Ana Porfírio, Jaba Recordati: O diabo está nos detalhes
Tal como uma vírgula pode mudar o sentido de uma frase, também o nosso comportamento, enquanto representantes de uma marca e exemplo dos valores e princípios que representa, pode determinar o sucesso ou insucesso de uma negociação ou nova parceria.
Por Ana Porfírio, directora de Recursos Humanos da Jaba Recordati
No passado mês celebrou-se o dia da vírgula, e a esse propósito ouvi a leitura de um texto que exemplificava a forma como este pequeno detalhe colocado em diferentes locais de uma frase tem o poder de lhe alterar completamente o sentido. Por exemplo, uma vírgula consegue mudar uma opinião: “Não queremos saber!” ou “Não, queremos saber!” Haverá muitos outros exemplos, mas esta ideia ficou-me colada à mente.
Passadas algumas semanas estive envolvida em entrevistas na fase final de um processo de recrutamento e selecção e ouvi um comentário de um candidato que me levou novamente à vírgula e ao diabo nos detalhes. Comentava o candidato, que o que mais valorizava num profissional da área comercial, que conhecia pela primeira vez, era a forma como procurava estabelecer relação – conhecer e respeitar todos os interlocutores, independentemente da sua posição na organização, cumprimentar todos, procurar ser empático e utilizar uma escuta activa . Esta descrição levou-me até à importância e ao impacto da formação de impressões e à forma como hoje “os detalhes” são tão valorizados – e até esperados – neste regresso às relações pessoais e à interacção face-to-face.
Dei comigo a reflectir como os grandes temas de Recursos Humanos nos têm ocupado enquanto gestores: atracção e retenção de talento (a guerra pelo talento); novos modelos de trabalho; reskilling e upskilling; novas dimensões da liderança e tantos outros. No entanto, e parecendo ser um detalhe, uma vírgula, o nosso comportamento enquanto representantes de uma marca e exemplo dos valores e princípios que representa a nossa organização, pode determinar o sucesso ou insucesso de uma negociação ou nova parceria.
Não deixo de pensar que, nestes dias que vivemos e onde somos constantemente atropelados pelos compromissos e métricas a cumprir, onde temos de fazer check em todas as boxes e fazer muito mais com muito menos, sobretudo menos tempo, possivelmente estamos a atalhar nos detalhes e nas vírgulas e a prejudicar o alcance e o sucesso dos nossos objectivos pessoais e organizacionais.
Hoje, a relação social e humana ganhou uma outra dimensão, principalmente pela escassez nas relações vividas ao longo dos últimos dois anos e meio, que temos o dever de recuperar, arriscando a dizer que é imperativo e uma expectativa de todos nós. Ter mais relação, recuperar o tempo perdido e os contactos que ficaram congelados no tempo impõe- se pela rede que cria e pela carência que se sente.
Deixo-vos assim o desafio – e a mim também –, de estarmos mais atentos “às vírgulas” da nossa vida, garantindo que não é no detalhe que deixamos escapar o que é importante para nós, como indivíduos, e para as nossas organizações ou negócios!
Este artigo foi publicado na edição de Junho (n.º 138) da Human Resources, nas bancas.
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