sobrevivência, é esse o compromisso com o futuro, o compromisso com a vida.

 

Leituras sugeridas:

  • HBR’s 10 Must Reads on Change Management, 2011
  • Reinventing the organization, Arthur Yeung e Dave Ulrich, HBR, 2019
  • O Cérebro que Aprende, Sarah Jayne Blakmore e Uta Frith, Gradiva , 2005

 

 

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