Baixa reputação da Justiça: o desafio e a Gestão de Pessoas

Por Paulo Teixeira, bastonário da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução

 

Vivemos um tempo em que as instituições democráticas enfrentam uma “crise” de confiança sem precedentes. A quebra de reputação das instituições é um reflexo de uma percepção cada vez mais generalizada de ineficácia, deterioração e afastamento em relação às necessidades e exigências, paulatinamente mais complexas, dos cidadãos.

Esta quebra afecta directamente a Justiça, não configurando, porém, um fenómeno isolado, mas antes uma manifestação da “crise” mais ampla que afecta as democracias contemporâneas, em que a confiança nas instituições é vital para garantir a coesão social e o funcionamento do Estado de Direito.

E olhemos com mais atenção: a baixa reputação da Justiça em Portugal pode ser atribuída a múltiplos factores. Em primeiro lugar, a morosidade processual e a complexidade dos procedimentos, que muitas vezes dificultam a compreensão por parte do cidadão comum. Adicionalmente, casos mediáticos de corrupção e má gestão também contribuem para a desconfiança generalizada.

Neste contexto, a Gestão de Pessoas torna-se uma peça-chave na reabilitação da imagem da Justiça. Os profissionais da Justiça, incluindo, naturalmente, os solicitadores e os agentes de execução, são os rostos visíveis do sistema de Justiça e, como tal, desempenham um papel crucial na (re)construção da confiança pública.

Assim, a formação, a motivação e a valorização destes profissionais constituem, indubitavelmente, elementos essenciais para a melhoria da reputação da Justiça. E a formação contínua, em especial, assume-se como um pilar fundamental. O conhecimento jurídico é dinâmico e está em constante evolução, exigindo dos profissionais uma actualização permanente.

Por outro lado, num mundo cada vez mais complexo, a formação não deve ser apenas técnica, mas também focada em competências interpessoais e éticas. Ou seja, deve, nomeadamente, fortalecer a capacidade de comunicar eficazmente com os cidadãos, de demonstrar empatia e de actuar com integridade, competências que reforçam a confiança no sistema judiciário.

A motivação dos profissionais também é vital. Um sistema de Justiça eficiente e confiável depende de profissionais motivados e dedicados. Para tal, afigura-se necessário que as condições de trabalho sejam adequadas, oferecendo remunerações justas, oportunidades de progressão e um ambiente de trabalho salutar e atractivo. O reconhecimento do mérito e a valorização do trabalho desempenhado são factores que contribuem significativamente para a motivação das pessoas que, afinal, são a trave-mestra do sistema de Justiça.

Neste contexto, a Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução tem tido um papel muito activo na promoção de boas práticas e na definição de normas éticas que orientem a actuação dos seus associados. Também a implementação de mecanismos de supervisão e de fiscalização adequados tem contribuído para a redução de comportamentos inadequados e para a promoção da transparência e da credibilidade do sistema.

A modernização da Justiça é outro aspecto crucial. A digitalização dos processos e a utilização de novas tecnologias podem agilizar os procedimentos e reduzir a morosidade processual. A simplificação dos procedimentos e a desburocratização são, por seu turno, passos importantes para tornar a Justiça mais acessível e compreensível para os cidadãos.

Por fim, é essencial promover uma cultura de responsabilidade e de transparência. A Justiça deve ser vista como um serviço essencial a prestar ao cidadão e, como tal, deve ser transparente e responsável. A implementação de mecanismos que permitam aos cidadãos acompanhar o andamento dos seus processos e a disponibilização de informações em linguagem clara e acessível são medidas que podem contribuir para a construção da confiança pública.

A reabilitação da reputação da Justiça em Portugal configura, pois, um desafio que exige uma abordagem multifacetada. A gestão eficaz de pessoas, com ênfase na formação contínua, a sua motivação, a par da valorização profissional e ética configuram aspectos essenciais nesta caminhada a que todos os operadores do sistema são convocados.

Com efeito, apenas através de um esforço conjunto e concertado, que não prescinda do decisor político e de um claro investimento nesta função de soberania, será possível restaurar a confiança dos cidadãos, assegurando uma Justiça que seja, acima de tudo, justa, eficiente e acessível para todos.

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